Pular para o conteúdo principal

Memórias Póstumas de Brás Cubas (2001): Da imortalidade literária do defunto autor à espectralidade na tela do Cinema Nacional




Dirigido por André Klotzel e com roteiro inspirado em citações literais do livro de Machado de Assis. Após o fim de sua vida de elitista e escravocrata, no ano de 1869, Brás Cubas, decide por fim narrar os fatos mais importantes de sua vida fatídica e sem proveitos. Começa então a relembrar de nomes como Quincas Borba (o filósofo do humanitismo), ele conta da sua displicente formação acadêmica em Portugal, dos amores perdidos de sua vida  



Machado sempre foi reconhecido, ao contrário do que tenho escutado. Se você procurar no Google News matérias sobre Machado, vão achar matérias muito antigas, algumas de 2005, 2008, 2010. outras de 2018, outras de 2022 e de vários jornais diferentes lá de fora, mas matérias complexas e bem escritas acabam caindo no esquecimento, mas para quem quiser estudar melhor o inglês, essas matérias e resenhas de Machado são ótimas. Machado é um autor muito lido nos estudos de História e Linguagens pela forma incrível como ele referencia os clássicas e da criatividade e vivacidade de sua escrita, sempre afiada, ousada e desafiadora. 

Eu reli aqui também recentemente para fazer a crítica e mais uma vez fiquei impressionada em como ele escreve bem, cada frase é uma viagem com os pés no chão. Seu conhecimento em história e suas referências são impressionantes mesmo.  Essa adaptação tem Reginaldo Farias e até mesmo Sonia Braga. 


Esse filme é de 2001, e é baseado na obra do nosso melhor escritor, atualmente, o autor mais lido nos Estados Unidos na sessão de América Latina de livros do site Amazon (mas não somente).  Machado de Assis foi sempre comentado e celebrado. Mas em sua época, não era tão consagrado assim, havendo muitos críticos das inovações linguísticas e de gênero descobertas por Machado. Machado era incrível demais, além de gago e com problemas de epilepsia, e ainda por cima o fato de não ser um homem branco, ele conseguiu se tornar um grande escritor ainda em vida. Algo que não aconteceu com Lima Barreto, por exemplo. 


Essa história vem desde muito antes, e que tem uma história de traduções e de fãs poderosos, como Woody Allen, o crítico literário Howard Bloom, ou mesmo a cientista Susan Sontag (que fez todo um artigo sobre beleza feminina inspirado na obra de Machado), ou quem lembra da entrevista de Woody Allen pro Bial quem lembra da entrevista de Woody Allen pro Bial, que ele disse ter amado ler esse livro que alguém mandou pelo correio anonimamente para ele. Outros escritores foram influenciados por Machado, como  John Barth e Donald Barthelme, Jorge Luis Borges. 


Em seu livro incrível História Concisa da Literatura Brasileira (1972), Alfredo Bosi renovou a ideia de Machado de Assis como o principal autor nacional. Já que os críticos do XIX, como Silvio Romero, Capistrano de Abreu e Urbano Duarte de Oliveira, que viam problema com a linearidade de Machado e a influência da literatura inglesa.


Muito se tem falado sobre a polêmica do tik tok, que bom que muitos estão "descobrindo Machado" pela primeira vez, mas essa polêmica é vazia, afinal, o que importa é a divulgação do autor, então está tudo bem. Mas é um pouco de vira-latismo nosso pensar que algo só é importante pela importância imediata, é aquela velha história do "presentismo", onde agora estamos querendo inventar que Machado de Assis não é reconhecido. 


Machado de Assis  tem sido lido e traduzido desde 1920, existe toda uma correlação com a obra de E.M Foster (que parece  ter lido Machado por seus temas de modernidade e realismo).  Machado de Assis publicou essa obra Memórias Póstumas de Brás Cubas em 1881, mesmo ano da publicação de "O Mulato", um livro que muitos acreditavam ser indireta para Machado de Assis vinda de Aluísio de Azevedo. 


Foi um livro de virada da trajetória do autor, reconhecido por seu sucesso imediato com o público feminino, tinha sido massacrado pela crítica, que achavam seus romances pouco fantasiosos ou românticos, propriamente ditos. Finalmente, seu intenção de brincadeira venceu a todos e ele escreveu a obra da sua vida (apesar de ter outros livros tão bons e impactante quanto). 


