Pular para o conteúdo principal

"Hondo" - Caminhos Ásperos (1953): Faroeste clássico aborda os conflitos dos indígenas com exército e como os Estados Unidos reage a miscigenação


 

Hondo é um filme de faroeste da Warnercolor de 1953, dirigido por John Farrow e estrelado por John Wayne e Geraldine Page. O livro que inspirou o filme se chama "The Gift of Cochise", uma novelização escrita por L'Amour e publicado em 1953. O elenco de apoio conta com Ward Bond, James Arness e Leo Gordon



Clique aqui para saber onde assistir 


O filme de tese sobre o casamento de indígena e as guerras tribais junto ao exército ou aos Texas Rangers, por exemplo, eram práticas dos homens brancos de extermínio indígena. Também temos que pensar que a ideia de Florestan Fernandes da "Função Social da Guerra na Sociedade Tupinambá" é uma revisão dos estudos puramente românticos ou pessimistas ao estilo dos estudos franceses, que debatem sobre o "bom ou mau selvagem" por assim dizer. 



Em uma das cenas, John Wayne ensina o filho da Angie a nadar (com Hondo jogando o menininho na água de uma vez, que cruel isso, podemos brincar), ou e essa cena virou um "meme" histórico por isso. A educação do "se vira" para aprender, muito engraçado mesmo a cena. 


Em um dos momentos do livro de L'Amour, um autor parecido com Thomas Fenimore Copper (O Último dos Moicanos), e que também lembra O Guarani, de José de Alencar; Cochise filosofa sobre a união dos dois povos e do surgimento de uma nova primavera. Mas a realidade é que era um estado de guerra constante e que também produzia leis contra casamentos inter raciais, como teve no Arizona, por exemplo. 


Nesse momento do livro, descobrimos as origens de Angie, nascida na rota de Santa Fé e casada pela primeira vez com Ed Lowe depois de seus pais falecerem quando ela tinha apenas 17 anos, que seu pai de é New York e sua mãe é uma americana de ancestrais franceses da Louisiana. O livro é bem mais romântico do que o filme, que tem cenas épicas de batalhas de tirar o fôlego dirigidas por John Ford que candango nenhum conseguirá igualar. 



O personagem de John Wayne é o Ches Lane no livro, e no filme o nome dele é "Hondo" como o título já diz. Esse personagem é com certeza um "tropo", como ele também é em parte indígena, ele representa toda a filosofia de Cochise (o último grande líder dos Apaches do livro) na figura de Hondo, que aparece do nada e passa a se relacionar com a Angie, que é um personagem mais forte no livro, com mais atitude, mas o filme foca nesse lado mais sensível da personagem.



O roteiro é de James Edward Grant, é baseado no conto na revista famosa Collier de 1952, o nome do conto era "The Gift of Cochise", de Louis L'Amour, na estória original a senhora tinha dois filhos, no filme, apenas um.   Outra diferença é que no livro Angie fala com todas as palavras que como uma boa homesteader (ou teimosa demais para seu próprio bem) não iria sair de onde morava, apesar de morar sozinha. Vittorio no livro se chama "Cochise" e a relação de respeito e conflito entre ele e Angie é maior. Ele respeita Angie pela sua força de levantar a arma, mas acredita que ela seria boa para as futuras gerações para a prole, uma "geração de guerreiros" na opinião do líder Cochise. 



História e bastidores do filme



As filmagens ultrapassaram o cronograma original e Farrow teve que deixar a produção porque foi obrigado a dirigir outro filme. As cenas finais do ataque Apache às carroças circuladas do Exército e dos colonos foram filmadas por John Ford, a quem Wayne pediu para terminar o filme; Ford não foi creditado por este trabalho. Esse filme tem cenas de luta dos índios contra o exército que são épicas demais. Dirigidas por John Ford que não foi creditado no filme. 






