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Arquivo X - "Beyound the Sea" (1x13): Análise e curiosidades do décimo terceiro episódio da primeira temporada



Dana Scully recebe seus pais, William (Don Davis) e Margaret Scully (Sheila Larken), logo após o Natal. Depois que eles saem, ela adormece no sofá. Algumas horas depois, ela acorda para ver seu pai sentado em frente a ela, falando silenciosamente. O telefone toca, e ela atende a chamada, de sua mãe, que diz a ela ter más notícias sobre seu pai. O episódio teve influencia de O Silêncio dos Inocentes e teve participação dos grandes atores Brad Dourif (Duna e Ragtime) e de Don Davis, o major Briggs, da série Twin Peaks


Veja aqui a análise do episódio anterior, 1x12 "Fire"


Em Raleigh, Carolina do Norte, um jovem casal é sequestrado por um homem que se passa por um policial. Fox Mulder diz a Scully que Luther Lee Boggs (Brad Dourif), um serial killer que ele havia ajudado a pegar anos antes, alegou ter tido revelações psíquicas sobre o sequestro e se ofereceu para ajudar a polícia em troca de sua sentença de morte ser comutada. Mulder é extraordinariamente cético sobre as alegações de Boggs. 


Visitando Boggs na prisão, os agentes dão a Boggs uma "evidência" da qual ele tem uma visão, só para ser dito que é realmente um fragmento da camiseta de Mulder. Satisfeitos que ele está mentindo, os dois se preparam para partir. No entanto, Scully olha para Boggs e vê outra visão de seu pai, falando com ela e cantando a canção que havia sido tocada em seu funeral: "Beyond the Sea". Scully não conta a Mulder sobre isso, e os dois discutem a possibilidade de Boggs ter orquestrado o sequestro com um parceiro para evitar a execução.



Crítica do episódio


Primeiro detalhe é o pai de Scully implicando com ela que ela deixou a árvore de Natal montada mesmo depois do Natal. Scully retruca que sim, pois estava cansada do hábito rigido do pai em desmontar a árvore no dia seguinte. Detalhe para quem é o pai: o ator Don Davis que faz o major Briggs de Twin Peaks.



Ela ainda brinca com o pai chamando-o de Ahab, o capitão do livro Moby Dick, ensejando que seu pai é um fanático por sucesso. Logo depois, ela acorda com o pai a sua frente em uma cadeira no meio da noite, o telefone toca, ela olha, e quando olha de volta, o pai já sumiu. Ela recebe então a notícia de que o pai sofreu um infarto e morreu. 



Pulamos para um casal se pegando na Universidade de Jackson, até serem interrompidos por um guarda com lanterna. Por que é sempre nesse momento que vem os assassinos? Uma gag muito batida, mas que para o episódio serve, uma vez que nesse episódio o caso é secundário. 


Com Mulder, Scully faz referência ao episódio 5, Demônio de Jersey, quando Mulder está com uma revista pornô. Também é interessante Scully mencionar que vê um traço de cetismo em Mulder. Será que o tempo com ela está o mudando? Quando dá os pêsames a ela, Mulder faz um carinho sugestivo no rosto de Scully, momento bem fofo. 



Na cena do enterro, vemos que apesar de ser militar, pai de Scully decidiu ter um velório normal, só com a família (uma desculpa para poupar orçamento também né). A mãe então comenta que a canção que está tocando, é a mesma que tocou quando seu pai voltou da crise em Cuba, provavelmente a crise dos misseis, "Beyond the Sea". Vemos que para Scully importava muito a aprovação do pai. A cena que ele aparece para ela e some, pareceu uma metáfora de ela sentir que seu pai continua lá mesmo quando sai, sua moral. 



Temos então a cena de Boggs, onde Mulder ludibria o preso que supostamente tem capacidades de adivinhação. Ele dá um pano que supostamente pertence a vítima e Boggs cria toda uma história, afinal ele está no corredor da morte, qualquer coisa para ele é divertido. Só para Mulder revelar que o pano não pertence a vítima, fazendo-o soar muito mau ao dizer que "queria acreditar" ao dar o pano. Tudo certo, ele está mentindo. Mulder sai e quando Scully vai sair, Boggs canta uma canção de marinheiro que a remete a seu pai, com ela vendo seu pai nele. Leio como uma metáfora de que sei pai era assim: manipulador. 