Foi depois de todos esses livros de romantismo-realismo (de segunda geração do romantismo), embarcando em uma estética de crítica ao moralismo superficial da elite brasileira aí que ele resolveu abandonar os romances de quem vai casar com quem tradicionais e resolveu investir na "anti estória" de Memórias Póstumas de Brás Cubas, uma virada incontestável ao realismo que desafia a condição de uma literatura puramente romântica em um país escravocrata. 


Esses foram os romances já super conscientes do autor, chegando no ápice com Iaiá Garcia (1878), antes da publicação de Memórias Póstumas de Brás Cubas, de 1881, de quando autor já não era mais tão jovem, chegando aos 40 anos de idade e refletindo sobre o valor da vida. 


No sentido de ter um reconhecimento internacional, se esse é o fator que instiga as pessoas, esse reconhecimento já foi dado através de figuras, jornalistas e meios um pouco mais qualificados que esse, mas é uma forma de divulgar a experiência de vida uma pessoa que encontra um livro que goste, mas vamos falar a verdade, Machado de Assis é que é o verdadeiro famoso do baile aqui. Todos tentam copiar ele. 


O livro Memórias Póstumas de Brás Cubas foi um livro foi publicado em 1881 pela primeira vez, foi a tentativa mais completa de uma antologia machadiana clássica. Saindo dos seus trabalhos de romances e poesias, como Crisálidas e Falenas, obras de um nacionalismo quase de biblioteca, porém esperançoso e bem nativista já. O título da tradução que estão todos comprando na Amazon é uma mais recente Flora  Thomson-DeVeaux, "The Posthumous Memoirs of Brás Cubas", porém existe uma tradução mais antiga cujo título é "Epitaph of a Small Winner" , de 1952 de William Grossman, uma das primeiras traduções da obra. 


Em 1870, Taunay publica Inocência, em 1870, Taunay publica Inocência e serve como orientador das teses necessárias para um romance de típico nacional (sem tanta interferência estrangeira), e é seguido por Machado de Assis no ano seguinte, entrando em romances ainda frescos com o orvalho da juventude como Ressureição (1872) o primeiro romance bem diferente já.  Em Memórias Póstumas, há um louvor ao meta físico, ao auto reflexivo e a meditação budista também. 


Helena (1876) com uma estória de romance proibido e de assumir herdeiros de fora do casamento; e A Mão e a Luva (1874) onde Machado faz uma escrita citando autores do universo científico positivo forense (de Sherlock Holmes), até na própria metáfora do título dos objetos, e  indaga assim sobre os efeitos do casamento por interesse e de ser teleguiado por um patrocinador das elites, como também quando a praticidade e o interesse em personalidades similares faz nascer um estilo de amor realista (da fase de Machado de Assis casado e já funcionário público do ministério da agricultura). 



Por isso esse romance talvez seja para quem seja mais velho, já que a escrita apurada exige que pelo menos alguns livros você tenha já livro na vida. Apesar de toda a sua inteligência e argúcia, existe um grão de referências externas e interessantes no livro para quem é fã de filosofia e história e debates entre as áreas. Quem não lembra da parte que ele se pergunta sobre a função das roupas ao reprimir a nudez como parte principal para os jogos de sedução que perpetuam a espécie. 


"Ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver dedico como saudosa lembrança estas memórias póstumas" a frase inicial do primeiro parágrafo do livrodiz o início da jornada do defunto autor, e não autor defunto. A dúvida do princípio ou do fim, em relação ao autor difundo, ou difundo autor é porque ele conta uma estória do fim ao começo para não se preocupar com a previsibilidade padrão das estórias de romance, com os cânones e com as expectativas diversas editorais.


Vale lembrar que os romances de Machado de Assis eram publicados semanalmente em folhetins, como eram a maioria dos escritores nessa época, ao começar pelo fim ele toma conta completamente de sua narrativa, e pode até duvidar dos sujeitos padrão da sociedade, como o finado narrador e protagonista Brás Cubas, o homem que cavalgava em seu escravo (não era sutil a crítica de Machado de Assis). Normalmente se começa a história pelo começo, primeiro como ele. Por isso que ele diz que é um difundo autor, e não autor difundo. Citando Moises que também contou sobre seu fim. 



