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Golem, Como Ele Veio ao Mundo (1920): Originário de lendas antigas, entenda como criatura foi usada como arma contra o antissemitismo


O Golem, ou do título em inglês The Golem: How He Came Into the World (O Golem: Como ele veio ao mundo) de 1920 do gênero de terror e mudo, baseada na novela de Gustav Meyrink de 1915. Filme dos diretores Paul Wegener e Carl Boese foi a terceira adaptação do clássico, inspirada nas lendas da cabala judaica. Paul Wegener já havia feito um filme do Golem em 1915, porém essa versão foi perdida anteriormente, o filme feito em 1920 foi para ser uma forma de prequel do Golem original. O elenco contava com Albert Steinrück como Rabbi Loew, o próprio diretor do filme Paul Wegener como o Golem,  Lyda Salmonova como  Miriam,  Ernst Deutsch como assistente de Loew Loew, Lothar Müthel como o cavalheiro, e Florian Otto Gebühr como o Imperador de Roma. 

Golem está no Telecine Play e o no Youtube em link no final do artigo


Um clássico do expressionismo Alemão, que inovou por tratar do tema da ancestralidade judaica espiritual como forma de defesa ao clima de ascensão do antissemitismo. Enredo: No meio de um gueto judeu na Idade Média  em Praga, o filme começa com o Rabino Rabbi Loew, cabeça da comunidade judaica, Loew prevê o desastre para seu povo e informa aos mais velhos da comunidade. No dia seguinte, o Imperador de Roma assina um decreto declarando que os judeus deixem a cidade. Loew enquanto isso começa a aconselhar a criar uma forma de defender os judeus.   



Loew fala com Florian para lembrá-lo que ele previu desastres no horóscopo do Imperador e pediu uma audiência com ele. Depois de conhecer e flertar com Miriam, filha do Rabino Loew, Florian que ele o responsável por levar o decreto de banimento na cidade, se apaixona por Miriam, uma moça judaica do bairro. Loew passa a criar o Gomem, uma grande criatura feita de argila que ele trouxe a vida para defender seu povo. 


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Depois que Florian retorna a pedido do Imperador para Loew participar do Rose Festival no palácio. Ele tem um momento romântico com Miriam enquanto Loew revela para seu assistente que ele secretamente criou o Golem e pede para ele o animá-lo através do mecanismo criado, no caso do Golem ficar muito descontrolado, apenas podendo desligá-lo dessa forma. Utilizando o processo mágico, Loew e seu assistente proclamam o espírito de Astaroth nos textos clássicos. 

 

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Loew colocou uma forma de desligar a criatura, com um amuleto no meio do peito. Quando o Golem acorda vira servo de Loew que busca utilizar dele para assustar o Imperador para fazê-los temer os judeus para acabar com a perseguição. Quando Loew é chamada ao palácio, ele traz o Golem com ele para impressionar os participantes da audiência com o Imperador. A palavra escrita no peito e o amuleto fazem a criatura acordar. Enquanto isso Florian foge para encontrar com Miriam, que tem a casa protegida pelo assistente de Loew. 


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Na corte da Europa, todos estão chocadas e intrigados pela chegada do Golem. Impressionado, o Imperador pede para procurar mais fenômenos sobrenaturais ainda.  Loew projeta uma visão da história dos judeus, instruindo para os presentes não rirem ou falarem nada. 


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Quando chega no palácio a figura do "wandering jew", (Ahasuerus), ou seja do 'judeu andarilho', todos riem do arquétipo feito do judeu na visão da maioria. Mas o que ninguém repara é que o palácio da corte começa a estremecer ao mesmo tempo em que eles estevam ridicularizando os judeus. Com a ajuda de golem, ele salva a corte, em retribuição, o Imperador perdoa os judeus e permite que eles fiquem. Loew e Golem voltam para o bairro judeu e espalham a notícia que seu povo estaria salvo. Retornando para sua casam ele começa a notar o comportamento instável do Golem. 




Depois de remover o amuleto, ele lê a ordem astrológica dos movimentos que causarão a possessão do Golem pelo espírito de Astaroth e que ele vai atacar seu criador. Loew é chamado por seu assistente para comemorar junto na rua. Enquanto a comunidade se reúne, o assistente vai convidar Miriam, e a encontra com Florian em sua cama, devastado, ele reanima o golem e ordena que Florian seja expulso do prédio, mas o golem, agora sob influência de Astaroth, acaba matando Florian o jogando do telhado do prédio e o matando dessa forma. Horrorizados, Miriam e o assistente fogem e o golem coloca fogo na casa e Miriam fica inconsciente com isso. 


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Com a chegada apressada do assistente de Loew na sinagoga alerta aos judeus para esperar por um desastre. Depois da casa de Loew pegar fogo, Golem e Miriam desapareceram. Desesperados, a comunidade implora para Loew salvar eles da fúria de Golem. Loew faz um feitiço para remover Astaroth do Golem. Abruptamente, o Golem que está vagando pelo bairro causando destruição, deixa Miriam que tinha sido arrastada pelo cabelo. 


Depois o Golem vê um grupo de crianças brincando, todas elas fugiram menos uma menina, que por curiosidade remove o amuleto do Golem, deixando-o inconsciente na hora. Loew acha Miriam que acorda pouco tempo depois disso. Reunidos felizmente depois disso. Depois de Loew ir embora, o assistente promete para Miriam que ele nunca contará para ninguém sobre seu caso com Florian, e pede perdão pelo que fez. Os judeus se reúnem no portão e encontram golem morto.  Rezando e carregando o Golem para volta do bairro judeu, uma estrela de Davi aparece no fim do filme na tela. 




Crítica do filme: 


Com fotografia marcante de Karl Freund, o nível de profissionalismo do filme em termos estéticos é alto. Depois de muita polêmica desde 1915 para contar a história do monstro judeu, o filme saiu em 1920 baseada em uma lenda que escutou em Praga enquanto filmava The Student of Prague (O Estudante de Praga, 1913). 


O arquiteto Hans Poelzig que criou o filme para soar como um gueto judaico da Idade Média. A recepção do filme foi boa, vendendo todos os ingresso na premiere de Berlim, dia 29 de outubro de 1920. Foi  o filme que mais ficou em cartaz naquele ano por 16 semanas. O que gerou um 'culto pelo golem" nos Estados Unidos, ganhando status de filme cult. Esse filme dos anos 1920 é a única versão viva depois da Segunda Guerra. Nos anos 2000, passou por uma restauração na Alemanha em 1977. A segunda em 2000. 


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A segunda restauração foi feita pela Cinemateca del Comune di Bologna no laboratories of L'Immagine, sendo liberada em dvd para o Reino Unido, França, Espanha, e Estados Unidos.  Uma terceira restauração foi conduzida pelo Fundação Friedridh Wilhelm Murnau em 2017. A trilha-sonora original foi perdida e redescoberta em 2018, sendo reconstruída e feita em formato de orquestra em Weimar, em Setembro de 2020. A crítica sendo positiva para tal avento. 


https://ogambiarracultural.blogspot.com/2021/07/nosferatu-murnau-bram-stoker-censura-proibicao-primeiro-filme-de-vampiro-da-historia-e-classico-do-expressionismo-alemao.html


Baseada na famosa lenda do folclore judaico do Golem, o debate que o monstro simboliza são os paradigmas entre a formação humana e a nação e a busca pelos elementos da natureza que criam forma de sensibilidade típica do  gótico e do expressionismo alemão. Naquela época a Alemanha vivia o caos do contexto pós Primeira Guerra, de grande inflação, flagelo social, e claro, aumento do clima de xenofobia e perseguição étnica. 


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O filme sobre o golem é uma clara metáfora desse entendimento histórico do papel das lendas na forma de explicar através da oralidade as tradições uma forma de defesa do povo judeu em contexto de perseguição. O caso Dreyfus, de 1906, por exemplo, sendo um exemplo anterior ao nazismo de perseguição clara em torno da questão racial. 


A forma de história para os judeus segue uma forma própria, linear e e narrativa, com uma visão teleológica do mundo, do conselho, do contorno da crise. No livro "As raízes clássicas da historiografia moderna, Arnaldo Momigliano define as três formas de historiografia mais comuns nas áreas de humanas. 


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Uma delas sendo a forma de historiografia judaica Os judeus possuem uma relação íntima com a cultura grega do helenismo, explicada a ligação por Momigliano, o autor identifica na crença em hábitos de leitura próprios, como a prática da Torah que fez os judeus perderem interesse em uma História universal e genérica em um período pós bíblico. As raízes da historiografia judaica bebem  em muito da historiografia grega por conta da difusão do helenismo entre judeus ocorrida na antiguidade.  Para Momigliano na história, os judeus perderam o interesse na pesquisa histórica, mesmo havendo registros específicos escritos em hebreu e aramaico, ou presentes no primeiro livro de Macabeus.

 

A característica de novela é muito comum no tipo de narrativa judaica e grega também. Enquanto a historiografia cristã era fascinada por um apocalipse x e y, a historiografia judaica se preocupa com o futuro em forma de fórmulas de vivência, como uma forma de "lição de moral" e do futuro, que utiliza muitas vezes de valores biográficos ao fim de cada conto que remete aos valores filosóficos do judaísmo, como também é visto em alguns livros do velho testamento da bíblia. Livros da bíblia como Estras, Esther, Neemias, demonstram o valor histórico narrativo dessa história linear judaica, contada como uma forma de "evolução" de um povo, no sentido de passado, presente e futuro. 


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O retorno as raízes e a tradição explica o fascínio pelo conto que explica de certa maneira a história das relações entre judeus e não judeus na Idade Média. O expressionismo alemão era a forma de estética que envolvia uma marca de um país que vivia uma grande crise desde o fim da Primeira Guerra. O filme do golem feito pelo mesmo diretor já tinha sido feito em 1915, mas foi perdido. 


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A animalização do corpo com argila é uma forma de demonstra a origem da lenda do folclore judaico, que simboliza, como na metáfora de Adão na bíblia, por exemplo, o início da criação do mundo. O que simboliza uma paridade das narrativas da bíblia judaica, o Talmud, ou em comum com a própria bíblia cristã. O golem foi uma figura do cenário literário judeu, achada na Tamud e na Midrash, sendo um texto da Idade Média. Já no século XVIII a lenda se consolidou depois de muito aparecer em textos como o Tamud e o Midrash, passando pela literatura cabalística. No Egito Antigo, havia bonecos ,pequenas estátuas mágicas, geralmente de argila que eram colocadas ao lado dos mortos, e eram como oráculos de ligação do mundo dos vivos com o mundo dos mortos. 


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Essas bonecas "ushebti" ganhavam corpo graças aos escritos mágicos em seus corpos, tais como na lenda judaica. No tamud da Babilônica acha-se a tradução do golem como "massa sem forma". A ideia da criação original através da palavra, como uma forma de verdade em si, um "abracadabra".


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Filme em domínio público:





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