Depois, a cena de Scully entrando no prédio aleatório e encontrando um despacho. Pode parecer sem sentido, mas essa cena é idêntica a do filme Mistério de Candyman (1992), quando Ellen invade Cabrini Green. Aqui é engraçado, pois Scully parece estar acreditando e Mulder não nesse episódio. Isso fica claro quando ele dá um esporro nela para não seguir o que Boggs fala, demonstrando certa preocupação com ela ao mesmo tempo. 



Assim que Mulder toma um tiro, Scully desconfia de conexões de Boggs com o bandido que estão perseguindo. Ela dá um verdadeiro passa fora nele, e nesse momento ela vê a figura de Mulder em Boggs, pois talvez ambos a fizeram acreditar. 


Sem dar muito spoiler, o final do episódio parece marcar que ou Boggs é inocente e que seu crime foi apenas saber demais. Ou simplesmente que apesar de ser culpado, como Mulder reforça utilizando as evidências que apontam que o próprio Boggs pode ter planejado o sequestro, Scully sente pena dele como de Mulder e de seu pai, e por isso quer acreditar nele. Mas para Mulder, Boggs é culpado e é Scully que não quer "acreditar". Além disso, podemos pensar que apesar de Boggs ser culpado de vários crimes e talvez desse mesmo do caso, Scully pode sentir pena dele estar no corredor da morte, afinal pena de morte é um elemento cultural realmente muito reacionário e atrasado do Estados Unidos.


Também pudera, que atuação de Brad Dourif, ator de Duna e No Tempo do Ragtime (ambos já analisados aqui) como Boggs. O cara hegemoniza o episódio com sua atuação do prisioneiro meio louco. Cada expressão, cada movimento dele no episódio é perfeito. 


Segundo diversos analistas da série, é o primeiro episódio em que seus papéis são invertidos. É nesse episódio que é feito pela primeira vez que vemos inspirações do personagem de Scully com Clarice Starling de O Silêncio dos Inocentes. 


Rhonda Wilcox e J. P. Williams notaram as semelhanças em suas aparências, bem como suas posições em um ambiente de trabalho patriarcal. Em "Beyound the Sea" em particular, paralelos podem ser vistos, como na relação com o pai. Como Starling, Scully tem uma conexão emocional e uma necessidade de se provar para seu pai morto.

 

Após a morte de William Scully, sua filha fica particularmente preocupada se ele estava ou não orgulhoso dela. Embora no final do episódio, Scully pareça ter chegado a um acordo com a opinião de seu pai sobre ela, suas preocupações ressurgem mais tarde na série, quando ela teme que ele teria vergonha de suas ações ( episódio "Anasazi"). A conexão com Clarice Starling é ainda mostrada pelo encontro de Scully com Luther Lee Boggs, um assassino em série aparentemente útil, que ecoa a relação de Starling com o serial killer Hannibal Lecter.


A co-opção de Scully do papel habitual de Mulder também demonstra a complexidade de sua personagem. Embora ela seja fortemente influenciada por sua formação científica, ela também tem fé religiosa. 


Paul C. Peterson observa que, embora este episódio não seja diretamente sobre religião, ele mostra a primeira de várias visões que Scully experimenta ao longo da série; visões posteriores aparecem em episódios mais diretamente relacionados à religião e à fé de Scully, como "One Breath", "Elegy" e "All Souls". Neste episódio, sua fé em seu pai finalmente se mostra mais forte do que sua crença no paranormal, pois ela se recusa a ser tentada por Boggs. Em vez de aceitar sua oferta para ajudá-la a entrar em contato com seu pai, Scully visita seu Mulder no hospital.


