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Dersu Uzala (1975): Longa inspirador é baseado na história real de caçador oriental e sua filosofia de vida naturalista e humanista



Em uma floresta que está sendo desmatada para o desenvolvimento, Arsenyev está procurando por um túmulo sem identificação de um amigo que ele diz ter enterrado há 3 anos. O filme então volta para a expedição de Arsenyev para a área de Shkotovo, na região de Ussuri, em 1902. Uma tropa de expedição topográfica, liderada pelo Capitão Arsenyev (Yury Solomin),encontra um caçador nômade chamado Dersu Uzala (Maxim Munzuk) que concorda em guiá-los através da fronteira dura. Inicialmente visto como um velho excêntrico e sem educação, Dersu ganha o respeito dos soldados através de sua grande experiência, instintos precisos, poderes aguçados de observação e profunda compaixão. Dirigido pelo ícone Akira Kurosawa, recebeu o Oscar de melhor filme estrangeiro de 1976, o o prêmio FIPRESCI e o prêmio de Ouro do Festival de Moscou e serviu de inspiração para o personagem Yoda e cenários da saga Star Wars, de George Lucas


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Ele conserta uma cabana abandonada e deixa provisões em um contêiner de bétula para que um futuro viajante sobreviva no deserto. Ele deduz as identidades e situações das pessoas analisando faixas e artigos deixados para trás.


Dersu Uzala salva a vida do Capitão Arsenyev pela primeira vez quando os dois estão perdidos em um lago congelado e uma nevasca repentina os ultrapassa. Dersu mostra a Arsenyev como construir rapidamente uma cabana de palha para abrigo usando grama e, em seguida, quando Arsenyev entra em colapso devido à exaustão.




História por trás do filme


Dersu Uzala foi um caçador e caçador de nanai. Ele trabalhou como guia para Vladimir Arsenyev que o imortalizou em seu livro de 1923 Dersu Uzala. O livro foi adaptado em dois longas-metragens, com a versão de Akira Kurosawa sendo a mais conhecida.


O explorador russo Arsenyev iniciou suas expedições às florestas do Extremo Oriente na área de Ussuri em 1902. Ele descreveu numerosas espécies de flora siberiana e o estilo de vida de povos étnicos nativos.


Quando Arsenyev conheceu o caçador Uzala, ele o contratou como guia para suas jornadas, Uzala ganhou o respeito de Arsenyev e sua equipe. Quando a visão de Uzala e outros sentidos começaram a desaparecer com a idade, Arsenyev se ofereceu para levá-lo para a cidade onde ele morava. Uzala descobriu que ele não tinha permissão para cortar madeira ou construir uma cabana e lareira no parque da cidade, nem foi permitido atirar dentro dos limites da cidade. Na primavera de 1908, ele pediu permissão a Arsenyev para voltar à floresta. Como presente de despedida, Arsenyev lhe deu um novo rifle.


O verdadeiro Dersu Uzala


Pouco depois, Dersu Uzala foi assassinado. Especula-se que seu assassino queria seu novo rifle.


Em uma entrevista realizada para a edição do DVD de 1999 do filme, o co-estrela Yuri Solomin afirmou que Kurosawa tinha conhecido há muito tempo o livro de Arsenyev e tinha planejado fazer uma versão cinematográfica muito cedo em sua carreira no final da década de 1930, mas tinha deixado o projeto depois de perceber que ele tinha que ser feito na região onde os eventos realmente haviam ocorrido.


Vladimir Arsenyev e Dersu


Entretanto, depois de uma carreira valorizada mundo afora, com filmes cultuados e imitados no Ocidente, Kurosawa sofreu um fracasso comercial e de crítica com o seu filme, que entendemos ser poético, doloroso e genial, intitulado “Dodeskaden”, de 1970.


Diante disso, em 1971, Kurosawa tentou suicídio durante um período ruim de sua carreira, questionando sua capacidade criativa e devida também à subsequente negação de financiamentos para suas produções por estúdios japoneses. Para sorte e empolgação do cinema mundial, Kurosawa foi convidado por uma produtora soviética para adaptar para o cinema o livro de memórias do explorador russo Vladimir Arsenyev, sobre suas viagens com o caçador Dersu Uzala.  


