Ele Vivem (1988): Imagine se a mídia, o marketing e o capitalismo fossem controlados por aliens que buscam roubar recursos naturais da terra
John Nada é um homem desempregado que anda pelas ruas da cidade procurando algo para fazer. Um dia, ele encontra um óculos de sol e, por meio deles, consegue enxergar a face verdadeira das pessoas.
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Antes de entrar propriamente no filme preciso falar brevemente para aqueles que acompanham o site, explicando o motivo de ter dado uma desacelerada no ritmo ds textos. Tem sido muito difícil continuar escrevendo. Não exatamente por possuir muitas obrigações pessoais que me afastam de escrever, mas principalmente por desânimo.
O blog parece que não cresce. Até o view que já se conquistou, existindo textos no site com 4 mil visualizações, não voltam. Clicam dão uma lida e não voltam nunca mais a não ser que algum outro texto passe por sua timeline, o que é quase impossível no algoritmo atual das redes. No YouTube, ainda existe um feed da plataforma que você pode eventualmente ser sugerido, uma vez que a plataforma sempre vai ofertar no seu feedback coisas que você gosta. Agora, já repararam que o blogger não tem feed? Um página principal que você possa ver os principais novos artigos de blogs seria um sonho, mas até lá só o Facebook cumpre essa função e muito mal pois eles não querem que você clique em links que fazem você sair da plataforma deles (blogspot pertence ao Google).
A sensação que está ficando é que não importa se está a direita ou à esquerda, o Brasil está em um surto anti leitura. Contraditoriamente, apesar de defender o progresso e a educação, existe uma óbvia vontade de manter as pessoas felizes e logo pensando menos. As pessoas só são estimuladas a estudar e trabalhar em sentido meritocrático: para ganhar dinheiro e ter mais posses. A ideia de crescimento pessoal e de criar um mundo melhor para todos vai ficando para trás.
Ou seja, o que quero dizer é que se o cenário atual onde dependemos das plataformas para divulgar ideias já é ruim, a frivolidade da maioria das pessoas piora o cenário. Para escrever de maneira livre, sobres os temas que se quer, você precisa das plataformas, pois é algo que não é possibilitado pelos atuais fomentos de ciência e pesquisa públicos do Brasil. Nesse cenário, só existem dois locais para seus textos serem lidos: o Facebook ou o Google Notícias. E como competir com toneladas de memes, reels, shorts, trends e etc. A atenção está completamente dispersa em alto consumo de conteúdo aleatório. Quem vai no meio disso parar para ler um artigo? Quando acessam uma matéria, principalmente no Google Notícias, obviamente a fofoca do momento sobre os famosos ou uma polêmica da política, sempre chamará mais atenção, até mesmo pela sua ampla e frequente cobertura midiática. Então, para aqueles que gostam do blog e querem que ele continue, por favor continuem clicando e compartilhando.
E por incrível que pareça tudo isso tem muito haver com o filme que escolhi para analisar. Eles Vivem tem uma premissa muito básica, que lembra a ideia de simulação do filósofo Baudrillard: um cara médio e comum um dia encontra um óculos que permite ver a verdade escondida por trás das coisas. Ele coloca o óculos no meio da cidade e ao olhar para as propagandas e outdoor da cidade descobre a sociedade está sendo controlada por aliens, e toda a meritocracia, marketing e consumo são uma forma de manter os humanos mais controlados e não perceberem que estão sendo usados e controlados. Premissa que inspirou também o jogo Saints Row 4.
Começando do começo, o protagonista é um morador de rua, que vem para Los Angeles, Califórnia, em busca de um emprego, onde ele vê um pregador alertando que "eles" estão recrutaram os ricos e poderosos para controlar a humanidade. Ele encontra emprego em um canteiro de obras e faz amizade com seu colega de trabalho Frank, que o convida para morar em uma favela perto de uma igreja e conhece seu líder comunitário Gilbert.
Um hacker assume as transmissões de TV, alertando que a humanidade é "seu gado" e a única maneira de revelar a verdade é desligar o sinal em sua fonte. Aqueles que assistem à transmissão reclamam de dores de cabeça. Ele segue Gilbert e o pregador até a igreja, descobrindo uma gravação de música gospel tocando que, obscurece uma reunião com um grupo que inclui o hacker. Ele também descobre equipamentos e caixas lá dentro, mas escapa quando esbarra no pregador. A favela e a igreja são destruídas em uma batida policial, e o hacker e o pregador são brutalizados por policiais.
