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Passagem para a Índia (1984): Adaptação histórica de E.M. Forster reflete sobre o Orientalismo e o relacionamento conflituoso entre ocidente e oriente em romance de britânica com indiano

Filme inspirado no livro de  E.M. Forster. Na década de 1920, durante o período conhecido como Raj britânico. Tudo acontece quando Adela, recém-chegada ao país, quer encontrar "a verdadeira Índia". Ela decide explorar as cavernas, mas acaba se perdendo do grupo, tem um surto e surge machucada. Eis que Azis, médico local que a acompanhava, é acusado pelo crime, fazendo surgir dúvidas sobre o que aconteceu na caverna e sobre o suposto crime 


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Todo o filme e livro se resumem em uma ideia de choque de civilização, sendo uma obra de 1920 bebe em muito no realismo, tem uma ideia parecida com a de Machado de Assis em Dom Casmurro. No clássico da literatura brasileiro, Bentinho (o garoto tímido) ficava refém dos encantos da "garota com olhos de cigana oblíqua e dissimulada". Aqui, é Adela se confunde pelo charme de Azis. 


No romance brasileiro, o tema mais debatido por todos é se Capitu teria ou não traído Bentinho, nesse romance, o tema secreto é o envolvimento entre Azis e Adela e isso não é a toa. 


São muitas diferenças do livro pro filme, se o filme é mais impessoal e romântico que o livro, o filme soube brincar com a semiótica e dos símbolos deixados pelo livro, mas cultivando diferenças. No livro, ele disse que era casado, mas na verdade era viúvo. 


De qualquer maneira, essa ameaça erótica do continente selvagem faz Adela se encantar por Azis, que gasta absurdos para agradar as inglesas. No século XIX, o tema da histeria feminina estava começando a ser denunciado como uma ciência falsa, e esse livro capta um pouco desse clima entre a "fantasia" e a "psique feminina". Durante o julgamento, fica evidente o poder do colonialismo e do racismo e a pouco possibilidade de democracia.


Podemos pensar na mensagem sobre o orientalismo que o filme agrega, o poder da religião nos costumes e na ideologia, na questão do misticismo local, na ideia do começo do contato de indianos e ingleses ter ocorrido a partir do ciclo do mercantilismo. Quem primeiro conhece Azis é a senhora Moore, identificando certo um deus no templo local. A Adela deixa de gostar de seu noivo, um funcionário público que queria prender Azis antes mesmo do ocorrido na caverna budista. 


Ele relembra os imperadores mongóis que chegaram na Índia e se diz descendente deles. Aqui temos uma crítica ao carácter da literatura inglesa vitoriana que acreditava na redenção do amor pelo casamento. Ao exemplo de Perséfone (a deusa das ervas), que foi sequestrada por Hades. Ao Adela sair da caverna toda arranhada, encontra justamente a mulher do governador local. O escândalo estava feito.  


No livro, a alegoria das cavernas se constitui em uma referência ao eco ensurdecedor das cavernas, importantes na religião hindu, mas no budismo, como também no janismo. Fielding é mais legal no filme, é o personagem "centralista" que foi escolhido para ser o guia da audiência, mas que no livro acaba por ter tons errados, como todos os envolvidos na história são descritos de maneira precisamente realista. No livro, o primeiro motivo da briga entre os dois foi religião, uma questão muito séria em termos de países e sociedade. Esse controle religioso político impede pessoas de religiões diferentes de poderem conviver, ser amigos ou até mesmo namorados. É uma forma de condenação da amizade entre os povos. 


O principal tema desse livro, é o debate sobre o que realmente aconteceu na parte do filme e do livro da caverna, no livro,  a parte da caverna é tão longa e descritiva quanta a parte do julgamento, no filme o julgamento é bem mais rápido e restrito a declaração de Adela. No filme, essa parte é bem curta para passar aquela sensação de dúvida sobre o que teria acontecido. No livro não há sombra de dúvidas, a escrita subjetiva de contato com a espiritualidade, no caso dele, mulçumana e indiana acabou por fascinar Adela que estava em uma busca intelectual pela autenticidade real, e por isso que dá tudo errado. O princípio humanista de conhecer culturas diferentes reside em enfrentar limites de comunicação.  