Em 1972, o produtor Yoichi Matsue e seu assistente Teruyo Nogami foram abordados pelo estúdio soviético Mosfilm, para uma adaptação do livro de memórias russo Dersu Uzala a ser dirigido por Kurosawa. Em 1 de janeiro de 1973, Matsue assinou o acordo com a condição de que Kurosawa recebesse controle criativo total sobre o filme. Mosfilm queria que o colaborador frequente de Kurosawa, Toshiro Mifune, interpretasse Dersu, mas Matsue os convenceu de outra forma, já que Mifune não estaria ligado a uma produção tão longa. Eventualmente, o ator de Tuva Maxim Munzuk foi escalado.




Leitura e crítica do filme


A coisa mais interessante sobre o filme é o fato de ser uma coprodução de um diretor japonês com a então União Soviética. Dersu Uzala foi uma produção da Mosfilm, mas Kurosawa exigiu, e recebeu, total controle criativo sobre o roteiro e a direção. 


A “linguagem” cinematográfica que Kurosawa usa em Dersu Uzala deve ser instantânea e intimamente familiar aos fãs de Star Wars. George Lucas claramente estava observando o sol e a lua como sua inspiração para o horizonte de Tatooine em Star Wars. A sequência do lago congelado como inspiração para Hoth em O Império Contra-Ataca; e as cenas da floresta na segunda metade do filme como sua inspiração para Endor em O Retorno de Jedi.


No entanto, esta não é uma ópera espacial, mas uma aventura de sobrevivência, na qual um pequeno grupo de homens é confrontado com a ferocidade deslumbrante do Extremo Oriente. Taiga russa e tudo o que pode jogar contra eles: nevascas, corredeiras furiosas, armadilhas, bandidos e ataques de tigres. A humanidade consegue resistir aos espíritos da natureza, por causa da reverente decência, sabedoria e gentileza de um ser humano em particular.




O roteiro de Dersu Uzala é na verdade baseado nas memórias da vida real do capitão Vladimir Klavdievich Arsenyev, um agrimensor e explorador que trabalhou primeiro para o governo czarista na Rússia e depois para a República socialista do Extremo Oriente. Em 1902, enquanto pesquisava os lagos da região de Ussuri, conheceu e passou a depender do guia local homônimo. Dersu Uzala é um caçador que pertence ao povo Hezhen, uma tribo intimamente associada aos Evenkil, Manchu e Udegei, com quem compartilham um corpo comum de conhecimento e costumes religiosos xamânicos tradicionais.




Isso explica a forma de ver o mundo do humilde caçador: não é só como caçar que ele está ensinando, mas também todo um código moral e espiritual que serve como guia uma visão mística e filosófica do mundo e suas transições. Essa sabedoria do caçador inspira o explorador a continuar em sua jornada, principalmente nos momentos de maior provação. Mas depois da aventura terminada, Dersu simplesmente não consegue se adaptar a civilização e moderação da cidade. Ou seja, o caçador que foi, na metáfora, o grande sustentáculo da transição para a modernidade, simplesmente não se adapta e não tem seu valor reconhecido pela sociedade, pois afinal na cidade não se pode caçar para sobreviver. No filme, é isso que faz com que Dersu volte ao campo para ter seu final trágico. 


É bem óbvio o auto reconhecimento de Kurosawa com Dersu: é ele o caçador mestrado em técnicas antigas de sobrevivência que envelheceu e não tem mais suas técnicas reconhecidas pela maioria das pessoas, mesmo que elas funcionem. 


A parte da aventura e da jornada, com o sol brilhante ao fundo ou o frio ameaçador do inverno com direito até mesmo a um tigre, são metáforas formais perfeitas das próprias técnicas cinematográficas de Kurosawa, utilizando-se de muitas técnicas de luz e transição dos quadros, de maneira a criar uma atmosfera cativante e relaxante, repleta de luzes e cores da natureza. A forma de captar a luz de Kurosawa sempre foi impressionante, mas neste filme ela parece ainda mais apurada e se diferenciando da maioria dos filmes por ser colorido, utilizando muito bem os tons suaves de luz e cores, principalmente os tons de vermelho ao por do sol (copiados também em Karate Kid), para criar a sensação psicológica da "viagem". 


