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Os Homens Preferem as Loiras (1953): Arquétipo da loira burra é debatido no filme mais feminista de Howard Hawks



Estrelado por Jane Russell como Dorothy e Marilyn Monroe como Lorelei Lee, uma garota  que cresceu em Little Rock. A inspiração original foi em uma novela de 1926 de Anita Loos, a "loira burra", personagem de Marilyn Monroe. Mas Hawks faz um revival da era dos anos de 1920, com a influência dos filmes musicais ao estilo da Broadway, sendo baseada em uma peça de comédia musical de 1949. Com elenco de nome, como Charles Coburn, Elliott Reid, George Winslow, Taylor Holmes, e Norma Varden. Possuindo situações hilárias e números musicais extremamente bem dirigidos, foram dirigidos de maneira impecável pelo coreógrafo Jack Cole, enquanto a música do filme foi escrita por Hoagy Carmichael, Harold Adamson, Jule Styne e Leo Robin 


O filme começa com o número de Lorelei Lee e Dorothy Shaw, que se apresentam cantando de vestido vermelho uma música sobre desilusões amorosas de Little Rock. 




Elas são dançarinas e melhores amigas. Enquanto Lorelei é "inocente" e apaixonada por diamantes, Dorothy é esperta, e procura por um tipo diferente de amor, não se importante com o dinheiro. Enquanto Lorelei está noiva de Gus Esmond (Tommy Noonan), que é um "nerd" milionário, e que é igualmente "inocente"(muito parecido com Arthur Miller). 




Gus é o noivo de Lorelei, mas duvida de suas intenções por influência de sei pai, que não aprova o casamento com Lorelai. Eles iam se casar na França, mas o pai de Gus impede proibindo o casamento antes deles saírem, aí Lorelai resolve viajar com ou sem Gus. 




Por isso que o pai de Gus contratando um detetive Ernie Malone (Elliott Reid) para espiar Lorelei. Durante o cruzeiro, Malone se apaixona por Dorothy, melhor amiga de Lorelei, que conhece na viagem um homem muito rico, chamado Francis Beekman, conhecido comon"piggy (porco)". Lorelei convida Piggie para sua cabine, e lá Malone tira uma foto dos dois fazendo "bico" imitando uma cobra, (role play). 






Dorothy que tinha passado a noite anterior com Malone o flagra tentando prejudicar a amiga e logo avisa a Lorelei, ambas armam um plano para reaver as fotos colocando boa noite cinderela na bebida de Malone. 



Quando conseguem reaver as fotos, Lorelei pede uma tiara de diamantes de presente, só que a joia foi um presente que Piggy deu a sua esposa. Para reaver as fotos e salvar a reputação de Lorelei, as duas chamam Malone para tomar um drink e colocam um boa noite cinderela na bebida dele. 





Depois disso Malone que havia mentido sobre ser rico como parte do disfarce, diz que se interessou de verdade por Dorothy e diz que ela está perdendo tempo defendendo sua amiga, dizendo que ela era uma interesseira. 



Enquanto Piggy viaja para a África e desaparece, a polícia prepara uma armadilha para prender Lorelei no hotel pois a esposa de Piggy deu a tiara como "roubada", mesmo sendo um presente dele. Depois disso elas cantam sobre corações partidos tomando café, em mais um momento musical.



  

Ao mesmo tempo, o hotel fala que seu noivo cancelou sua "carta de crédito" e que elas foram expulsas do hotel por conta da informação. É aí que sua amiga morena Dorothy coloca uma peruca e finge ser sua amiga Lorelei em seu julgamento por causa da denúncia da tiara de diamantes.




Malone fica chocado ao ver que sua namorada está interpretando todos os sinais e arquétipos da "loira burra", mas para defender sua amiga Lorelei. O julgamento vira um número musical, e Malone descobre que foi o próprio Piggie que roubou a tiara e colocou a culpa em Lorelei. 




Quando Gus aparece no show para ver Lorelei, sua amiga diz para ele ficar ali para ver seu número, a apresentação é a icônica cena "Diamonds are girl's best friend".  




A cena  ficou marcada na história do cinema e influenciou diversas adaptações e versões, uma das mais legais sendo o videoclipe da música Material Girl, da Madonna. No início do clip é possível ouvir o diálogo onde Madonna fala que os homens acham que a compram com presentes caros, sendo na verdade, esse tipo de atitude paternalista que afastaria as garotas como Marilyn e Madonna. Uma boa forma de explicar o filme para quem não entendeu a ironia. O clip recria a cena clássica. 




Lorelei impressiona Esmond ao falar a verdade e dizer que dinheiro é importante para ela, ela o convence usando um exemplo estrutural sobre dinheiro, perguntando que se ele tivesse uma filha, gostaria de que ela se cassasse com um sem sem pensar no financeiro. 




 Malone e Gus casam com Dorothy Shaw e Lorelei Lee respectivamente, em um casamento duplo. Fim. 



 

 Minha opinião sobre o filme


O tipo de cinema feito por Howard Hawks tem uma marca própria. A maioria dos filmes dele, principalmente do início da carreira são sobre frases e ditos populares, como His Girl Friday, Bring it Up Baby, ou mesmo Os Homens Preferem as Loiras. Em todos os seus trabalhos, há uma concepção de feminismo atrelado com a liberdade sexual e independência das mulheres. Seu filme favorito de todos é Scarface, um clássico sobre Al Capone, famoso produtor e  distribuidor de bebidas na época da lei seca. 


Dorothy (a morena) deveria representar o exemplo da mulher "sã", mas que ao mesmo tempo, simboliza um dos números de exagero de arquétipo, quando Dorothy ao estilo Olívia Newton Jones, começa a cantar e dançar  'Ain't There Anyone Here for Love?', em um número com o time americano das olimpíadas, isso ocorreu no cruzeiro onde elas viajaram sozinhas sem o noivo de Lorelei. Apesar de sexualizadas e da contradição de que as show girls vivem de serem vistas como objetos acessíveis aos homens, porém não gostam disso na sua vida pessoal, tendendo ao clima de manipulação feminina. 


Em alguns momentos, a "loira burra" de Lorelei parece estar interpretando papeis, não apenas na parte do musical, mas na própria vida. Dentro da economia material, quando um homem se interessa pela mulher, ele inevitavelmente vai quantificá-la, como uma forma de "compra". Seria essa a metáfora da cena de Marilyn Monroe, ao recusar os corações, ela recusa o 'amor líquido' óbvio, mesquinho e momentâneo da maioria das interações sociais, ainda mais de artistas que trabalhem com a beleza. Elas estariam acostumadas aos elogios, presentes e objetificações de forma a começar a criar formas de lidar com elas para se proteger. 


Apesar de ser completamente infantil, e uma completa imagem da mulher segundo pensada facilmente pelo homem do público médio, ao mesmo tempo que o filme ri o tempo tempo das preocupações dos homens em torno de "babar" as mulheres, ou mesmo o ato de colocar as mulheres em pedestais entre putas e santas. E as mulheres no rádio e no cinema sofreram muito com essa carga. A própria Marilyn virou alvo favorito da mídia americana, que gostava que colocá-la como seus personagens. Como misto também em seu último filme, The Misfits.


As mulheres de Hawks são sempre emocionais, inteligentes e independentes, mas acabam sempre controladas por um "homem esperto". Essa crítica das feministas ao trabalho de Hawks é que suas mulheres por mais admiráveis e modernas, sempre eram pensadas ao molde do desejo masculina. Inclusive, penso que ele exagera em algumas representações exageradas, como o soco na cara da ex-esposa em The Philadelfia Story, ou a questão da "histeria feminina" em Bring it Up Baby. Mas mesmo assim, são boas descrições de atitudes de machismo e mainsplaning padrão. 


A diferença é que nesse filme,  podemos observar que é o primeiro de Hawks que passa em uma análise fria dentro do "teste de Bechdel", que é uma medida para observar se um filme tem o mínimo de representação feminina realista. As histórias antigas de Hollywood, em sua maioria não passam por serem herdeiras de histórias de romance simples, antes do advento do som, a maioria dos filmes não tinham personagem com nomes, era somente o "garoto", ou a "garota". 


Em Os Homens Preferem as Loiras, o entendimento de que duas mulheres tem que conversar sobre algo além de homem para se qualificar no teste. Nesse filme, além das garotas trabalharem juntas e se ajudarem a todo momento, elas não disputam um homem, mas sim se unem para se prevenir do machismo da sociedade. As duas são arquétipos opostos, a loira e a morena. A morena sendo a esperta, inteligente, e a loira sendo a "burra". Muito Marilyn Monroe sofreu com essa falta de profissionalização em termos de entender que a "loira burra" era um trabalho para Marilyn. Nesse filme, a linguagem é feita para ser entendida de maneira facilitada


Bastidores, produção do filme e nuances entre o livro original e a adaptação 





Vários elementos do tipo de comédia e sátira que Hawks costuma a fazer estão presentes nesse filme, chego a dizer que é onde esse tratamento costumeiro do machismo retratado por Hawks encontra uma forma tão exagerada de arquétipo que explica em si que é uma projeção em um filme, não uma realidade verossímil. O filme tem vários elementos característicos, a influência de comédias, como as latinas e brasileiras ao estilo "Alô Alô Carnaval". 




O tom original do beste seller de 1925 de Anita Loos's já carregava muito desse tom de sátira, o livro Os Homens Preferem as Loiras de 1925 foi seguido da publicação de Mas Homens Casam com as Morenas, de 1928. Essa continuação ajuda a perceber a fina ironia do primeiro livro. Era a época do novo padrão de moda para as mulheres Lulu Brooks e o quadrinho das Dixie Dungan faziam muito sucesso. O filme feito nos anos de 1950 parecia uma forma de homenagem aos anos de 1920-30 e toda a seu ambiente. Os custos de produção foram de $2.3 milhões no box office, e o lucro foi de $5.3 milhões de dólares. A adaptação da Broadway foi enviada ao Hawks. Por isso os diversos números musicais do filme. Em uma entrevista, ele revelou que a fraqueza maior de seu filme era ser uma caricatura em cima de sexo, mas não tinha sexo, como nas clássicas antigas screwball comedies.


 Sendo a opinião dele, que o filme teria uma conotação de caricatura ao exagerar de forma arquetípica, de uma maneira quase infantil. O nerd playboy bobo, mas que é mandado pela "loira burra". O Piggie, homem velho e rico, que é babão e que parece ser do tipo rico antigo e monetarista, mas que no duro, nem tem tanto dinheiro quanto tem de pose.  


A ideia do 'homem mandado de mulher', geralmente ricos, é uma constante do tipo de comédia de Hawks, ele gosta de retratar esse tipo de contradição da dependência inversa. Seria o filme último da "ideologia de Hollywood" e dos códigos oficiais, apesar de todo seu arrojo, até mesmo em seus acertos e erros, como em fórmula, utiliza da tradição dos números de teatro musical, de uma maneira quase natural. Aqui a direção de Hawks serve para dirigir números atemporais. Apesar disso, por exemplo, segundo o grande diretor alemão Fassbinder, esse é um dos 10 maiores filmes já feitos. 


Disponível no Telecine


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