Queria dizer aqui que New York Times, The Guardian, e até mesmo o The Economist tem resenhas e mais matérias de descrição de Memórias Póstumas de Brás Cubas, o New Yorker também, chamando de "um dos livros mais inteligentes já escritos",  em inglês de tempos atrás e desse mesmo livro. Ou seja, ele já é mencionado no mercado editorial e matérias de jornais importantes. Comparando essas resenhas vemos a alta influência dedicada desde sempre do nosso escritor tupiniquim. 


O filme em si é maravilhoso, já que temos sempre que encarar adaptações de Machado de Assis com poucos recursos, essa versão aqui  foi o mais próximo de uma grande produção.  Vemos toda essa espectralidade (fantasmagórica) da figura literária que por estar morrendo, é finalmente honesto sobre sua desonestidade total em vida, uma narrativa que aborda um protagonista que está morto, portanto não tem o adorno usual discursivo que um pode se fiar em vida, desafiando então os limites da tradição da linearidade narrativa (e da crença no protagonista) e desafiando a aceitação da cabeça de todos em relação ao martelo da verdade que pode ser a literatura. 


Na literatura se pode condenar ou exaltar posturas individuais, tanto quanto ideologias coletivas, como a condenação de Machado de Assis aos liberais racistas da Revolução do Porto, ou a condenação do germe racista do próprio Brás Cubas. 


Em uma surpreendente fiel adaptação da obra do escritor Machado de Assis, teve apoio patrocínio de instituições portuguesas e de muitas empresas públicas brasileiras e estrangeiras também. Usaram muitos quadros famosos tanto de Debret, quanto de pintores mais modernos como Portinari.




Aqui no blog já falamos de Machado diversas vezes, somos time machado até o fim, o escritor mais brasileiro de todos, do típico do típico do nacional mesmo, e o mais interessante, ele não era puramente um homem branco (embora tivesse passado para a história como um), mas vivia muito no meio deles. 




Sabia tudo para brincar com essa classe e com essa elite, estando ao mesmo tempo no meio dela, participando dela (embora sofresse críticas e pilhérias), da primeira vez da polêmica com a literatura portuguesa com a questão com Aluísio de Azevedo, o livro Missa do Galo (junto com a análise do filme de Nelson Pereira dos Santos) o livro Missa do Galo (junto com a análise do curta de Nelson Pereira dos Santos),  como também recentemente uma análise de Dom Casmurro com a nova adaptação do novo filme do Júlio Bressane e diversas citações de comparação de Machado em Inocência, por exemplo.  Machado em Inocência, por exemplo, com a ideia de Flora em Esaú e Jacó.  


Então a admiração é antiga. O filme de André Klotzel, um cineasta conhecido por vários filmes, entre eles, A Marvada Carne (1985), com Fernanda Torres. Esse filme é perfeito como adaptação, pouca coisa do livro ficou de fora, (mas ler o livro ainda é uma surpresa mesmo com o material do filme), esse file tem diálogos praticamente transcorridos e poucos alterações, permanecendo o bom esqueleto do livro perfeito. Em termos de vocabulário, Machado nunca esteve mais inteligente, sutil e maestral contador de estórias como ele esteve nesse filme.  A fotografia é de Pedro Farkas e a direção de arte é de Adrian Cooper. A trilha sonora é de Mário Manga.


Aqui temos muitas análises já de Machado de Assis, é um autor maravilhoso mesmo, estamos aqui nesse livro debatendo os limites da inovação e da tradição. Já que os centros de inovação são feitas dentro dos centros de tradições. 


Caminhamos vendo um debate sobre os valores da sociedade patriarcal brasileira e seus membros, estimulados a ter uma postura blasé e nada consciência sobre o trabalho e as relações sociais e raciais. Vemos no filme a cena que ele cavalga em um escravo da sua idade. No livro, vemos a mocidade imprudente de um típico membro da elite escravocrata liberal, um típico político de gabinete que nunca fez nada na vida além de lucrar com seu nome e sua reputação. 


Vamos nas influências que Machado tinha ao escrever esse livro, a primeira aqui é Memórias de Barry Lyndon Memories of Barry Lyndon, Barry Lyndon, de William Makepeace Thackeray, um livro de memórias autobiográficas falso em tom de comédia, que brincava com a sociedade de corte europeia e seus costumes, como a nova burguesia e a ideia da figuração na corte. 