Pensando no argumento dos filmes de faroeste, os índios não querem ser vistos apenas como elementos da aceitação e do pacifismo, e que na realidade, a ideia de extermínio sumário era uma ideologia de acabar com a cultura indígena, envolvia acabar com todo o modo de vida, sequestrar as mulheres indígenas, acabar com a fauna disponível como a cultura dos búfalos (que foram praticamente extintos),  acabar com seus suprimentos e dar reservas ás vezes onde ninguém queria plantar ou viver, isso era ser indígena na América da Norte, os filmes de faroeste, alguns deles são bem racistas sim, mas muitos são muito, mas muito progressistas como o filme Shane (1953) (mesmo ano, ou mesmo Rastros de Ódio (1956)



Alguns filmes são teses puras e debates de ouro, e que já foi feito aqui no blog, esse filme de 1956 retrata a realidade de ás vezes ataque dos indígenas em terras desses homesteaders (assentados) (que ficavam entre os indígenas e o exército), e temos a realidade por exemplo do cowboy racista interpretado por John Wayne, o impiedoso Ethan Edwards, o melhor papel de sua carreira, aquele homem era  um cowboy racista. Vittorio é um personagem muito interessante. 



Hondo aqui é totalmente diferente, um típico personagem da história americana que se orgulha de seu lado miscigenado e que sabe da superioridade da cultura indígena e que também as relações não eram de pacifismo total ao estilo jantar de ação de graças, a realidade as tribos indígenas americanas passaram por um processo de praticamente genocídio pelo fim de seu modo de vida e imigrações forçadas por diversos motivos, o que levou a parte desses indígenas junto com os mexicanos em geral, por exemplo a criar linhas de ataque ao território americano para vingar a expansão ao oeste dos "desbravadores" e que veio junto a guerra dos Estados Unidos contra o México e a retirada de grande parte de seus territórios. 



Havia os roubos das mulheres indígenas, como mostrado em um dos spin offs de Yellowstone, então havia também o rapto acontecia dos dois lados. Pois se raptavasse todas as mulheres de uma tribo, quem seria a próxima geração? Por conta disso também acontecia e essas crianças cresciam e viraram os indígenas ao estilo dos que vimos em Rastros de Ódio, índios com olhos azuis, por exemplo, contradições que davam ainda mais raiva ao público racista ao estilo de Ethan Edward


Nesse filme, Caminhos Ásperes, vemos a procura de um heroi por um lugar, uma estabilidade, uma família e nisso ele encontra uma mulher de meia idade abandonada e que não era nada "padrão" por assim dizer. Ela até tenta dizer que não está sozinha, mas é pega na mentira. Ela parece não entender o ultimato dos índios que não querem que seu filho Johnny (Lee Aaker), que provou ter a coragem dos apaches precisaria ter um pai, por ele "os índios obrigam ela a se casar", no fim, os índios obrigam a se casar com John Wayne para a coroa de meia idade, já que ela estava sozinha.  



Eles deram o prazo de algumas luas para "seu homem voltar" e ela não precisar casar (mostrando que também havia formas de conversas antes dos raptos que eram feitos por ambos os lados), dando a opção de escolher os melhores homens e caçadores da tribo para demonstrar o costume. Aqui está a realidade a metáfora da miscigenação que aparece de maneira mais romântica no filme. 


John Wayne interpreta um homem que também é em parte indígena e toda vez que ele tenta "ser de direita", ajudar os brancos, ele se ferra pesado para demonstrar que ele estava errado em se "identificar como branco" por assim dizer, ou seja, até mesmo esse tom de debate cruzado esse filme suscita. 


Se a moça fosse racista, por exemplo, poderia não querer ele depois dele dizer que ele em parte indígena também e que viveu com os apaches e chegou a ter uma esposa indígena que lembrava por algum motivo a moça fisicamente completamente diferente dela. Nota para o ex marido inapto da senhora que carregava a foto (e que o Hondo mata em legítima defesa), e que dava como justificativa para não voltar para casa as guerras indígenas, ele acaba conhecendo o cara antes por conta do cavalo que ele levou do rancho da Angie. 



No fim, refletimos diversos elementos de tese, a miscigenação que mesmo oculta acontecia de ambos os lados (com valores e tradições diferentes, um grupo escondia em busca de ascensão social, outro mostrava como uma ideia de mito yankee de direita), e esse filme sabe também debater o fim do modo de vida semi nômade dos apaches e de suas tradições, a fala do John Wayne no fim é sobre isso "é o fim do modo de vidas dos apaches, uma pena, era um modo de vida muito bom" comentava ele após a morte do líder fazer eles pararem o ataque para escolher um novo.


A homesteader e proto democrata Angie Lowe (Geraldine Page) e seu filho de 8 anos, Johnny (Lee Aaker), são uma família que foi abandonada pelo pai, com a desculpa de que ele não poderia voltar para casa deles ficar em meio ao conflito indígena que se estendia durante um  bom tempo. Hondo (John Wayne) aparece um dia precisando de abrigo e conhece essa senhora que quando perguntada sobre o conflito indígena, dizia que eles nunca a incomodaram e que ela sempre deixava eles beberam água no rio perto da propriedade. 



Ela parece ser muito legal em partes, lembra aquela ideia de pioneiros honrados e utópicos ao estilo Little House On a Prairie (1974), mas o filme corrige bem esse tipo de arquétipo de faroeste romântico bobo (mais é muito mais que isso), mas faz isso com toda a elegância de ser muito romântico e faz isso por saber que todos os elementos. É como se o cinema de John Ford quisesse debater já as futuras tendências de série que seria de glamorização de uma vida de fazenda e faroeste, quando a realidade é que tinham conflitos de todas as partes o tempo todo.


Os apaches faziam parte da imaginação e da cultura popular, como os "renegados" da pátria americana que viviam de maneira semi nômade, além da maioria ser caçador, como mostrado no filme, também eram conhecidos coo "bronchos" na cultura popular no século XIX, e depois disso houve muita acusação de apropriação cultural dos brancos da cultura apache, ao estilo da questão do mito ianque (yankee, os americanos do meio oeste mais distante possível). 


Como os índios americanos tinham que aprender praticamente todos os serviços manuais igualmente como os homens brancos, tinham armas, cavalos e combatiam em guerras tribais no sudoeste e oeste americanos (terras onde havia o convívio e o conflito depois da guerra dos EUA com o México(1846-48). Durante o tempo, as adaptações na cultura pop foram de descrever os índios como selvagens mortais e perigosos e até mesmo portar os indígenas como heróis em alguns casos, como o exemplo desse filme com o Hondo. 


Um dia, Angie e seu filho pequeno estão fazendo tarefas domésticas quando um  forasteiro chamado Hondo Lane (John Wayne) chega, carregando seus alforjes e rifle, acompanhado por seu cachorro raivoso Sam. Ele manda a Cavalaria do Exército dos EUA embora, tem um encontro com índios e perde seu cavalo. Hondo se oferece para trabalhar um pouco para ganhar um cavalo e Angie concorda. O cachorro depois morre como um símbolo de que Hondo pararia de viajar.



Depois que Angie disse várias vezes que seu marido está simplesmente ausente cuidando do gado, Hondo a confronta com evidências de que ele deve ter partido há muito tempo e ter a abandonado, a julgar pelas condições do rancho e dos cavalos. Ele a incentiva a fazer as malas e voltar com ele para o forte do Exército, já que o tratado com os Apaches foi quebrado e eles estão planejando uma guerra; Angie acredita que sua amizade de longa data com os Apaches a manterá segura. Naquela noite, ela nota o nome de Hondo no estojo de seu rifle e se lembra de ter ouvido que ele matou três homens. Ela o ameaça com uma arma descarregada; ele carrega para ela.


Enquanto Hondo se prepara para partir, ele menciona que já viveu entre os Apaches e teve uma esposa Apache. Ele diz a Angie que ela o lembra de sua esposa e a beija antes de ir. Ele parte para o forte. Pouco depois, os Apaches chegam à fazenda, liderados pelos caciques Vittoro (Michael Pate) e Silva (Rodolfo Acosta). Quando Vittoro toca em Angie, Johnny carrega a arma de Hondo e atira em Silva. Embora erre, Vittoro fica impressionado com sua bravura e faz dele um irmão de sangue. Vittoro insiste que uma criança corajosa deve ter um pai e vai embora. Essa parte do filme é interessante, pois mostra como que o "erro" da mãe é que ela quer a vida do homesteader mas não quer substituir o marido que já a abandonou e que aparece no filme como um otário. 



