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Westworld - "Que Será, Será" (4x08): Análise e interpretações da season finale e conclusão geral da série



Como consequência das ações de William, humanos e anfitriões estão se exterminando. Caleb, Frankie e Stubbs evitam a violência entre os humanos e param em uma farmácia para cuidar dos ferimentos de Frankie, mas Clementine aparece e mata Stubbs antes de ser dominada e morta por Caleb e Frankie. Charlotte é revivida por anfitriões e encontra instruções gravadas para ela por Bernard antes de sua morte. Ela recupera a unidade de controle original de Dolores, que contém uma simulação do mundo habitado por Christina, que revela que criou Teddy, Maya, e outros para se ajudar a ganhar sensibilidade. Charlotte então segue William até Hoover Dam e o impede de desativar o Sublime. Ela então envia a unidade de controle de Dolores para o Sublime antes de destruir a sua própria. Dolores acorda dentro do Sublime e decide tentar dar à vida outra chance de evitar a extinção, percebendo que nem humanos nem hospedeiros podem sobreviver no mundo real. Ela começa recriando o parque original de Westworld dentro do Sublime


Veja a análise do episódio anterior, "Metanoia" (4x07)


E aqui, veja análise do filme Westworld e dos outros episódios da quarta temporada



Crítica do episódio 


Eu começo dizendo: Uau, que final! Muitas coisas foram reveladas e estabelecidas de maneira definitiva para o universo da série. Para mim, foi um final fechado e que encerra definitivamente o universo da série. Vamos por partes na análise. 


Primeiro, é preciso reconhecer o caminho feito até aqui para entender o que foi esse final e seu significado com a história das primeiras temporadas da série (a continuidade narrativa). Começando pelo início, que monstra todos se matando, com direito a participação do ator que faz o Trevor em GTA 5, Steven Ogg. Muito impressionante não? Não para quem já vinha pegando desde o episódio 4 e 5, um certo clima de estímulo ao suicídio, o que aconteceu com todos os replicantes do mundo de Hale, mesmo comandando seu universo, eles optaram por sua própria destruição, mostrando que o universo de Hale era carregado por certo pacifismo forçado destruidor. Falo isso pois Dolores e Hale compartilhavam consciência na virada que a narrativa tomou na terceira temporada. 

 


O lance é que a série escolheu nessa temporada fazer seu formato uma metáfora de si mesma da forma de escritas das séries modernas, que não elaboram muito sua continuidade e rotina. Muitas pessoas começaram assistindo a temporada achando a nova vida dos personagens "maravilhosa" e que ela tinha salvado a perspectiva da série. Foi o que foi comentado pela maioria, mas o plot foi confirmado como suicídio coletivo, e até mesmo o namorado de Cristina/Dolores que volta, é apenas o exercício de sua vontade, porque, surpresa, ela é quem manda nessa mundo (pois fez sua pessoal revolução feminina). 


Bom, depois dessa season finale ficou claro para todos que o primeiro episódio abria para uma crítica que viria no fim da temporada, na parte que Hale diz que não poderia acabar assim e que insiste em "sua narrativa", William aponta que não teria "lado certo", e que seriam todos maus por natureza, discutindo filosoficamente sobre quem seria seu eu, uma réplica da réplica, mas ainda imune ao poder total de Hale. Por exemplo, a nova vida de Dolores como Christina. 




Muitos acharam que sua nova vida era "foda" e "empoderada", mas tudo que ela fazia era estar triste e vazia e dormir, e eventualmente, tentava ir em um "encontro", para ter a beleza da escolha cosmopolita, ala Sex Sex And the City. Mas alguns elementos estava lá como easter egg para percebermos o problema do plot. 


Primeiro, aquela carinha de nojo que ela fez para o mendigo no primeiro episódio da temporada. Só que também a estrutura do padrão latino mal e da amiga negra boazinha, que sempre estava lá quando ela acordava com café pronto, eram arquetípicas e horríveis. Mas, assim como a volta de Ted que foi considerada por alguns "fofa, todos esses plots elogiados elo fã clube da série, foram revelados como sendo uma construção mental da própria Christina, que continua sendo Dolores mesmo, e ela mesma viu que nada era real, apesar do que ela falava para si mesma. 



É revelado mais: de alguma maneira Dolores e Charlotte estavam "compartilhando a mesma mente". Como assim? As duas estavam tentando de uma maneira construir o mesmo mundo. Dolores, dando sentido a vida dos robôs, enquanto Charlotte manipulava toda a estrutura de maneira geral para construir o mundo que ela queria. 


O lance que talvez essa cena inicial queira trazer é que essa proposta é demasiado complicada para audiência geral. Isso fez, na verdade, com que os fãs e as pessoas que gostam de assistir séries em geral, se mataram em debates na internet sobre se a série estava boa ou não. Muitas pessoas não conseguem ver o absurdo mesmo que ele esteja perante seus olhos, pois aquilo de alguma maneira parece provocante ou estético. 



Isso foi exatamente o que aconteceu com Charlotte, algo esclarecido perfeitamente por Bernard. Ela queria que o mundo fosse feito segundo sua vontade, e a motivação da personagem originalmente nem era tão ruim. Porém, ao termos isso como resultado mostrou sendo ruim não só para a realidade da série, como para a estrutura geral da série. Se a HBO tinha dúvida em renovar ou cancelar a série, desde o episódio Generation Loss eles tiveram certeza: é preciso acabar com a série. 


Eles chamaram para ver o plot dos anos 20 como a coisa mais legal que rolaria na série. No episódio seguinte, o plot é cancelado. Além disso, ele foi inútil pelo fato que Maeve acabou morrendo mesmo e fim (ela não voltou). Sim, parece que agora, após William matar seu robô, depois de Bernard a ter restaurado, pareceu de vez. É engraçado que Charlotte, entretanto, foi restaurada por seus robôs mesmo com um tiro na cabeça, o que seria improvável. 


Sério, aqui se demonstrou para mim um certo desespero ou sindicalismo para manter a personagem que não se encaixava mais em nenhum plot. Tivemos que ter uma cena de William explicando, botando um óculos e explicando detalhe por detalhe do porque seu mundo era errado. Ou seja, o universo dito pelos fãs como perfeito, pois era melhor que a 3° temporada, se tornou um inferno para os personagens e, claro, imagino que também para os atores, já que os núcleos da série passaram a nunca mais conversar entre si, tornando a tarefa da continuidade difícil de manter na série. 


Foi emocionante também o final do plot de Caleb. Ele salvou a filha e decidiu se sacrificar, pois sabe que seu verdadeiro eu foi embora tempos em tempos anteriores, especificamente no episódio Fidelity. Aqui, junto com o plot de William, senti uma forte desistência do ator em relação as perspectivas da série. Obviamente ficou claro que os atores, principalmente aqueles que já morreram na trama, estão de saco cheio desejando o fim definitivo da série. Como foi falado pelo Aaron Paul em entrevistas recentes.


Em entrevista para o Hollywood Reporter, o ator do Caleb, Aaron Paul, falou que não quer assistir o resultado de seu trabalho e não vai mesmo assistir a 4° temporada de Westworld. A quarta temporada de Westworld foi ao ar simultaneamente ao retorno de Paul ao universo de Breaking Bad, interpretando novamente Jesse Pinkman na série Better Call Saul



Ele recebeu elogios por sua atuação como Caleb Nichols, especialmente em seu episódio de exibição "Fidelity" (que eu odiei), e que foi escrito por Jordan Goldberg e Alli Rock e dirigido por Andrew Seklir. Apesar dos elogios da crítica, Paul ainda não consegue ver sentido na luta de Caleb para transmitir uma mensagem para sua filha há muito perdida, Frankie (Aurora Perrineau).


"Há apenas certas coisas que eu não vou me permitir assistir, e isso (Westworld) foi apenas um empreendimento. Foi muito brutal para mim, então eu não queria revivê-lo", explica Paul.



Acredito que com a explicação final de Dolores, com tudo voltando a vestir as roupas do início da série (na época que era gênero faroeste clássico da primeira temporada), e aparentemente de volta ao parque, representou o final definitivo da série. Qualquer tentativa de dar um novo rumo a série, só faria ela voltar ao início ou deixar de ser o ela era. É um empasse, que só poderia ser resolvido definitivamente com a destruição do parque. Só que isso implica em não haver mais um Westworld, tornando a série uma metáfora de si e o final feliz impossível.


Só que, dentro das circunstâncias, o final até que foi feliz, o máximo possível, pois pelo menos houve um sentido final, principalmente dentro da proposta do que cada personagem pode representar para cada um dentro de uma perspectiva de identificação com o espectador. Assim, por exemplo, se você tinha mais uma perspectiva mais anarquista de querer que tudo na série fosse pelos ares, ia se identificar com William. Se for uma pessoa submissa, que aceita tudo passivamente, terá uma identificação com Dolores. 


Dolores talvez seja o personagem mais cruel e sinistros das séries modernas, pois ela é a protagonista, supostamente, e leva as pessoas a interpretarem que ela seria uma heroína. Tudo começou na primeira temporada quando Dolores começou a ter sua consciência estimulada por Bernard. Disso, ela se revoltou com sua situação de exploração e constante uso. 


Porém, disso ela se tornou uma sanguinária revolucionária, principalmente na segunda temporada. Seu plot representava obviamente uma crítica ao modelo da Revolução Mexicana, conhecido como "mexicanização" , onde ela usa as armas para se libertar da opressão. Disso ela passou para ser apenas um robô anárquico, que destrói tudo a sua frente. Agora, com esse final, vendo que Bernard trabalhava com Charlotte, não seria desde um início o seu despertar um ciclo anárquico, a transformação de algo automático e desimportante em uma suposta aventura de libertação que não levou a lugar nenhum. 



Politicamente, podemos questionar se esse final não quer desmotivar a perspectiva de qualquer revolução, principalmente ao capitalismo e ao sistema, uma vez que não haveria alternativa possível de governança. Apesar de a série representar bem a atual situação do espectro político mundial, uma vez que a ideologia do comunismo nunca foi tão perseguida e desacreditada como modelo político possível como hoje em dia, isso representa um fatalismo com qualquer governo progressista ou de esquerda no horizonte. 


Como o Estados Unidos é bipartidário, o final de Dolores voltando ao início prenuncia a possível volta a um governo republicano. Para a perspectiva da série, apesar de os democratas chegarem ao poder, não há alternativa possível na medida que o mundo atual é mesquinho, frio, com todos querendo se dar bem o tempo todo e não percebendo a violência simbólica que representa tal pacifismo. Em outras palavras, a série é correta em demonstrar os riscos da falta de utopias, perspectivas e horizontes políticos do mundo atual. Porém, não é totalmente realista pois não reflete nenhuma opção real como solução. É apenas "tudo e está mal, acorde e perceba, mas para fazer o que não sabemos". 


A volta ao início é impactante e real para o universo da própria série e das possibilidades possíveis de roteiro a partir daqui. Mas dentro de uma visão política, significa a nulidade total da terceira e da quarta temporada, pois elas não apresentam a solução para aquilo que a primeira chamou e prometeu promete. Simplesmente, a série se aproveitou de um contexto de questionamento para se inserir e se vender com um marketing "de esquerda". Era 2016, Trump acabava se ser eleito e Temer acaba de assumir após um impeachment de Dilma. Você pode não achar golpe, mas é difícil dizer que Temer resolveu algum problema real do Brasil. 


Naquela época, a série aproveitou para nos vender uma série que nos levava, diferente do filme original que ficava na perspectiva apenas dos visitantes, a simpatizar com a figura dos robôs que ficavam ali para agradar as pessoas. A série nos levou a nos simpatizar com a rebelião deles e torcer por uma emancipação, pois queríamos ver a solução para o nosso próprio contexto de maior conservadorismo, para no final entregar que todos os personagens eram "lumpemproletariado" e logo podiam e precisava ter um final ruim, pois sua revolução era falsa



No final, a série quer nos dizer que a solução, o sonho revolucionário, era outra prisão. Tudo bem, é uma mensagem possível, mas não deixa de tornar a séria uma forma de "bait", pois assim fomos chamados para uma ideia que nós não estávamos tendo, que foi inserida na nossa mente pela série, para a própria série então reafirmar como falsa. 


Foi um final legal, mas que não salva tudo. Uma temporada medíocre se seguiu até aqui, onde todos os plots e episódios eram uma furada, encheram linguiça, para enrolar até chegar o último episódio e resolver tudo. Não era mais fácil fazer um filme que explicasse tudo então? Um final até divertido, que se definitivo consegue dar um sentido definitivo a série, mas que só conseguiu agradar depois de as perspectivas (e audiência) estarem bem baixas. Segundo alguns do elenco, a série pode ser renovada, mas como a temporada chegou ao fim e a HBO não sinalizou nada ainda, acho bem difícil. Até porque se fosse para fazer isso, mostrar a volta ao início de Dolores não ia fazer sentido, parecendo realmente um final conclusivo. 


Sensacional? Não, mas pelo menos entreteve, algo que está raro nas séries atuais, principalmente aquelas que estão acabando neste ano. Há quem goste, né?! Mas como vejo muitos filmes e séries, acho que fico com o padrão elevado, não sendo qualquer coisa de momento que consiga me impressionar.



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