Outra referência é um avesso de ideia do personagem Rochester (o cara mau que a protagonista perdoa no final) de Jane Ayre, Brás Cubas é exatamente o mesmo cara que o cara da elite inglesa (pior personagem impossível), mas aqui nós percebemos por mais que ele seja o narrador como em Jane Y, que ele era o vilão de sua própria história, nesse sentido. Por isso que esse romance era uma forma ainda de louvor ao liberalismo clássico inglês, e por isso a brincadeira de Machado de Assis em inverter o louvor ao protagonista tóxico.


 Assim, o debate do humanitismo é o debate do liberalismo fora do lugar, o liberalismo era a evolução do pensamento humanista da renascença evoluído em uma ideologia onde a felicidade suprema do indivíduo era a felicidade suprema da nação. 


A crítica que Machado fez em relação ao "humanitismo" era uma crítica direta ao positivismo filosófico, muito influente nos meios literários da época, onde o determinismo era da sociedade que triunfava em relação ao poder do indivíduo. 


Uma forma de dizer que as descrições de novas tendências podiam ser apenas isso, moda estética que se passa como revolução. Essa ousadia de Machado de criticar o lado bobo do humanismo estético, dos recitais de salão demonstram a inteligência superior de Machado. 


Ele sabia em como ele sabia construir um estória do começo ao fim sem clichês ou sem termos que prever, afinal, são diversas clivagens para chegar ao debate filosófico da estória, como Hamlet, ser ou não ser, e como ser se apenas ele teve como legado miséria e sofrimento pela sua própria postura e personalidade e sua condição blasé de apenas se preocupar consigo pensar e procurar por situações de tragédia para se enviar ao longo da vida. Passando pela vida no mais puro existencialismo burguês. 


O "humanitismo", assim como a apreciação das artes plásticas que pode ser feito por qualquer pessoa ou alma, ou o canto de uma melodia que se ouviu por alto, entramos no ramo da filosofia mesmo,, dos acertos e dos erros e da cavalgada no hipopótamo. Vimos como em Quincas Borbas, onde esse cara que chegou até a ser mendigo em Memórias Póstumas de Brás Cubas e pede uma ajuda para ele, que o ignora. Ao ter o relógio furtado, mal ele imaginava que iria receber de volta funcionando e que o amigo ia ficar rico. 


Ambos os protagonistas seguem seus escritos sem nenhum questionamento do que fez ou de quem teria sido essa figura. Enfim, a obra de Machado forma um universo completo entre si, vale muito a pena ler tudo e buscar as referências dessa universo machadiano são bem abertas e se notar bem, vários personagens aparecem mais de uma vez. 


Aqui vemos o clássico filósofo ou cachorro Quincas Borbas como mendigo depois de ter perdido tudo no jogo, voltou a ser rico depois de herdar uma fortuna de um parente. Esses encontros aleatórios são típicos do estilo psicológico de Machado que quer fazer você questionar essa ideia de reputação e missão de vida (ideologia), por isso a metáfora do humanitismo como brincadeira em relação ao liberalismo e o ao humanismo clássico.  



Pegando essa referência, Machado construiu Brás Cubas, uma mistura de Brasil com Cuba, e também uma referência a um dos primeiros colonizadores de São Paulo; os dois países tropicais cercados de construções externas dessas nações, que também foram os dois últimos países a abolir a escravidão, possuindo uma elite que além viver da usura, ainda se sentia como os grandes herdeiros da civilização nos trópicos. Machado de Assis soube transmitir essa sensação do espírito e da herança escravocrata que paira no legado de alguns indivíduos que estão por ali pairando por entre a classe dominante. Mesmo dos tipos que se declaram nacionais, eles são estrangeirados na forma como precisam da dependência de escravidão para sobreviver e que tem até orgulho nisso, no processo de usura, de não deixar herdeiros, por exemplo. 


Ou seja, todo o liberalismo fora do lugar de Brás Cubas vinha de se sentir o típico brasileiro sendo um homem branco e da elite escravocrata. No filme há uma cena que ele pega uma borboleta azul e mostra para Eugênia, no livro, uma borboleta preta pousa no seu quarto e ele mata como se fosse nada, mostrando seu desprezo pelas coisas naturais. O filme muda um pouco a perspectiva, ele é mais o enganador e sedutor aqui, embora seja tão cruel tanto. Ele não gostou de Eugênia apenas por que ela era manca, imagina só que futilidade. 