O som, efeitos e trilhas, são perfeitas e, relação ao ritmo e clima do filme; funcionando com uma certa simplicidade em seu estilo e técnica formal que para os anos 70 já pareciam simples demais. Porém, com Kurosawa e sua experiência já adquirida aquela altura, sua técnica funciona de maneira perfeita. 


Obviamente a União Soviética se interessava pela história de um caçador de origem mitológica, para defendê-lo como arquétipo e símbolo da nação. Uma tentativa de utilizar seus carisma e sua sabedoria filosófica do campo, para inspirar e elogiar os camponeses soviéticos com símbolo e orgulho da nação. Originalmente, a aventura com o Dersu que realmente existiu ocorreu em 1902. Apenas alguns anos depois, em 1905, a Rússia em 1905 a Rússia iria sair derrotada de uma guerra contra o Japão (a primeira guerra do século XX) e com isso a insatisfação com o regime tzarista havia crescido exponencialmente. Era totalmente comum a população daquela região e daquela época, a visão de que a Rússia era uma nação camponesa, governada por uma elite rica que não entendia seu povo e estimulava agressão a uma nação não necessariamente inimiga como o Japão, afinal como vemos com Dersu era também uma nação de camponeses.


O filme também tinha certo intento de propaganda política na medida que servia como resposta perfeita para as insatisfações da juventude de Daises (1966) e de maio de 68: os jovens haviam esquecido sua natureza de "caçador" e precisavam se reconectar com suas origens, reconhecendo os esforços das figuras do passado em construir a nação. Por outro lado, demonstra certo desespero do governo de Leonid Brejnev em manter o controle, na medida que recorre a uma figura mitológica e uma viagem ao passado para legitimar o presente, e não pela venda do progresso e da modernização do país. Era quase como dar o progresso como impossível e por isso o estimulo a vida natural do campo. Ou seja, que o modelo de Revolução Cultural feito na China era muito mais poderoso que a União Soviética, e assim o socialismo russo deveria se inspirar nessa adesão das filosofias orientais humanistas e naturalistas, aos ideias do socialismo.


É um filme belíssimo, emocionante e com uma mensagem marcante em sentido histórico, mas com uma mensagem final bem pessimista para um filme feito por um país socialista. Está ali quase professado completamente o fim da União Soviética, através da morte do tipo ideal, do principio comunal e agrário original. O que fazer? 


O filme não diz, e para o cinema soviético isso é um problema. Talvez por isso o que chamo do "arquétipo do Dersu Uzala", o velhinho caçador, extremamente benevolente, e sensei absoluto que treina um jovem em sua própria arte de vida, tenha se disseminado tanto no cinema americano e mundial, como em Sr. Miyagi, Yoda, Mestre Kami e outros: é um personagem que representa a transição do socialismo enquanto sonho rural congelado no tempo dos narods e no modelo das comunas rurais, no socialismo urbano que precisa garantir um sistema de hegemonia intelectual e cultural, de forma a estabelecer sua "identidade". 


É um personagem que representa um paradigma que é superado enquanto um novo surge, e assim o herói da história não percebe o aprendizado de cara por estar imerso em sua aventura, notando só ao final de sua missão o quanto aprendeu. E com o fim da União Soviética e sucessivamente da Guerra Fria, o arquétipo foi facilmente incluso nos filmes dos Estados Unidos, para representar o país como novo modelo (e único) a ser seguido. Entretanto, tenho forte dúvida se isso não representa em sentido simbólico a força do arquétipo, ou seja, a origem socialista que também está presente na origem rural e colonial dos Estados Unidos, pois como a Rússia, são modelos de países bem diferentes do clima monárquico das potências da Europa, como Inglaterra e França. E por esse arquétipo e inspiração visual da aventura inspiracional de aprendizado e treinamento, o filme sempre será lembrado e referenciado, marcando completamente a História do cinema. 


Disponível no Belas Artes A La Carte e gratuitamente pelo Sesc Sp de maneira temporária.




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