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Levada da Breca (1938): Comédia maluca é inspirada em Katharine Hepburn e seu relacionamento com John Ford

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David Huxley (Cary Grant) é um paleontólogo. Nos últimos quatro anos, ele vem tentando montar o esqueleto de um brontossauro, mas está faltando um osso: a " clavícula intercostal ". Somando-se a ele o estresse está seu casamento iminente com a severa Alice Swallow e a necessidade de impressionar Elizabeth Random, que está considerando uma doação de um milhão de dólares para seu museu. Um dia antes de seu casamento, David conhece Susan Vance (Katharine Hepburn) em um campo de golfe quando ela "rouba" sua bola, após uma tacada bem sucedida. Ela é uma jovem de espírito livre, um tanto desatenta. Essas qualidades logo envolvem David em vários incidentes. Para completar, o irmão de Susan, Mark, enviou para Susan um leopardo domesticado chamado Baby, vindo do Brasil. O bicho só se acalma ao ouvir uma canção. Susan acha que David é zoólogo e o induz a levar Baby para sua fazenda em Connecticut. As complicações surgem quando Susan se apaixona por ele e tenta mantê-lo em sua casa o maior tempo possível, até mesmo escondendo suas roupas, para evitar seu casamento. Dudley Nichols foi instruído a escrever o filme inspirado nas características psicológicas de Hepburn, com quem havia trabalhado em Mary of Scotland, de John Ford (1936). Ford teve um caso com Hepburn, e muitas das características de Susan e David foram baseadas no relacionamento entre Hepburn e Ford


A valiosa clavícula intercostal de David é entregue, mas o cachorro da tia de Susan, George, a pega e a enterra em algum lugar. Quando a tia de Susan chega, ela descobre David em uma lingerie de Susan, após a mesma mandar lavar as roupas de David. Para a consternação de David, ela acabou se revelando a doadora em potencial de sua pesquisa, Elizabeth Random. O zoológico é chamado para ajudar a capturar o leopardo. Susan e David correm para encontrar Baby antes do zoológico e, confundido com um leopardo perigoso de um circo próximo com Baby, eles o deixam sair de sua gaiola.


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David e Susan são presos por um policial confuso da cidade, Constable Slocum (Walter Catlett), por agir estranhamente na casa do Dr. Fritz Lehman (Fritz Feld), onde encurralaram o leopardo do circo, pensando que era Baby. Quando Slocum não acredita em sua história, Susan diz a ele que eles são membros da "Gangue do Leopardo"; ela se autodenomina "Swingin 'Door Susie" e David "Jerry the Nipper". Finalmente, Alexander Peabody aparece para verificar a identidade de todos. Susan, que escapou de uma janela durante uma entrevista policial, sem querer arrasta o altamente irritado leopardo do circo para a prisão. David a salva, usando uma cadeira para enxotar o grande felino para dentro de uma cela.


Algum tempo depois, Susan encontra David, que foi rejeitado por Alice por causa dela, em uma plataforma alta trabalhando na reconstrução de seu brontossauro no museu. Depois de mostrar a ele o osso perdido que ela encontrou seguindo George por três dias, Susan, contra seus avisos, sobe uma escada alta ao lado do dinossauro para ficar mais perto dele. Ela diz a David que sua tia deu a ela o milhão de dólares e ela quer doá-lo ao museu, mas David está mais interessado em dizer a ela que o dia que passou com ela foi o melhor dia de sua vida. Eles professam seu amor um pelo outro enquanto Susan inconscientemente balança a escada de um lado para o outro, e conforme ela balança mais e mais a cada balanço, Susan e David finalmente percebem a escada se movendo e que Susan está em perigo. Assustada, ela sobe no esqueleto, causando seu colapso, e David agarra a mão dela no momento em que ela cai. Depois de ela ficar pendurada por alguns segundos, David a levanta na plataforma. Depois que ela o convence a perdoá-la sem que ele diga uma palavra sobre qualquer coisa, exceto reclamar sem entusiasmo sobre a perda de seus anos de trabalho, David, resignando-se a um futuro de caos, abraça e beija Susan.


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Historia por trás do filme 


Em março de 1937, Howard Hawks assinou um contrato na RKO para uma adaptação de Gunga Din, de Rudyard Kipling, que estava em pré-produção. Quando a RKO não conseguiu Clark Gable para o filme e a adaptação de Gunga Din foi adiada, Hawks começou a procurar um novo projeto. Em abril de 1937, ele leu um conto de Hagar Wilde na revista Collier chamado "Bringing Up Baby" e imediatamente quis fazer um filme com ele por ter o feito rir muito. A RKO comprou os direitos de exibição por $ 1.004, e Hawks trabalhou brevemente com Wilde no tratamento do filme. 


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O conto de Wilde difere significativamente do filme. David e Susan estão noivos, ele não é um cientista e não há dinossauro, clavícula intercostal ou museu. No entanto, Susan consegue uma pantera de estimação de seu irmão Mark para dar à sua tia Elizabeth; David e Susan devem capturar a pantera no deserto de Connecticut com a ajuda da canção favorita de Baby, "I Can't Give You Anything but Love, Baby".


Hawks então contratou o roteirista Dudley Nichols, mais conhecido por seu trabalho com o diretor John Ford. Wilde desenvolveria os personagens e os elementos cômicos do roteiro, enquanto Nichols cuidaria da história e da estrutura. Hawks trabalhou com os dois escritores durante o verão de 1937, e eles criaram um roteiro de 202 páginas. 


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Wilde e Nichols escreveram vários rascunhos juntos, começando um relacionamento romântico e sendo co-autores do filme Carefree de Fred Astaire e Ginger Rogers alguns meses depois. O roteiro de Bringing Up Baby passou por várias mudanças, e em um ponto houve até uma cena elaborada luta de tortas, inspirada por filmes de Mack Sennett. O major Applegate tinha um assistente e provador de comida chamado Ali, mas esse personagem foi substituído por Aloysius Gogarty. O rascunho final do roteiro tinha várias cenas no meio do filme em que David e Susan declaram seu amor um pelo outro, que Hawks cortou durante a produção.


Nichols, que depois trabalharia em Stagecoach, foi instruído a escrever o filme para Hepburn, com quem havia trabalhado em Mary of Scotland, de John Ford (1936). Barbara Leaming alega que Ford teve um caso com Hepburn, e afirma que muitas das características de Susan e David foram baseadas no relacionamento entre Hepburn e Ford. Nichols esteve em contato com Ford durante a escrita do roteiro, e o filme incluiu membros da John Ford Stock Company como Ward Bond, Barry Fitzgerald, D'Arcy Corrigan e o produtor associado Cliff Reid. John Ford era amigo de Hawks e visitou o set. Os óculos redondos que Grant usa no filme são inspirados em Harold Lloyd e John Ford de propósito. 


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As filmagens estavam inicialmente programadas para começar em 1º de setembro de 1937 e terminar em 31 de outubro, mas foi adiado por vários motivos. A produção teve que esperar até meados de setembro para liberar os direitos por US $ 1.000. Em agosto, Hawks contratou os escritores de piadas Robert McGowan e Gertrude Purcell para reescrever o roteiro, e McGowan adicionou uma cena inspirada na história em quadrinhos Professor Dinglehoofer e seu cachorro, na qual um cachorro enterra um osso raro de dinossauro.


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Bringing Up Baby é a primeira obra cinematográfica de ficção a usar a palavra gay em um contexto homossexual. Em uma cena, o personagem de Cary Grant (sabidamente gay) está vestindo uma camisola feminina enfeitada; quando perguntado por que, ele responde exasperado "Porque eu fiquei gay de repente!", pulando no ar.


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Apesar Bringing Up Baby ter reputação de ser um flop, ele foi bem sucedido em algumas partes dos EUA. O filme estreou em 16 de fevereiro, 1938, o Teatro Golden Gate em San Francisco (onde foi um sucesso), e também foi bem sucedido em Los Angeles, Portland, Denver, Cincinnati e Washington. No entanto, foi uma decepção financeira no meio-oeste, assim como na maioria das outras cidades do país. Pouco depois da estreia do filme, Hepburn foi rotulada como "veneno de bilheteria" pelo Independent Theatre Owners of America e sua carreira não se recuperou até The Philadelphia Story. Veneno de bilheteria é o título dado na cultura popular a um anúncio de revista feito em 4 de maio de 1938 no Hollywood Reporter e em outros jornais de Hollywood por Harry Brandt, presidente do Independent Theatre Owners of America, que destacava seis atrizes conhecidas e um ator "cuja bilheteria é nula "apesar dos altos salários. Para mim, pura implicância e perseguição da mídia.


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Leituras do filme 


Segundo o crítico de cinema Robin Wood, no livro dedicado exclusivamente a Howard Hawks, a estrutura do filme é satisfatoriamente arrojada e simétrica, com inclinações para alegoria, construída sobre oposições. No centro está o professor, inteiramente dedicado à reconstrução do esqueleto de um dinossauro). De um lado está sua noiva, secretária, séria e que além de não transar com ele, recusa a lua-de-mel alegando que isso iria atrapalhar seu trabalho; do outro está Susan. 


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Para Robin Wood, o filme nos leva a ver a trama em termos freudianos como Superego e Id. A dedicação de David ao trabalho não é completa: em sua extrema distração, em sua incapacidade de enfrentar as situações na prática, sentimos forças internas trabalhando contra ela. notamos que ele deseja uma lua de mel, mesmo que sua futura noiva não queira. Hepburn explode em momentos em que está prestes a fechar um acordo que garantirá seu futuro; e cada vez que ela estilhaça em fragmentos a ordem superficial de sua vida. Depois que ela se materializa, ele fica completamente indefeso contra ela. 


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Para o autor, toda a caracterização de Susan favorece essa interpretação. Ela não é tão imoral quanto amoral: parece nunca sentir uma pontada de culpa, nunca reconhecendo a responsabilidade pelos desastres cômicos que precipita. A oposição das duas mulheres no padrão básico do filme é reforçada pela oposição igualmente clara de animais, vivos e mortos: o esqueleto do dinossauro, o cachorro e o leopardo, extensões, respectivamente do modo de vida de David e de Susan. Há uma progressão bastante sistemática no filme, do mundo do domínio do Superego ao do Id: começando em meio aos mais civilizados cenários - museu, campo de golfe, a casa da tia de Susan, daí para o jardim, daí para o bosque; e há um movimento correspondente da luz para a escuridão. 


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Por último, o leopardo semi-selvagem não passa de uma alegoria da própria Susan, seu lado selvagem, amoral e desastroso, que a trazem problemas mas a dão um incrível charme, já que diferente da maioria das mulheres ela não se policia para agradar aos homens ou a sociedade. Para a maioria, um louca, mas particularmente considero o personagem de Hepburn extremamente sedutor. 


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Para além do lado metafórico do subtexto do filme, a técnica de roteiro representa em si um estilo típico da Hollywood pré-code: o das comédias malucas ou screwball comedy. Os filmes definitivos do gênero costumam apresentar situações de farsa, uma combinação de pastelão com réplicas velozes e mostram a luta entre as classes econômicas. Eles também geralmente apresentam uma protagonista feminina autoconfiante e muitas vezes teimosa e um enredo envolvendo namoro e casamento ou novo casamento. Essas características podem ser vistas em It Happened One Night e My Man Godfrey (1936). O crítico de cinema Andrew Sarris definiu a comédia maluca como "uma comédia sexual sem sexo".


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No início, o casal parece incompatível e até hostil um ao outro, mas eventualmente supera suas diferenças de uma forma divertida ou divertida que leva ao amor. Muitas vezes, essa incompatibilidade ocorre quando o homem é de uma classe social mais baixa do que a mulher, como em Levada da Breca. A união romântica final geralmente é planejada pela mulher desde o início, e o homem aparentemente não se dá conta disso. 


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No filme, Susan diz a uma terceira pessoa: "Ele é o homem com quem vou me casar. Ele não sabe, mas eu sou". Essa intencionalidade não natural a maioria das tramas do cinema, nos leva questionar a natureza das interações sociais ocorridas ao ponto de pensar: "Desde quando ela teve intenções secundárias com o rapaz?". E aí lembramos que foi desde que ela roubou sua bola após uma boa tacada na partida de golf. Se refletirmos bem, ninguém toma tal atitude e a sustenta sem alguma intenção.


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Entretanto, a grande charada por trás do filme é a dualidade dos dois leopardos, um bom e um mal. Primeiro de tudo, o fato do leopardo ser do Brasil. Bom, não existem leopardos (Panthera pardus) no Brasil, o mais próximo sendo a onça (Panthera onca). Segundo, o fato de haver uma delas que é "má". 


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A ideia do selvagem enquanto mal, que se reflete na dualidade do Superego transformada em Id, refletem o questionamento moral em torno do filme: é Susan boa ou má por fazer tudo aquilo para seduzir o rapaz? Um bom sinal desse questionamento é quanto na delegacia, Susan confessa ser uma gangster procurada, e quando os policiais se distraem, ela foge sorrateiramente da prisão. Ficamos por muito tempo na dúvida se não é ela realmente uma "diva do crime", ótima alusão ao próprio Hawks que para sempre ficou marcado por dirigir Scarface


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Outra cena que escracha completamente o sentido do filme, é quando Susan leva o rapaz para uma "moita", onde depois de um acidente, eles encontram o leopardo e o cachorro "brincando de lutinha". Para bom entendedor, meia palavra basta.


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Interessante também a representação patética e assustadora da polícia. Não se deve provar que você não é bandido, mas sim que você é realmente você, algo de enlouquecer por tirar como assumido que não há como aquela trama não conter algum crime, ótima metáfora da moralidade e censura da época. 


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O filme impactou fortemente o público do Brasil, já que "levada da breca" se tornou uma expressão para taxar alguém, geralmente menina, de sapeca. Provavelmente pela referência ao nosso país na figura do leopardo, "selvagem e sedutor". A trama antropomórfica onde os animais representam pessoas, além de inspirar diversos filmes que utilizam animais, objetos ou situações como metáforas sexuais, demonstra uma simplicidade e genialidade ao ensejar mais do que mostrar, ao ponto da trama ser altamente erótica mas sem mostrar nada, no máximo um beijo. Esse jeito de orientar uma trama, de maneira sempre metafórica, torna o filme a prova de censura, já que a maldade está nos olhos de quem vê. Uma verdadeira aula de roteiro e storytelling. 


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Filme em domínio público:





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