O tema das figuras paternas é explorado ao longo dos Arquivos X, em relação tanto a Mulder quanto a Scully. Assim como seus próprios pais, uma série de personagens desempenham um papel paternal para os agentes em episódios posteriores, incluindo Garganta Profunda, o Canceroso e o Senador Matheson. Ambos os protagonistas têm problemas familiares profundamente enraizados e este episódio é o início da exploração desse arco de história. Um tema frequente empregado no show é o de espelhamento, duplicação ou clonagem. A relação de Scully com seu pai, tratada pela primeira vez em "Beyound the Sea", é espelhada pela de Mulder com seu "pai", também chamado William.


Um episódio fantástico, um dos melhores da temporada e da série. Reflete de maneira perfeita o psicológico dos agentes, principalmente Scully. Além disso, é um episódio que faz eco narrativo em toda série, sendo ele o início de toda uma cadeia de tramas que envolvem a família e o pessoal dos personagens. Um dos meus favoritos.


História por trás do episódio


"Beyond the Sea" foi escrito por os coprodutores executivos da X-Files e parceiros de longa data da escrita, Glen Morgan e James Wong; foi seu quarto roteiro para a série. O episódio foi dirigido por David Nutter.  Como Morgan e Wong explicaram, seu episódio foi escrito em resposta às críticas à caracterização inicialmente limitada da série de Scully. Wong disse: "Gillian Anderson precisava mostrar mais seus talentos, e esta era uma oportunidade perfeita para dissipar essas noções que Scully nunca acreditará. Era hora da personagem crescer, porque ela estava fazendo o mesmo tipo de coisa muitas vezes." Executivos da Fox vetaram a ideia duas vezes antes de Carter dizer à emissora: "Estamos fazendo isso". 


Don Davis foi escalado como o pai da Agente Scully e foi um dos vários atores de Twin Peaks a aparecer na série. Davis retornou como William Scully em "One Breath" (2ª temporada). Sheila Larken, que interpretou a mãe de Scully, Margaret, é a esposa do coprodutor executivo da série, R.W. Goodwin. Larken retornou para mais 15 episódios no papel. 



Morgan e Wong lutaram duro para que o veterano ator de cinema Brad Dourif desempenhasse o papel de Luther Lee Boggs contra preocupações sobre o custo de contratá-lo da produção. 


O criador de Arquivo X, Chris Carter, ligou para o presidente da Twentieth Century Fox, Peter Roth, durante o jantar de ação de graças e o convenceu a deixá-los pegar Dourif para o papel. Dourif foi convidado a aparecer no episódio com apenas quatro dias de preparação. Ele originalmente recusou o papel, até que os produtores lhe deram uma semana extra para se preparar. Ao entrar no personagem entre as tomadas, seus exercícios de respiração profunda deixaram seu rosto com o aspecto avermelhado do episódio.



Este episódio é um dos favoritos do criador Carter, que o chama de seu episódio favorito da primeira temporada e da atriz Gillian Anderson. O co-escritor Morgan também o elogia como um roteiro do qual se orgulha. Diretor Nutter diz sobre o episódio: "Eu acho que é a peça mais bem realizada de direção de atores que eu fui capaz de fazer ... Eu acho que este episódio realmente fez a diferença em como o público olha para Scully. Acho que trouxe muita dimensão para o caráter dela e para a pessoa dela definitivamente teve muito impacto." 


O título do episódio, "Beyond the Sea", faz referência à canção de Bobby Darin de 1959, que é tocada no funeral do pai de Scully. A aparição de Luther Lee Boggs se assemelha muito a Richard Ramirez. Os nomes Luther Lee Boggs e Lucas Henry foram inspirados pelo serial killer da vida real Henry Lee Lucas. 



O personagem Luther Lee Boggs é mencionado por Dakota Whitney (personagem de Amanda Peet) em The X-Files: I Want to Believe (2008). Em uma cena deste episódio, o chapéu do Comitê Nacional de Investigações sobre Fenômenos Aéreos (NICAP) de Max Fenig do episódio "Fallen Angel" pode ser visto pendurado no escritório de Mulder.


Como eu já havia dito, os apelidos de Scully e seu pai um para o outro - Acabe e Starbuck - são tirados do romance náutico de Herman Melville de 1851, Moby-Dick. Outras referências ao romance aparecem mais tarde na série no episódio da segunda temporada "One Breath" e no episódio da terceira temporada "Quagmire". 



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