Ele recupera uma das caixas da igreja e pega um par de óculos de sol. Ele descobre que eles fazem o mundo parecer monocromático, mas também revelam mensagens subliminares na mídia para consumir e se conformar. A revelação mais intrigante, no entanto, é que eles também revelam que muitas pessoas são, na verdade, alienígenas macabros e de olhos esbugalhados, escondidos sob fachadas humanas. Além disso, as criaturas têm comunicadores de relógio de pulso que permitem que elas se teletransportem, junto com drones de vigilância. Mas note o detalhe: os óculos são uma herança que o protagonista recebe da ideia protestante da igreja que fala a verdade, mas tem uma estrutura de adoração e louvor a um líder. Mas, inocentes de sua própria situação, mesmo eles são obliterados devido a sua relação com a favela.
O problema é que isso não acaba por aí, pois uma vez que ele sabe a verdade o que pode fazer com ela? Com o sistema controlado por seus opositores, o fato de ele saber a verdade só o torna mais vulnerável ao ataque dos aliens pois ele tem que fingir que não sabe e não está vendo a verdadeira forma deles.
Ele decide então tentar mostrar a verdade para outra pessoa. Ele começa por um colega seu em uma cena que é até mesmo hilária. Acontece que o protagonista quer que ele coloque o óculos e veja verdade da sociedade, mas ele se recusa a qualquer custo. E a coisa fica tão séria que eles começam a cair na porrada para que o colega usasse o óculos, que não usa e não aceita até o fim.
Além disso, os alienígenas estão usando o aquecimento global para tornar a atmosfera da Terra semelhante à de seu planeta natal, enquanto esgotam seus recursos naturais, como a Amazônia, para seu próprio ganho. Os alienígenas transmitem um sinal que impede os humanos de identificá-los e suas mensagens ocultas, e quando o protagonista descobre isso decide explodir o sinal para que todos saibam a verdade.
Não vou contar o final, mas basta saber que sua luta se assemelha com a de Cristo, que virou um exemplo para a humanidade. E isso provavelmente vem da herança com a sua relação com a igreja.
Buscando explicar o sentido do filme, vou colocar aqui as palavras do diretor e criador da ideia do filme, Carpenter. Carpenter disse que a ideia original do filme deriva de sua insatisfação com as políticas econômicas do então presidente dos EUA Ronald Reagan - também conhecidas como Reaganomics - e o que Carpenter via como uma comercialização crescente na cultura popular e na política da época.
Após o lançamento do filme, Carpenter comentou: "A premissa do filme é que a 'Revolução Reagan' parecia comandada por alienígenas de outra galáxia. Empreendedores livres do espaço sideral tomaram conta do mundo e estão explorando a Terra como se fosse um planeta do terceiro mundo. Assim que esgotarem todos os nossos recursos, eles irão para outro mundo... Comecei a assistir TV novamente. Rapidamente percebi que tudo o que vemos é projetado para nos vender algo... É tudo sobre querer que compremos algo. A única coisa que eles querem fazer é tirar nosso dinheiro."
Carpenter pensou nos óculos de sol como sendo a ferramenta para ver a verdade, que "é vista em preto e branco. É como se os alienígenas nos tivessem colonizado. O diretor comentou sobre a ameaça alienígena do capitalismo em uma entrevista: "Eles querem possuir todos os nossos negócios. Um executivo da Universal me perguntou: 'Onde está a ameaça nisso? Todos nós vendemos tudo todos os dias.' Acabei usando essa fala no filme." Os alienígenas foram deliberadamente feitos para parecerem ghouls, de acordo com Carpenter, que disse "As criaturas estão nos corrompendo, então elas próprias são corrupções de seres humanos."
Em 2017, em resposta às interpretações neonazistas que buscaram deturpar o filme, Carpenter esclareceu ainda que o filme "é sobre yuppies e capitalismo desenfreado " e "não tem nada a ver com o (suposto) controle judaico do mundo ".
É um filme que apesar de passar uma mensagem complexa e profunda, não é difícil de entender pois é muito claro em suas ideias. Essa mistura entre filme cult e filme trash ou de cultura pop, como super heróis ou ficção científica, são típicos do estilo de Carpenter.
O diretor que só possui filmes geniais como este, usa o estilo e ideias comuns das produções para pegar as pessoas através do que elas já conhecem e levá-las até um novo lugar, que justamente questiona e expande esses locais comuns. Recomendo também dele Christine, Enigma de Outro Mundo e Cidade dos Amaldiçoados.
Neste filme, que talvez seja o seu melhor apesar de o mais conhecido ser obviamente Aventureiros do Bairro Proibido, Carpenter sintetiza ideias que são importantes e relevantes em sentido social, como também possuem um profundo debate em torno da comunicação, do jornalismo, marketing e logo do próprio cinema. Um filme totalmente genial, que se você ainda não conhece precisa conhecer.
Assista:
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