Brás Cubas bebe de uma pitada da ideia do mito yankee padrão de todo explorador ou homem da elite abastarda, que quer ser político para levantar a reputação de sua própria trajetória,  não por nenhum motivo ou ideal, apenas pelo "próprio nariz" como brincaria Machado.; Ah, e naquele senado federal monárquico do Rio é onde funcionava a ALERJ antigamente (era o parlamento nacional na época que Rio de Janeiro era a capital do Império), não no mesmo lugar, mas no prédio antigo, era o mesmo lugar de onde funciona o senado da época. Vimos a decaída e posterior carreira política de Brás Cubas, depois que ele completa 60 anos.


Machado é cruel ao apontar a nulidade da vida e os pormenores e problemas de uma elite disfuncional que queria viver o liberalismo nos trópicos, onde havia o advento da escravidão, ou seja, a ideia de que a escravidão andava lado a lado com as luvas de pelica da sociedade de cortes e bailes. 



Brás Cubas era assim um solitário playboy típico, um membro da elite monarquista e escravocrata, mas que era rodeado por maquiagem iluminista do progresso através de propaganda de emplastos milagrosos e de publicidade duvidosa. 



Aliás, a moda de inventar um emplasto milagroso continua no universo científico mais abastardo por assim dizer até hoje, se posso comentar também. Vale lembrar que Brás Cubas é a síntese que Roberto Schwarz fala sobre "ideias fora do lugar" pretendia debater, e nenhum personagem mais descreve essas contradições da elite e do típico nacional do que Brás Cubas. 


Ele descreve no livro toda sua genealogia, desde os parentes antigos sem diploma, até mesmo simulando parentesco com os Cubas que fundaram a sesmaria de São Vicene (região de São Paulo), até a geração de seu pai já havia ganho alguma reputação entre a elite abastarda da época. Brás Cubas sonhou, sonhou e sonhou alto. com os amores que nunca pôde ter de fato, com as travessuras que tanto fez, ele sonha com as possibilidades daquilo que já não existe mais (ou seja, Machado questiona o carácter não revolucionário dos romances). Uma dessas verdades veladas diz então respeito ao corpo humano, a possibilidade da nudez reduzir nossas preocupações a nada. Até que percebemos que ele morre antes de realizar seu sonho, a cura pelo emplasto de todos os malês do mundo. 




Sonhou em vão inventar algo que curaria todos os males. Por isso aqui, o livro ainda é melhor que o filme. No livro, há uma satisfação em ver o sofrimento daquele homem, por tudo que ele fez na vida. Ainda assim, ficamos curiosos com o destino de suas aventuras, que durariam o tempo de uma vida amargurada. 



2 horas da tarde em uma sexta feira de 1869, morreu de pneumonia, mas morreu sim de uma ideia fica, a ideia de sua vida, o Emplasto Brás Cubas, ao ficar louco com os detalhes de sua empreitada, resolveu abrir a janela e assim pegou a tal pneumonia que finalmente o matou. 



Vemos o funeral de Brás Cubas, o início do filme e do livro. E da terra de onde viemos, retornamos.



Ele começa a falar sobre quem assistiu sua partida, entre eles, uma senhora já de cabelos brancos, que entra pálida e comovida, e vestida de preto. Dona Virgília, sua antiga paixão, agora de cabelos brancos e ares tristes. Ele cavalgada o hipopótamo no delírio da morte e viu então o "início dos tempos" perante ele. 

Eles traíam o marido de Virgília (o marido deputado interpretado por Otávio Müller), que praticamente "roubou" a vida que Brás Cubas queria ter ao se casar com Virgília. Eles se encontravam em uma casa secreta na Gamboa com ajuda de Dona Plácida e um dia, ele quase pega aos dois em flagrante. Ele chega a ficar entre os dois de uma maneira bem constrangedora quando Virgília engravida e depois também quando ela perdia o bebê. 


Ele encontra com a natureza e fica com medo, que pega ele como um pequeno ser humano, ele pede mais anos, mas ela nega isso para ele. No livro temos toda essa expectativa romântica que se converte sempre em tentativas falhas e má sorte, como a morte de Lolo e as idas e vindas,  bad timing com Virgília, o amor da sua vida e que nunca foi sua esposa, ou o preconceito puro com que tratou Eugênia no início, tudo isso é "carma", se entendermos a vida como resultado de escolhas e erros onde magoamos e somos magoados e pagamos por isso "espiritualmente". 



Viu toda a história, e a destruição recíproca dos seres e das coisas, das guerras e da inveja, a cobiça, e começou a ver o futuro com igual monotonia com que via o passado. Quando voltou, viu Virgília e promete depois contar a história com ela, que estava ainda no seu leito de morte. Ela teria sido o grande pecado de sua juventude. Aparece na cena alguém comentando algo na mesa de jantar com o Conselheiro Aires (de Esaú e Jacó e Memorial de Aires).



Enquanto discursavam, ele só queria saber da sobremesa gostosa. Mostra-se os salões onde escravidão e doutrina liberal de capitalismo selvagem imergiam em recitais esnobes onde se mostrava os talentos dessa elite. Voltamos ao nascimento, quando em 1805 Brás Cubas nasce. Mostra a cena pesada dele cavalgando em um escravo. 


Ele era o "menino diabo", a cena dos fios de ovos também é parecida com o livro. O filme corta a cena de Prudêncio e da compra de seu escravo quando ficou livre, esse é um dos capítulos mais importantes do livro, demonstrando a ideia de que o sonho do oprimido no liberalismo fora do lugar era ser realmente o novo opressor.  



Em uma das cenas, ele conta que um conhecido beijou uma senhora e é repreendido por fazer fofoca, daí troca para época da escola e da independência do Brasil, tocando o hino da independência "Brava Gente Brasileira" em forma de instrumental. Aqui já jaz uma crítica, ao falso liberalismo dos costumes que te entrega depois ao despotismo do ditador (uma clara referência ao golpe dado por Dom Pedro I na nossa primeira constituição), quando Dom Pedro I fechou a nossa primeira assembleia constituinte. 


Já mostra ele bobo demais com Marcela que dá raiva, a prostituta, interpretada por Sonia Braga. Eles adaptam um pouco, já que no livro, a paixão durou 15 meses a custa de 11 contos de réis. No filme,  ele dá prata para ela. Ela não tinha a inocência rústica e mal chegava a entender a moral, por isso ele gostava dela. Aqui mais uma referência ao clássico de Taunay, Inocência e ao perfil de mulher do romantismo de primeira geração.  


Ele brinca muito com a moral da época confusa do liberalismo nos trópicos, e diz que a primeira parte dessa grande paixão foi como um "parlamentarismo", lembrando que ele disse crescer no pós independência, quando o Brasil teve sua primeira constituição sob os julgo de Dom Pedro I e da figura jurídica do poder moderador. Uma excelente metáfora da hipocrisia institucional da chamada na época de Constituição da Mandioca, de 1823, interrompida pelo imperador que queria poderes absolutos, porque você tinha que ser proprietário rural e dono de escravos para votar. 


Prova disso é que ele diz que Brás Cubras deu um "golpe de Estado" no coração da moça, assim como Dom Pedro I que estava com a amante quando "declarou" a independência, também tinha como Brás Cubas predileção a esse tipo de mulher, principalmente no início da vida. 


Presentes tão caros para colocar ela nas "poses que o namorado gostava" como disse em uma das páginas do livro, enquanto ela dizia para ele: "Você é das Arábias" para elogiá-lo como amante. Ela era cara e ele quase faliu. Apelando para o gerente de banco para manter a mulher.  



Quando o pai sabe da vergonha, manda ele estudar em Portugal. No primeiro dia ele pensa em se matar, no segundo virar padre. Quando ele chega lá, tem corredor polonês com os novos alunos, mostrando como eram as universidades naquela época. Ele disse que não é que os livros não tivessem ensinado para ele, é que ele escolheu por falta de interesse só decorar as fórmulas, o vocabulário e o esqueleto do conhecimento acadêmico. 


Em referência estética ao bardo português, vemos ele como jovem nas ruas de Lisboa e com isso, vemos a serenata, os jovens influenciados por Byron e o mal do século, como sugere em uma das cenas que ele e os colegas confraternizam com o corpo sexual, mas que era na verdade, uma aula com um cadáver. Brincando aqui com os limites de sagrado e profano. 


Ele disse que quando recebeu seu diploma se sentiu enganado e vitorioso. Se formando em direito. Depois ele resolveu "andar pela Europa". Ele disse apenas que conhecei a Itália com Isabela, Carmenzita na Espanha, em Londres com Margareth, e  Paris com Shelly e a Alemanha com Helga. Aí ele recebeu uma carta de seu pai. 




Na constituição das imagens que mostram o filme o Brasil de sua volta, ele já com diploma da faculdade de Lisboa, vemos o Brasil nas pinturas de Debret (pintor francês que veio para cá com as missões científicas francesas). 


Mostra ele no leito de morte da mãe, prometendo cuidar de tudo. Foi para a chácara na Tijuca. Pela primeira vez pensou em morte com a morte de sua mãe. Dizendo aqui que a franqueza é a primeira virtude de um defunto. Já que é o elemento da vida que faz você aprender a enganar e trapacear os outros, nisso os românticos estavam certo. O desprendimento da morte cura tudo, todos os malês. 


Vemos então ele conhecendo Eugênia, e diz que ela está aprendendo francês. Mostra ele reparando que ela mancava de leve, ela diz para ele que é coxa de nascença. Mostrando ele incomodado com isso. O pai quer para ele um "lugar de deputado e um casamento", mas ele não quer. 


Aí vemos que o pai tinha tentado colocar Virgília a senhora que estava no seu leito de morte de cabelos brancos. Virgília, a filha do conselheiro Dutra. Assim vemos como ele dá tutorial de como dar o primeiro beijo nas moças. As cenas de exemplo aqui muito sobre objetos ao estilo de Machado, é quando ele fala sobre o prazer de tirar a bota apertada, ao ser cuidado pela escravo como um momento de alívio. Ou seja, a dor tem que ser doída para depois gerar o relaxamento.


Mostra ele fazendo corte a Virgília, (a senhora que está em seu leito de morte como amiga). Dizendo que dessa vez ele não precisou levar flores. Enquanto ele vagava na rua, vemos a cena do relógio dele que cai no chão e quebra. Vemos Marcela velha e pobre na loja do relógio. Apareceu o Lobo Neves que promete que virará marquês e que acabou roubando Virgília dele e a candidatura política, sem ser nem mais bonito ou esbelto. 



Como não funcionou com Virgília, o pai morreu de desgosto por não conseguir casar o filho e torná-lo deputado. Ele comenta em certo momento meditação como uma técnica dos orientais para esquecer de tudo, nisso entendemos ser uma referência ao individualismo na sociedade, ou como bom ou como ruim. Nisso ele continua seu caso com a casada Virgília, agora que tudo era contra eles, eles estavam apaixonados do que nunca. 



Ele disse que não mancharia essa estória com sangue, mas não fez. Apenas imaginou fazer. Ele enfim arrumou uma casa para viver seu ilícito com Virgília. 



Essa cena aqui é do Quincas Borbas (outro livro de Machado) se apresentando para ele, ele falou das festas onde figurava de rei e que virou mendigo. Ele promete arrumar algo para ele depois, ele pede nada além de dinheiro. Acabou ficando com o relógio dele. 



Ele disse que tinha novidades em relação ao marido de Virgília, ficaria com uma província do norte ( mesmo tema como em Esaú e Jacó), é pedido para Brás Cubas ser secretário, mas ele não precisa, por superstição do número 13, o cara não quis ir por conta disso. 



Viram o ápice do amor no pico das montanhas e depois eles desceram para não subir mais. Virgília engravidou para perdeu o filho e por isso que ele começa o filho com a frase de que não deixaria legado de miséria para ninguém. Depois de perder o filho, ele ficou sem ânimo para nada mais, nem em festas e teatro. Chegando aos 40 anos sem ser pai ou ministro, por isso meditava no meio da multidão.. 


Ele conhece a inhá Lolo,  e por isso veio a pensava nas roupas, por isso que Lolo estava bonita, com seu vestido tão decotado, então por isso imaginou a nudez humana e constatou que se todos estivessem pelados, a curiosidade e a libido não seriam tão impactadas, ou seja, que nos cobrimos para nos imaginar despidos. 


As roupas que provocariam e despertariam a natureza humano e seu desfrute. As roupas teriam então papel decisivo na perpetuação da espécie. Isso é engraçado, pois mostra como que Machado de Assis ironizava o elemento da indumentária, que segundo seus críticos, não era sua forte descrição (como se quisessem dizer que ele era menos autor por não focar em descrever roupas), aqui ele faz toda uma filosofia sobre as roupas (ou a falta delas o que provocaria). 

Virgília e ele estavam quase terminando e sendo pegos juntos, mesmo com a cobertura de Dona Plácida. Ainda imaginou se desafiaria para um duelo Lobo Neves, mas aí pensou se não seria melhor arrumar uma mulher casta em uma fazenda mas eram apenas pensamentos... Aí ele recebeu o relógio em mensagem. Quincas Borbas (interpretado no filme por Marcos Caruzo) foi agraciado e não era mais mentiroso e elitista que Brás Cubas. Tudo mudou porque herdou uns tantos contos de um tio que morreu. Logo, o mendigo ignorado por todos deu a volta por cima com uma herança.




Assim ele ficou desanimado e começou a sair com o ex amigo. Quincas Borbas agora era rico, mas no outro livro, ele era o filósofo de Barbacena que também era o nome de seu cachorro, assim seu amigo Rubião é o destinatária de toda sua herança. Ele compara filosofia com comida, em uma forma de brincadeira com o 'humanitismo', que seria a vida humana como uma forma de dádiva que começaria no nascimento, com um nobre sentimento de contemplação da qualidade humana, mas de qual tipo ser humano? É uma pergunta que podemos fazer ao olhar indivíduos egoístas como Brás Cubas. 


 Ao mesmo tempo que queria muito ter filhos. Pensou em Loló. Na rinha de galo, o pai da moça se perdeu com apostadores e Loló saiu com Brás Cubas, ele beijou ela, mas morreu na primeira epidemia de febre amarela. Uns achando que eram os imigrantes, outros escravos, outros achavam que era castigo divino. 


Ele volta a ver Virgília um pouco mais velho, com 60 anos vemos sua mudança, na idade da "ciência e do governo" como disse Quincas Borbas para ele.  Se tornou deputado e fez promessas em nome do futuro da família e da nação. Ao ele se filiar a uma ordem benemérita e por isso ele não contaria sobre como ajudou os pobres e enfermos... 


Visitando cemitérios, velórios e funerais e em uma dessas vezes encontrou Virgília, quando diziam que ele iria ser ministro. Com sinceridade traiu o marido, chorou com a mesma sinceridade por sua morte em seu velório. Quincas Borbas volta para dar sua análise e disser que ele queimou toda sua teoria do 'humanitismo'. Ele agora tinha prazer em agradecer em ter nascido. Morrendo um tempo depois repetindo que a dor era uma ilusão. 


 Aqui no fim do filme ele aborda parte do meio da estória sobre a criação do Emplasto Brás Cubas, uma grande ideia publicitária que prometia o adeus a melancolia. Ele queria inventar um remédio para acabar com a melancolia, como dos médicos homeopáticos. Desde 1869, a serviço dos homens e da felicidade das nações.  Um remédio para aliviar a melancolia. Tornariam ele eterno. 


O fim mostra muitas pinturas brasileiras, como de Candido Portinari e outras obras típicas brasileiras que o filme traz ao fim, para mostrar essa "janela da modernidade" que era a visão de Machado. Vemos então ele abrindo a  janela enquanto ele jazia na cama mais uma vez de volta ao começo, no caso da estória, o começo como o leito de morte.  


Bás Cuba se orgulhava se não ter comprado o pão com o suor do rosto e de não ter filhos. Com um pequeno saldo positivo ele avaliava sua vida, não teve filhos não transmitiu para nenhuma criatura o legado de nossa miséria, ou talvez ele tenha transmitido e ninguém sabe, a piada é essa. Jamais saberemos dos mistérios do velho bruxo do Cosme Velho.

 



Comentários

Em Alta no Momento:

"1883" (2021): Análise e curiosidades da série histórica de western da Paramount

Vai Trabalhar, Vagabundo! (1973): Clássico do Cinema Nacional baseado em Chico Buarque busca a malandragem carioca perdida

Quelé do Pajeú (1969): História do interior de Pernambuco, cangaço e ilegalismos marcam faroeste de Anselmo Duarte



Curta nossa página: