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Ring - O Chamado (1998): Tudo sobre o filme de terror japonês e como ele inspirou a popular adaptação americana


Duas alunas do ensino médio, Masami e Tomoko, falam sobre uma fita de vídeo que teria sido gravada em Izu e traz uma maldição que mata o espectador em uma semana. Tomoko revela que há uma semana ela, seu namorado Iwata e dois outros amigos assistiram a uma fita estranha e receberam um telefonema depois. Os dois ouvem o telefone tocar, mas, divertidamente, é apenas a mãe de Tomoko. Assim que Masami volta para cima, no entanto, Tomoko testemunha sua TV ligar sozinha, e logo depois disso, uma força invisível a mata. Enquanto isso, a história do vídeo está sendo investigada pela tia materna de Tomoko, a repórter de jornal, Reiko Asakawa. Adaptação do romance "Ring", escrito por Koji Suzuki e publicado em 1991, mas com várias coisas alteradas do livro para os filmes, tanto o japonês como o americano. 


 Ao retornar para sua cabine, Reiko assiste a fita por si mesma e descobre que a fita mostra uma série de imagens perturbadoras aparentemente não relacionadas, acompanhadas por um guincho metálico, com a imagem de um poço aberto sendo a cena final da fita. No final, ela vê um reflexo misterioso na TV e recebe um telefonema, mas apenas os sons estridentes da fita podem ser ouvidos. Levando a sério a ameaça de morte, Reiko sai com a fita e convoca seu ex-marido, o professor universitário Ryūji Takayama, para investigar sua origem. Na manhã seguinte, Reiko pede a Ryuji para tirar uma foto dela, e a foto de seu rosto sai distorcida como as de Tomoko e seus amigos. Ryuji assiste a fita apesar das preocupações de Reiko e diz a ela para fazer uma cópia para ele.


Enquanto estudavam a fita no dia seguinte, eles são interrompidos por Mai Tokano, uma das alunas de Ryuji. Portanto, para evitar que qualquer espectador seja ferido, os dois continuam revisando a fita no local de trabalho de Reiko. Enquanto revisam a fita na cabine de som, eles encontram uma mensagem escondida dentro dela de um "Homem de Toalha" murmurando a frase "Brinque em salmoura, duendes sejam teus". Ryuji revisa a informação e informa Reiko na manhã seguinte que a mensagem está em um dialeto . 


Enquanto revisam jornais antigos na biblioteca, eles encontram um artigo de jornal semelhante ao visto na fita. Enquanto Reiko está levando Yoichi para uma visita à casa de seu pai Koichi, Ryuji a liga para explicar que ele soube por meio de uma investigação mais aprofundada sobre Shizuko Yamamura; uma mulher local de Ōshima que é vista na fita. Em vida, ela foi uma vidente que previu com precisão a erupção do Monte Miahara, e ele revela planos de visitar Ōshima para continuar as pesquisas. Mais tarde naquela noite, Reiko mais tarde pega Yoichi assistindo a fita, alegando que o fantasma de Tomoko pediu para ele assistir.


Reiko e Ryuji navegam para Ōshima para aprender mais sobre a história de Shizuko Yamamura. No caminho, Ryuji explica que a atenção da mídia a partir das previsões de Shizuko atraiu PESo pesquisador Dr. Heihachiro Ikuma, que, além de fazer estudos sobre ela, teve um caso com Shizuko e teve um filho com ela. Pouco depois, uma série de relatórios caluniosos levaram Shizuko ao suicídio, e o Dr. Ikuma foi demitido por sua universidade. Naquela noite, os dois ficam em uma pousada administrada por Takashi, irmão de Shizuko. 


Na manhã seguinte, na costa da ilha, Ryuji revela a Takashi que ele sabe, por meio de suas habilidades de leitura de mentes, que o velho expôs Shizuko para a mídia, na esperança de ganhar dinheiro com ela. Em uma demonstração das habilidades psíquicas de Shizuko realizada por Ikuma, um jornalista que maldosamente a denunciou como uma fraude, incitando seus outros colegas a fazerem o mesmo, foi cineticamente morto pela filha de Shizuko, Sadako. Ryuji, que tem poderes psíquicos, vê a demonstração por PES, assim como Reiko; na visão, Sadako corre até Reiko e agarra seu pulso. Reiko desmaia, e quando Ryuji a acorda, ambos notam um hematoma escuro em forma de mão no pulso de Reiko.


Regressando a Oshima, envergonhada e desolada, Shizuko suicida-se atirando-se para dentro do vulcão local, deixando a filha orfã com a tia. O pai, Ikuma, acaba por ser internado num sanatório com tuberculose, desaparecendo tal como a mulher.


Sadako cresce e ingressa numa companhia de teatro, onde tenta singrar como atriz mas a sua inaptidão social acaba por segregá-la dos restantes colegas atores.


É durante esta juventude que a garota entra em contato com os poderes mentais que herdara da mãe, matando inadvertidamente quatro companheiros através de uma gravação da sua voz.


De novo em fuga, Sadako decide visitar o pai no sanatório onde convalesce. No livro, é aí que a jovem é violada por um jovem médico, Nagao Jotaro portador, da derradeira estirpe de varíola e é exposta como sendo hermafrodita, possuidora de ambos os sexos. Num acto de violência e vergonha, Nagao mata Sadako e atira o seu corpo para dentro de um poço adjacente ao sanatório. Por curiosidade, existiu uma famosa epidemia de varíola no Japão. A epidemia de varíola de 735-737 foi registada como tendo ocorrido por volta do mês de agosto de 735 na cidade de Dazaifu, Fukuoka, no norte de Kyushu, onde a infecção havia sido ostensivamente transmitida por um pescador japonês que havia contraído a doença após ser infectado. encalhado na península coreana. A doença se espalhou rapidamente pelo norte de Kyushu naquele ano e persistiu no seguinte. Em 736, muitos arrendatários de terra em Kyushu estavam morrendo ou abandonando as suas colheitas, levando a baixos rendimentos agrícolas e, finalmente, a fome.




Entretanto, no filme ela é morta pelo próprio pai, como metáfora do patriarcado japonês. Muitos anos mais tarde o sanatório é demolido e um novo empreendimento é construído no seu lugar, nomeadamente o resort turístico de Hakone onde se situa a cabana com a cassete VHS amaldiçoada.


Reiko e Ryuji deduzem que Sadako psiquicamente criou a fita para expressar sua fúria contra o mundo. Enquanto Ryuji procura um barco que os levará de bom grado de volta ao continente durante uma tempestade noturna, Reiko percebe que o telefone tocou apenas na cabana alugada em Izu. Graças a Takahi oferecer a Reiko e Ryuji uma viagem de barco, os dois retornam a Izu e descobrem um poço abaixo da dita cabine. Eles tentam encontrar o cadáver de Sadako na tentativa de apaziguar seu espírito, esvaziando o poço de água dentro dele, com os dois trocando de lugar quando Reiko começa a se cansar. Minutos antes de seu tempo acabar, Reiko descobre o cadáver de Sadako no fundo do poço, quando a polícia chega ao local.





História por trás do filme 


Após o sucesso moderado do romance Ring, escrito por Koji Suzuki e publicado em 1991, a editora Kadokawa Shoten decidiu fazer uma adaptação cinematográfica de Ring. Varias coisas foram alteradas dos livros para os filmes japonês e americano.


No livro a personagem principal é um homem chamado Kazuyuki Asakawa, jornalista. No filme é uma mulher chamada Reiko Asakawa, uma repórter de TV. Kazuyuki é casado e tem uma filha. Reiko é divorciada e tem um filho. No livro Ryūji é o melhor amigo de Kazuyuki. No filme é o ex-marido de Reiko. No livro a morte das vítimas é provocada por um terror interno que as leva a um pavor tal que os seus corações param espontaneamente. No filme é a figura física de Sadako que aparece para matar os infelizes tocados pela maldição. No livro nunca é referida uma aparição material de Sadako. Ryūji no filme possui uma percepção extra-sensorial. No livro não. Na versão literária o verdadeiro vilão é o vírus da varíola misturado com o espírito de Sadako. No filme é Sadako em si a verdadeira antagonista. Sadako é morta pelo pai no filme. No livro é morta pelo médico que a viola, Nagao. Na cena inicial do filme estão 2 garotas presentes na casa onde ocorre a primeira das mortes. No livro, a sobrinha de Asakawa morre sozinha. O poço do livro é mais descrito como um amontoado de pedras, e não uma estrutura circular. No livro Sadako morre ao cair no poço. No filme sabe-se que sobreviveu durante 33 dias na escuridão.


O roteirista Hiroshi Takahashi e o diretor Hideo Nakata colaboraram para trabalhar no roteiro depois de ler o romance de Suzuki e assistir ao filme feito para a TV da Fuji Television de 1995, dirigido por Chisui Takigawa. A versão transmitida do filme de 1995 foi reeditada e lançada em home vídeo com um novo título, Ring: Kanzenban Ring: The Complete Edition". 


No roteiro do filme, Takashi e Nakata mudaram o gênero do protagonista (de masculino para feminino), nome (de Kazuyuki Asakawa para Reiko Asakawa), estado civil (de casado para divorciado) e gênero e nome da criança (de filha Yoko para filho Yoichi).


Com orçamento de US $ 1,2 milhão, toda a produção durou nove meses e uma semana. Segundo o diretor Nakata, o roteiro e o processo de pré-produção duraram três ou quatro meses, rodando cinco semanas e a pós-produção quatro meses. 




Os efeitos especiais na fita de vídeo e algumas partes do filme foram filmados em um filme de 35 mm que foi passado para um laboratório no qual um computador adicionou um efeito "granulado". Efeitos visuais estendidos foram usados ​​na parte em que o fantasma de Sadako Yamamura sai da televisão. Primeiro, eles atiraram na atriz de kabuki Rie Inoo andando para trás em um movimento espasmódico e exagerado. Eles então exibiram o filme ao contrário para retratar uma caminhada de aparência não natural para Sadako.



Leitura do filme 


Um tema é recorrente ao longo de todo o filme e abordado de varias maneiras diferentes: a repressão sexual. Desde as primeiras cenas fica claro que o filme quer abordar a permanência da tradição e de costumes conservadores convivendo com a modernidade. Primeiro com a situação da fita.


Como em Candyman (1992), aqui há uma investigação em torno de uma lenda popular, misturado com o filme espanhol Morte ao Vivo (1996), que falava sobre uma fita secreta e uma pesquisa também. Mas em Ring, logo de cara o filme entrega, com a cena dos mais jovens e todo o contexto juvenil das primeiras mortes, que é obviamente sobre sexualidade o subtexto do filme. As meninas pareciam estar em um certo "clima", mas ao tocar (ring) o telefone e ela atender e falar com a mãe, um certo moralismo tomou conta de sua mente, onde Sadako parece só uma metáfora. 


Uma coisa a se atentar é que Reiko é jornalista. Como jornalista, pesquisar lendas populares com a desculpa de assassinatos misteriosos é problemático. Se o jornalista se orienta pela busca da verdade e do fato, como pode racionalizar aquilo que se furta de fatualidade? Aqui temos uma tendência complicada gerada pelo neoliberalismo, que é se pautar mais pelos não fatos do que pelos fatos. De certa forma, desmentir boatos ou apresenta-los para o gosto popular se tornou uma tendência. Ao entrar em tal universo, Reiko de certa forma esquece que a objetividade é necessária para o jornalista ter uma noção aonde ele quer chegar, qual assunto que ele entende para abordar ou não, ou até mesmo quando as fontes podem estar o enganando. Por outro lado, se pensarmos que o assassinato é o que motiva Reiko, devemos lembrar que jornalistas não são policiais e logo não devem eles descobrir quem é o assassino, apenas reportar os fatos. O que ela está fazendo não tem outro nome: é sensacionalismo.




Assim a primeira coisa clara no filme é a crítica a mídia e ao jornalismo por apenas reforçarem o conservadorismo padrão da sociedade japonesa. Essa visão do filme é interessante, pois desvia daquela apresentada de maneira hegemônica pelos produtos culturais japoneses: um país de integração e nacionalista. Tanto que em certo momento do filme é comentado que os jornalistas não melhoram muito nas últimas décadas, ensejando que os mitos populares são formas de dogmas retransmitidos pela mídia de massa. 


A fita é uma obvia metáfora de pornografia, vídeos snuff e outros conteúdos mais... "fortes" que se democratizaram a partir dos anos 80 com o vídeo cassete, e se popularizaram mais nos anos 90, pela acessibilidade e compartilhamento facilitados pela internet. Tanto que Reiko encontra a fita em uma loja junto de fitas pornôs em uma estante. Ela volta para sua cabine e assiste a fita de maneira sedenta, como quem se envolve com aquilo que está pesquisando. Depois de assistir as "imagens perturbadoras", ela fica com seu rosto atônito e vê Sadako junto de seu próprio reflexo na televisão. É sobre descobrir que se é mais "tarada" e má do que se sabia? Além disso, ela chama seu ex-marido, com quem tem um filho chamado Yoichi e um relacionamento mal resolvido, para ver com ela. Os dois se comportam nessa sequência como se fossem transar e quisessem esconder isso de todos. Mas então eles "assistem a fita". 


Vale destacar que Ryuji é um professor universitário, ou seja, Reiko e ele são do ciclo das faculdades, mostrando que eles possuem certa distinção e parecem ser pessoas da elite. Isso explicaria tanta repressão em torno do relacionamento dos dois e do suposto hábito de consumir pornografia: não combinaria com o perfil de pessoas intelectualizadas e ocidentalizadas das melhores famílias japonesas. É ensejado também que Ryuji trocou Reiko por uma aluna ao qual chega de repente em sua casa, algo similar a Candyman. Já o elemento de Ryuji ver o passado das pessoas através do simples toque, foi retirado do filme Na Hora da Zona Morta (1983), de Cronenberg. 


É mostrado com esse recurso, que o velho expôs Shizuko para a mídia, na esperança de ganhar dinheiro com ela. Na cena onde vemos uma mulher prevendo coisas, um homem atestando estar correto e gerando o ataque dos jornalistas, parece uma metáfora de uma mania de checagem da ciência que apenas acaba por reforçar estereótipos e uma visão conservadora e tradicional, expressado pelo vestido da mulher. Os jornalistas da época, que parece ser os anos 50, contestam e um deles morre: o jornalismo contestador morreu, ele passou a apenas reforçar locais, instituições e pessoas de poder. Há obviamente uma paridade histórica dessa representação com a Segunda Guerra Mundial, a bomba atômica e os demais efeitos sofridos pelo Japão por ter lutado ao lado dos nazistas naquela época, onde a imprensa e esses ideias de nacionalismo foram substituídos por uma visão hierarquizada e subalterna aos Estados Unidos. 


Então, temos a cena do casal viajando no barco e a cabine sacudindo perante a câmera devido as ondas do mar, cena muito bem feita por sinal. O fato de o casal parecer mais junto e romântico ao estar separado é algo a se questionar. O hábito da investigação, dele como professor pesquisador e dela como jornalista, é o que une os dois, uma ótima metáfora aqui para os fãs de histórias de mistério e investigação. Analisado por esse ângulo, o filme pode ser considerado até mesmo romântico para alguns casais que gostam do gênero mistério (excluindo seu final). Há obviamente uma repressão sexual e ideológica na sociedade e que ambos tentam esconder seus gostos e hábitos por isso. Mas então na investigação, ambos se aproximam e essa cena do barco é uma ótima metáfora da relação dos dois.


Este final é bem construído em questionar o critérios e métodos científicos, já que foi um médico que a matou e a construção virou um local de diversão, uma boa metáfora. Porém, além disso, há a questão do espelhamento entre as personagens femininas, o marido e o poço. Já nas últimas horas e final do filme, Reiko se cansa de tanto tirar água. Se ex-marido então sai do poço e dá um tapa na cara dela e a lembra que devem fazer aquilo para salvar seu filho. Ele decide então que ela deve descer pelo poço, algo que ela não quer fazer. 


Ela desce, mas ao olhar um momento para cima, vê a imagem do assassino de Sadako em seu ex-marido. Um medo nos recorre: será que ele não poderia também apenas fechar a tampa do poço? E ao ela encontrar o corpo de Sadako e dar um abraço nela, é como se ambas fossem parecidas, a mesma pessoa quase, sendo que o poço de Reiko seria apenas psicológico: um local aonde ela foi colocada pelo costume e pela sociedade mesmo sem querer estar. 


Ryuji não fecha o poço e ajuda ela a sair, mas o final trágico do filme, enseja que algo não ficou bem resolvido. Foi tudo muito perturbador e violento para apenas voltar a rotina tradicional. Ryuji consegue, e volta simplesmente a estudar suas fórmulas, mas para Reiko a estrutura é conservadora demais para apenas esquecer. 


Colette Balmain, no livro Introduction to Japanese Horror Film, identifica em Sadako, o arquétipo yūrei vingativo do terror japonês convencional. Yūrei (幽霊?) são figuras do folclore japonês, análogas às lendas ocidentais de fantasmas. O nome é composto por dois kanjis, 幽, yū, significando “fraco” ou “fraca” e 霊, rei, que significa “alma” ou “espírito”. Nomes alternativos incluem 霊 亡 Borei, significando arruinadas ou espírito partido, 死 霊 Shiryo, significado “espírito morto”, ou o mais abrangente 妖怪 Yokai ou お化け Obake. Balmain argumenta como essa figura tradicional japonesa se expressa por meio de um videoteipe que “encarna ansiedades contemporâneas, na medida em que é a tecnologia por meio da qual o passado reprimido se reafirma”. 




Ruth Goldberg argumenta que o filme expressa "ambivalência sobre a maternidade". Ela lê Reiko como uma mãe que - devido ao novo potencial para a independência das mulheres - negligencia seu papel "natural" de dona de casa martirizada em busca de uma identidade independente, subsequentemente negligenciando seu filho. Goldberg identifica um efeito de duplicação pelo qual os conflitos inconscientes da família de Reiko são expressos por meio do sobrenatural na outra família sob investigação de Reiko.


Em termos gerais, Ringu, Ring ou O Chamado, é um filme que questiona qual a função e impacto da nova tecnologia, da noção de atualização constante em "tempo real" e do mito positivista do progresso constante, para e perante uma cultura dogmática e milenar, monárquica e conservadora como do Japão (mas também do Brasil)? A liberdade vendida pelo capitalismo é uma verdade ou apenas um discurso para não se notar o quanto se está preso ao seu próprio destino e oportunidades? Dentro dessa modernidade, qual a função da mulher?


Deve ser uma boa menina tradicional e inocente dependente dos homens, ou se deve ser independente e abandonar a família e o filho e o conservadorismo em busca de sua própria independência? Ela poderia escolher ser lésbica, por exemplo? Também para o homem. Ainda encaixa essa figura do cientista, pai de família e que se envolve com alunas ou ele poderia de fato ouvir e trocar com sua esposa? O que é se moderno ou progressista em uma sociedade ultrapassada e antiquada culturalmente pelos resquícios do feudalismo? 


Essas reflexões de locais sociológicos, perante papeis sociais, profissão, ciência e relações pessoais são o que mais faz o filme brilhar, não tendo quase nada haver com a adaptação americana, que é horrível se comparado ao original. O roteiro e a forma como aborda esses papeis gerais que temos na sociedade mas não questionamos, é o que mais cativa do filme e te coloca no local dos personagens, sendo por isso uma proposta muito mais psicológica. A direção e a escolha dos cenários e locações para filmar também deram todo um charme de filme independente. Ao invés do Japão tecnológico e urbano que sempre vemos nos filmes, o interior das casas, o cotidiano e os costumes são a forma como filme conta sua história, utilizando dos locais e objetos mais simples para construir essa sensação de vazio e investigação. Por vários momentos, o filme enseja aquilo que quer dizer para o público através desse uso aleatório e constante dos objetos e recursos disponíveis, como a foto do rosto distorcido, e esses recursos simples que atrelam o roteiro e a direção constroem uma narrativa muito cativante. 


Há um forte questionamento a televisão, ao jornalismo e também de como o cinema é feito e um certo tipo de cultura cinéfila fanática. Os sentimentos e desejos que busca induzir nas pessoas, como dirigir em alta velocidade, fumar ou beber demais, ensejando que esses levam a destruição; mas também a falta de liberdade das narrativas padrões do cinema, que nos recolocam sempre em arquétipos e papeis forçados em suas tramas. Não seria a cena da Sadako saindo da televisão todo aquele ódio e sensacionalismo vindo de volta para você?


A fotografia do filme é bem interessante, construindo o tom necessário entre a suavidade comum aos filmes dos anos 90, com o "sujo" e o antigo da lenda e do terror. A escolha dos planos e ângulos, das cores e dos planos é feita com perfeição, de maneira que o filme passa a sensação de "hiper-realismo", principalmente nas cenas do poço e que Sadako sai da televisão, explorando a visão do telespectador ao ponto de provocá-lo e assustá-lo sem nenhum recurso barato, como "jump-scare". Por último, a atuação do filme é muito boa. Além da atriz Nanako Matsushima, que interpreta muito bem a desesperada protagonista do filme, temos, ainda bem jovem, Hiroyuki Sanada, ator que se tornou famoso no circuito americano, fazendo participação até mesmo na série americana Westworld com o mundo Shogun. A caracterização e as aparições de Sadako são milimétricas. Não é atoa que a imagem da menina de cabelos na cara e vestido branco entrou para o imaginário popular e do cinema em geral.


Se você não gosta muito de filmes de terror por serem gráficos ou violentos, ou se gosta de filmes de terror mais psicológicos, esse é o filme para você


Disponível no Prime Video.






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