Ela foi descrita como feia no livro, como uma acusação sexista por simbolizar uma mulher não sensual, com seios pequenos e que havia estudado muito antes de aprofundar seu dogma cristão e este foi o motivo do "término" sentimental e abstrato entre Azis e Adela. A passagem de tempo do livro dá a impressão que na verdade a parte da caverna durou muito tempo, tanto que eles dão bom dia um ao outro em um dos momentos do livro. Gandhi pregou pela independência da Índia os preceitos do Ahinsa, pela paz e não violência. Adela tem uma libertação individual e solitária e então ela se redime de sua fantasia com Azis.


O motivo do conflito entre os dois foi que Azis que até então se comportava como o melhor cavalheiro inglês, galante e contador de histórias com H maiúsculo, contou sobre os seus ancestrais que eram fieis imperador antigo local. Enfim, ele era igual o autor do livro, E. M. Forster, um autor que estava atento aos problemas modernos do ultra liberalismo britânico. O personagem da senhora Moore me lembra a senhora do "The Lady Vanishes", já que muito de esquerda, não acreditava na culpa de Azis e até morreu ao ser exilada contra sua vontade, virou busto de memória para os locais, assim como Azis, que se tornou anti Império Britânico com toda a situação. 



Quando no julgamento, a senhorita Quested diz com todas as palavras que ele não a seguiu para dentro das cavernas, ela o liberou da acusação, sua personalidade foi muito real e resistente uma vez que resolveu falar a verdade. O livro é cruel em mostrar como trataram ela mal de todas as maneiras, ela queria viver em um bangalô local sem serviçais e nunca mais queria amar ou se aventurar, mas o advogado de Azis resolveu interferir por preocupação com "sua segurança", e assim ajudou ela a dormir na faculdade segura e depois a voltar para Londres e para sua casa e fortuna. Como ficou do lado certo da história, a senhorita Quested foi meio que perdoada por todos, mas a marca do racismo dos ingleses permanece como a maior ironia ácida do livro.

   


O livro foi escrito em 1924 lembrando a viagem que o escritor havia feito entre 1912/1913, ele foi aconselhado por um mulçumano, Syed Ross Massod. O autor recusou até o fim de sua vida que sua obra fosse adaptada por medo de mudança em seu trabalho. Ele recusou diversas ofertas pelo filme. Mas permitiu uma adaptação de uma escritora indiana em forma de peça de teatro. Forster queria que sua ideia original de não pesar entre os ingleses e os indianos e que em filme isso poderia ficar difícil de captar. Inclusive, disse não ao diretor do filme, que havia lido o livro e também visto a peça em Londres, em 1960. Depois da morte de Forster em 1970, o corpo docente da King's College de Cambridge que herdou os direitos para seus livros.  Quando o professor Bernard Williams, um fã e entusiasta do livro virou chefe executivo, os direitos do livro se tornaram disponíveis. 


O livro também é comentado como um exemplo de feminismo pós colonial, que denuncia que as mulheres em países de terceiro mundo podiam sofrer com dupla colonização, da visão do patriarcado local em face da visão dos ingleses imperialistas. Essa visão de feminismo pós colonial ajuda a entender que até então o feminismo ocidental não podia ser suficiente para resolver problemas de discriminação de gênero como esse.  No livro, vemos duas mulheres que desafiam os padrões da sociedade e são julgadas em certos padrões absolutos. Um aviso um pouco machista para o terceiro mundo não importar a visão do feminismo ocidental


Filme que é uma adaptação literária de um livro clássico dos anos 1920 de E.M Forster, que é um escritor britânico formado em línguas clássicas e história, por isso seus livros quase sempre tinham esse tom de descrição política e histórica locais. A reflexão de que a causa pessoal de um homem pode virar uma militância coletiva é uma ideia suscitada no clássico romance. 


Esse foi o último filme da prestigiosa carreira de David Lean e o primeiro longa-metragem que ele dirigiu em quatorze anos desde Ryan's Daughter em 1970. Também é dele o clássico dos clássicos Lawrence da Arábia, A Passage to India recebeu onze indicações no 57º Oscar, incluindo Melhor Filme, Melhor Diretor e Melhor Atriz pela atuação de Judy Davis como Adela Quested. Ganhou o prêmio de Melhor Atriz Coadjuvante pela atuação de Peggy Ashcroft como a Sra. Moore, tornando-a, aos 77 anos, a atriz mais velha a ganhar o prêmio, e Melhor Trilha Sonora Original para Maurice Jarre, incrível e marcante, ganhando seu terceiro prêmio nessa categoria do Oscar.


Adela Quested está navegando da Inglaterra para o Raj da Índia britânico com a Sra. Moore, a mãe do futuro noivo de Quested, Ronny Heaslop, filho da Sra. Heaslop é o magistrado da cidade em Chandrapore, a grafia anglicizada de Chandrapur. Adela pretende ver se consegue. As senhoras ficam desapontadas ao descobrir que a comunidade britânica está muito separada da população e cultura indianas com um crescente movimento de independência indiana na década de 1920. Eles são encorajados quando o superintendente da escola local, Richard Fielding, os apresenta ao excêntrico erudito brâmane hindu, professor Narayan Godbole. O Raj da Índia britânico era o modelo de organização onde os britânicos escolhiam os funcionários públicos de acordo com seus interesses nas áreas de colonização submetidas aos britânicos, e que durou de maneira direta de 1858 até 1947.


A Sra. Moore (Peggy Ashcroft) conhece por acaso outro indiano local, o Dr. Aziz Ahmed, um viúvo que se surpreende com sua gentileza e falta de preconceito. Aziz se oferece para organizar uma excursão às cavernas locais de Marabar. O personagem de Fielding foi o que o filme mais gostou em termos de cenas que eles adaptaram, mas no livro sua índole de homem médio inglês, que ainda assim adora Azis é questionável já que no fim ele se casa com a irmã de Ronnie e filha da senhora Moore, e ele havia ficado com raiva achando se tratar de Quested, e que ele "podia roubar seu dinheiro", agora ela seria  sua inimiga oficial, mesmo assim, dois anos depois, ele consegue escrever uma carta para ela que Fielding entrega para a rica londrina depois. 


Adela representa a Inglaterra, ou o melhor da Inglaterra e o pior também, uma mulher inteligente, resignada e altamente educada, porém sonhadora e inocente até certo ponto. Adela seria como a Inglaterra, onde as mulheres são melhores que os homens sem nenhuma dúvida, qualquer consulta a história prova disso. Azis representa o típico cara ao estilo dos partidos da elite da Índia, que obedeciam ordens régias de estratificação da sociedade e acreditavam eles mesmos na ideia de distinção de classe social e de até certa escravidão, porque não refletir sobre isso também? O autor então ataca o pior do colonialismo britânico e seus preconceitos, mostrando os homens ingleses, como ele, como a pior escória. 


Como Ronnie, o noivo de Adela, funcionário público inglês que queria nenhum contato com os nativos do país. Era claro que Adela não queria casar com ele e apenas comentou que faria para irritar Azis. Aqui nesse livro histórico,  algumas metáforas são construídas através dos personagem, Adela Quested, como o nome já diz, queria aventura, queria conhecer "a verdadeira Índia", e que depois perdeu a vontade por ter descoberto que o Azis depois de ficarem juntos por um tempo nas cavernas era casado, quando ela perguntou se tinha apenas uma esposa, ele se ofendeu.  Mas isso não mostra nas outras partes do livro. O que acredito que aconteceu é que ele tenha mentido para ela. Como se tivesse tido que apenas havia uma esposa possível para a vida de um homem em um plano geral. 


Em certo momento do livro, o advogado admite e diz algo como "talvez Adela tenha amado Azis e Azis tenha amado Adela", mas a fúria dos acontecimentos posteriores transformou eles em inimigos históricos, e o livro em uma espécie de lição moral que capturava o clima do fim da era dos grandes impérios antigos, conseguindo você ao ver o filme sentir certo ambiente histórico nostálgico antigo, ao estilo Titanic.  



No fim do livro, quando o advogado de Azis e amigo de Adela, Fielding pergunta o que aconteceu de verdade, ela parece admitir que não queria entrar mais na questão e que preferia agora mentir que nada tinha acontecido. Falou "pode ter sido o guia", disse ressentida. Quem era o guia era o próprio Azis, desde quando se conheceram na festa. No fim, ela admitiu para ele que achou que tinha "recebido uma proposta de casamento" e por isso ficou magoada com descobrir que era casado (isso no livro), não tem essa cena no filme. A cena que parece mesmo referência sexual é os "elementos espirituais da terra", quando a lua cobre o sol, ou o chapéu voando, como no filme e o principal elemento é o elefante, o mesmo que eles andaram juntos e ele metendo as patas na lama em sequência. 



Esse foi o momento do rompimento deles no livro depois de muitas e muitas cenas juntos na descrição do livro onde conversavam abertamente sobre história e filosofia; é óbvio que o autor se identifica e coloca Azis como uma espécie de working class hero a la Lula, mas ele não é isso, ele é um médico da elite local que também queria até certo ponto conhecer os ingleses e entreter seus convidados. 


A medida que ele se torna antibritânico, fica magoado com Adela por ela ter sido usada por Ronnie para se vingar já que correu o boato de que ele tinha sido traído, como ele era o juiz local mandado pelo Império Britânico, ele usou seu poder para dopar Adela que ficou recebendo medicação para dormir por dias, e também para sanar seu orgulho ferido. Mesmo assim, ele ainda queria se casar com Adela, que não quis mais fingir ser uma esposa de um funcionário público sem emoções. Ao perguntar de amor a Azis, Adela o assustou e ele foi tomar um cigarro, ela começou a passar mal com o eco da caverna e aí ficou tonta e caiu e depois foi achada ensanguentada e com cactos sob sua pele.  






Ao ser perguntado sobre amor, casamento e poligamia, ele se afastou e disse antes que na tradição que ele fora criado havia apenas uma esposa. Esse é o que mudou para a adaptação cinematográfica de Lean, seu último filme, o cineasta do clássico "Lawrence da Arábia (1962)". 


No filme, sua esposa havia morrido e a cena dela perguntando sobre se ele teria esposa foi encurtada, então a barreira eram as leis óbvias de diferença e estratificação que haviam para os ingleses funcionários públicos ingleses que nada queriam com a população local e que viviam em clubes fechados e os indianos locais que eram muito mal tratados, além de conviverem com o início dos movimentos sociais nacionalistas. O romance é centrado do tema do arrependimento do desejo carnal, e gosta de evidenciar o racismo dessas pessoas em relação a população local real do país, até mesmo o rapaz de elite indiana, com ascendência afegã e turca escapava desse recorte, como ele disse ao fim ao perdoar a senhorita Quested, que virou sua pior inimiga com a queixa de Ronnie.  


É um filme épico, envolvente e intrigante, que envolve questões raciais, civilizacionais e históricas. A "caverna" por muitos anos foi motivo de questionamento do público para o autor do livro e para o diretor do filme: Afinal o que teria acontecido na caverna? O envolvimento de ambos está comprovado na proximidade e no subjetivismo das passagens. Porém, vai além: a caverna é onde reside para o autor os romances proibidos, onde o isolamento e estranhamento de todos ao redor, transforma o romance em uma "fuga do mundo" difícil para muitos. Recomendo muito esse filme, pois além de incrível ele é pouco conhecido, mas extremamente atual para hoje em dia.  


História por trás do filme


As locações para representar a fictícia Chandrapore, foram realizadas em Mumbai, Maharashtra, na Índia. As cavernas de Marabar são nome para as cavernas de Barabar, em Lomas, Rishi Cave, localizado no distrito de Jehanabad, distrito de Bihar, que Forster visitou durante sua visita a Índia. A exploração inicial das cavernas mostra que o tamanho da festa deve ser limitado quando a Sra. Moore sofre de claustrofobia e o barulho da grande comitiva ecoa exponencialmente dentro das cavernas. A Sra. Moore encoraja Adela e Aziz a continuar a exploração das cavernas sozinhas com apenas um guia. 


É quando acontece a cena dela tonta se perdendo em uma das cavernas e o expectador é levado a tentar preencher as lacunas daquilo que foi deixado fora da cena. O livro vendeu 30,000 cópias apenas na primeira semana na América marcando o boom que a ideia foi para sua época, e o filme foi feito apenas depois da morte do autor em 1970.Outra coisa interessante é que o autor escreveu esse livro para Masood, um amigo que o inspirou a visitar a Índia e por quem tinha sentimentos não correspondidos. Nessa visão o autor se coloca como a garota do livro. 


Eles chegam às cavernas em uma elevação mais alta, a certa distância do grupo e, antes de entrar,  quando Aziz se afasta para fumar um cigarro. Ele retorna para descobrir que Adela desapareceu. Pouco depois, ele a vê correndo morro abaixo, desgrenhada. Ela é apanhada pela esposa do médico, Sra. Callendar, e levada para a casa dos Callendar. Adela está sangrando e delirando. Dr. Callendar medica Adela com uma seringa hipodérmica. Deixando Adela incomunicável e presa na casa dos Callendar, ela não pode dar a versão dela do que aconteceu. 


Ao retornar a Chandrapore, o Dr. Aziz é acusado de tentar estuprar Adela dentro das cavernas, é preso aguardando julgamento e o incidente se torna uma causa célebre. A Sra. Moore acredita firmemente que Aziz não cometeu nenhum crime e parte da Índia para a Inglaterra. Aparentemente aproveitando sua passagem no mar, a Sra. Moore de repente sofre um aparente ataque cardíaco e morre.


No tribunal, Adela é interrogada pelo promotor, que fica atônito quando Adela responde que o Dr. Aziz nunca entrou na caverna, onde ocorreu o suposto atentado. Fica claro para Adela que sua acusação anterior assinada de tentativa de estupro era falsa, então ela se retrata. Aziz é libertado e celebrado por sua inocência. Adela é abandonada por conta própria pelos britânicos, exceto pelo Sr. Fielding, que a ajuda a ficar em segurança na faculdade. Ela planeja voltar para a Inglaterra o mais cedo possível. Aziz se livra de suas associações ocidentais e jura encontrar um novo emprego em outro estado indiano; ele abre uma clínica na área do lago perto de Srinagar, Caxemira.


Enquanto isso, por meio de Adela, Fielding se casou com Stella Moore, filha da Sra. Moore de seu segundo casamento. Aziz finalmente se reconcilia com Fielding, e Aziz escreve para Adela pedindo-lhe que o perdoe por demorar tanto para apreciar a coragem que ela exerceu quando retirou sua acusação no tribunal. Eles terminam o filme escrevendo um ao outro cartas. Azis perdoa a dívida de Adela, e acha que ela vai casar com Fielding, mas é surpreendido pela informação de que ele na verdade casara com a filha do segundo casamento da senhora Moore. Azis se torna símbolo de resistência nacionalista mesmo sendo um mulçumano na Índia, outro conhecido e seu amigo Brâmane vira ministro da educação. 


No tribunal, Adela é interrogada pelo procurador, que fica impressionado com a resposta de que Azis nunca esteve nas cavernas, Azis é liberto para celebrar sua inocência e vira herói local. Azis se muda para outro lugar, em Srinagar, em Kashmir. O livro A Passage to India, de E. M. Forster, publicado em 1924, foi alvo de algumas polêmicas e críticas por abordar temas sensíveis como o racismo, o colonialismo e a amizade entre culturas diferentes. No livro, Azis é casado, sendo mais escandaloso ainda. No filme, ele é um viúvo, sendo a principal diferença entre livro e filme.


Alguns temas do livro são interessantes e polêmicos, o livro foi banido na Índia por ser considerado preconceituoso, mas também foi criticado por ser antibritânico e ter feito propaganda a favor da independência da Índia , ou seja, nenhum dos grupos gostou da tentativa do autor, praticamente irritou a todos. É aquele tipo de livro de realismo extremo. O autor não queria vender os direitos para adaptar a ideia porque ele acreditava que apenas o livro podia abordar com precisão a ideia de que os dois lados estavam "errados", e ele sabia que se fosse adaptado teria uma preferência do eu-lírico por uma visão ou outra, ou seja, ele apontava que a beleza de seu livro é a duplicidade de sua interpretação, como em todos os clássicos modernos. 


O incidente central no ataque na caverna fica em aberta se acontece ou não, ou se foi tudo na cabeça da moça inglesa, como a traição de Capitu em Machado de Assis. Sendo um dos pontos que são criticados do filme. A não definição brinca dos todos os julgamentos sociais possíveis, tornando esse livro essencialmente um produtor moderno que busca debater mais do que definir completamente, é uma literatura não maniqueísta. A caverna pode ser o estado mental de privacidade e sexualidade, como na alegoria da caverna de Platão.


 O autor coloca Azis como o personagem de maior identificação geral e despreza todos os ingleses, com exceção de suas mulheres, parece. Azis conversa com grande versalidade sobre história e filosofia com Adela, essa suspensão é característica do subjetivismo na escrita, entre a visão terrena e celestial, entre o sólido e o nebuloso, entre o sagrado e o profano são parte da forma como ele escolheu referenciar a Índia. 


O romance entre o racionalista britânico e o romance subjetivista da literatura hindu, seria uma forma de dizer que esses elementos se encaixavam na ideia de dominação inglesa do local que é por isso que o livro gera debates e interpretações variadas de acordo com quem lê, e não vi nenhuma tradução em português do livro, eu li ele em inglês mesmo e esse jogo de palavras em código literário da proposta do livro é interessante para quem quer aprender com um autor que é formado em línguas e em história, explicando a seriedade e a ambientação absurdamente precisa  e descritiva do livro. A parte que Azis e Adela estão conversando com o professor Godbole (Alex Guiness) enquanto fumam é interrompida pelos ingleses que dizem que "duas senhoras ingleses não deviam ficar a sós com um homem indiano", e diversas outras passagens onde os racistas ingleses argumentavam o caso usando de teorias pseudo científicas de superioridade racial, uma criminologia oriental nas palavras deles. 



No fim, Azis no casamento do filho usa roupas tradicionais locais e não mais as roupas ingleses de terno e gravata, e aquele ele não gosta mais dos ingleses. O filme tem um tom crítico ao típico orientalismo da visão daqueles que "se aventuram" ao estilo militar para querer desbravar algo quando não sabem nada sobre o local ou as pessoas nativas dali. O escritor Said que escreveu sobre o orientalismo cita o romance como exemplo da descrição desse tipo de racismo típico de "procura por aventuras" ou por "lugares exóticos". 


Basta ver quantas vezes filmes da Hollywood clássica utilizavam do orientalismo apenas como pano de fundo para as aventuras dos brancos, como brinca no filme em certa parte, onde Azis imita Douglas Fairbanks no filme O Ladrão de Bagdá (1924). Para Said, o autor achou um jeito de criticar tanto os movimentos nacionalistas locais quanto o colonialismo e sua estrutura sem alterar em nada a estrutura dos estereótipos típicos da relação colonial. ele separa na narrativa mulçumanos e hindus, colocando os hindus como nacionalistas fanáticos que passaram a adorar Azis, e os mulçumanos como racionais e herdeiros da tradição ocidental.  Outros comentam e também pude perceber o tom feminista do romance, onde a desculpa para  aventura é uma forma de cortar as relações de papel de gênero na sociedade que era logrado as mulheres e as pioneiras feministas na Inglaterra da época. 


Os intelectuais do meio de Forster eram Virgínia Wolf, John Maynard Keynes (da teoria heterodoxa liberal), e que criticava os problemas  diversos do liberalismo tradicional, e (do Império Britânico e suas colônias). Esse livro/filme aborda apenas 20 anos antes da independência formal da Índia, que também não aboliram o sistema de estratificação social local mesmo após a independência. Uma crítica contundente aos ingleses em atuação na região. O ator é particularmente famoso entre os filmes indianos, e a atriz que fez Adela também foi incrível, ganhando até mesmo uma indicação ao Oscar pelo filme.


Esse livro e filme são tão maravilhosos e especiais, que tem até mesmo um Café Filosófico sobre o filme, confira:





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