Hondo retorna ao forte e vê Buffalo Baker (Ward Bond), um colega escoteiro. Ele relata ao major que a Tropa C foi exterminada pelos apaches e tem um encontro com um colono irritado porque a cavalaria não está protegendo melhor os colonos. Em um saloon, Hondo briga com o mesmo colono. Baker mais tarde diz a Hondo que o homem é "Ed Lowe" (Leo Gordon); que ele percebe ser o marido ausente de Angie. Enquanto isso, Vittoro, certo de que o marido de Angie está morto, dá-lhe um ultimato para que ela consiga um marido Apache na estação das chuvas.


Na manhã seguinte, Ed Lowe acusa Hondo de roubar seu cavalo, vendo a marca “EL”. Seus amigos defendem Hondo, que sai imediatamente para devolver o cavalo à fazenda. Chateado com a luta e o cavalo, Ed segue Hondo para acertá-lo. Enquanto acampado, Hondo é atacado por Apache, que também ataca Ed. Na confusão, Hondo salva a vida de Ed, mas quando ele vira as costas, Ed recorre a ele e Hondo o mata. Ele descobre que Ed estava segurando uma fotografia de Johnny, que ele tira. 


Na perseguição que se seguiu, os Apaches capturaram e torturaram Hondo para obter informações sobre os movimentos da cavalaria. Ao ver a foto de seu irmão de sangue, Vittoro decide submeter Hondo a uma luta mano-a-mano até a morte com Silva, cujo irmão Hondo matou. Hondo sai vitorioso, mas deixa Silva viver; os Apaches deixam Hondo no rancho, onde Angie mente sobre ele ser seu marido.



Hondo se prepara para ir, mas primeiro conta a Angie a verdade sobre a morte de seu marido. Ele também quer contar a Johnny, mas ela o convence a não fazê-lo, admitindo que não ama mais o marido. Ela diz que seria cruel contar ao menino a verdade sobre a morte de seu pai e que o segredo não os seguirá até a fazenda de Hondo na Califórnia. Hondo responde ao seu apelo emocional com uma palavra indiana que sela uma cerimônia Apache de busca de esposa, "Varlabania", que ele diz que significa "para sempre".



Algumas coisas fazem a gente refletir mais ainda sobre o filme, por exemplo, a ideia cíclica de viver e sobreviver no faroeste, a resistência indígena não ser fraca, mas também não necessariamente "má" como erroneamente interpretado em alguns faroestes sem uma visão histórica correta, ou romanceada ou demonizada, uma questão é válida falar também que em 1953 é um ano chave, marcando a virada conservadora da América e logo nesse ano, tem apenas os dois filmes de faroestes mais progressistas já feitos.


 Hondo e Shane são faroestes que buscam abordar questões minuciosas de debates de tese e revisam o que seria o faroeste através da perspectiva da terra, da propriedade e da formação distrital e como era a relação com os "bons cowboys" que sabiam que não era fácil matar e morrer no velho oeste, ao contrário do que alguns filmes vendem. Essa ideia real de vida, família, nomadismo e rotina eram o que fazia de um homem um cowboy ou um lançado (uma pessoa que vem e vai). O filme é sensível demais para notar essas peculiaridades, como o amor romântico, a integração americana e a convivência com os indígenas e a descrição de hábitos típicos da cultura apache. 

 

Comentários

Em Alta no Momento:

O Dólar Furado (1965): Faroeste italiano retrata o pós Guerra Civil para comparar com o contexto seguinte a Segunda Guerra Mundial

A Fantástica Fábrica de Chocolate (1971): Uma distopia capitalista que reflete como a sociedade industrial modifica as tradições culturais

Cemitério Maldito (Pet Sematary, 1989): Filme suavizou livro de Stephen King mas é a melhor adaptação da obra até hoje. Confira as diferenças do livro para o filme

Os Desajustados (The Misfits, 1961): Um faroeste com Marilyn Monroe e Clark Gable sobre imperfeição da obra do artista e o fim fantasmagórico da Era de Ouro do Cinema Americano



Curta nossa página: