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Veludo Azul (1986): O mal escondido por detrás das aparências

Filme de suspense e drama com pegada neonoir, de 1986, nele David Lynch aborda questões profundas sobre existência humana, aparências, jogos de psicológica social, onde o contorno é o sonho mediando as expectativas dos personagens. Um filme inovador e crítico, e ao mesmo tempo artístico e sedutor. Um verdadeiro clássico moderno. O longa conta com os atores Kyle MacLachlan, Laura Dern, e conta com a participação da diva Isabella Rossellini


David Lynch ganhou o Óscar honorário em 2019 pelo conjunto da obra, quem homenageou ele foram os atores de Veludo Azul, Kyle MacLachlan e Laura Dern, que homenagearam o estilo de David Lynch.


O cineasta (criador de Twin Peaks) passou a ser conhecido por uma assinatura e uma forma de estética próprias dele. Apesar de nunca ter levado a estatueta, ganhou o Óscar pelo conjunto da obra. Assim, podemos dizer que existe um cinema "Lynchano", inspirado no surrealismo, e na estética de sonho. O filme Veludo Azul foi inspirado em uma canção de Bobby Vinton. O filme dividiu a crítica na época de lançamento, mas logo se tornou um clássico cult pela temática de psicologia presente no filme. 


O enredo começa em uma pequena cidade dos Estados Unidos, um jovem que saiu de casa para estudar na faculdade, volta para sua cidade para rever seu pai que sofreu um infarto, e está no hospital. Aqui David Lynch antes mesmo de Twin Peaks, contando com a presença de Cooper e Diane, já imagina um universo dentro de uma pequena cidade, com respostas sociólogas e cotidianas de cidade pequena. Se percebemos a metalinguagem do filme, falamos sobre arquétipos de tipos de cinema e gênero narrativo específico. 




Blue Velvet foi financiado pelo estúdio De Laurentis Entertainment Group, que era um estúdio independente de um produtor de filmes italiano, e assim que o filme foi financiado. Nesse projeto, também já havia a colaboração de Angelo Badalamenti na trilha-sonora. 


Tudo começa quando o jovem acha uma orelha e começa a ficar obcecado com o clima de mistério da cidade, vai até a delegacia e informa sobre a descoberta dessa "pista". 


Para a cantora diva a vida não é fácil, ela vive com um mafioso local que quer controlar ela através do sequestro do filho que ele mesmo tem com ela, demonstrando o carácter frio das relações. Mas muito mais que isso, a obsessão do jovem no filme é um assunto de análise separada. Em certo momento, ele invade o apartamento da cantora e fica lá como um stalker, até que ela descobre, fica assustada no começo, mas depois se envolve com ele. 



Nessa parte do apartamento, é onde observamos que o apartamento é a figura do "lugar onde tudo pode acontecer" na cabeça da realização do ideal da fantasia. Mas essa estética do estímulo ao perigo pela fantasia da identidade dupla toma contornos cruéis ao relacionamento ser descoberto tanto pelos mafiosos, quanto pela polícia (o pai de menina colegial que Jeffrey se envolveu, a Sandy). 


Primeiro, é o mesmo ator, o Kyle MacLachlan que interpreta o Agente Cooper na série, e o jovem inocente Jeffrey Beaumont, que entra em algumas complicações após se envolver com duas jovens, uma delas é seu romance ideal, com uma menina um pouco mais nova que ele, que é por coincidência, filha do xerife local. Ele também entra em disputa com Frank, interpretado por Dennis Hopper, famoso ator de filmes de ação.



Enquanto se envolve com ela através de encontros esporádicos onde conversam sobre os mistérios da pequena cidade, ela conta para ele que tem uma senhora misteriosa da cidade, a cantora Dorothy Vallens (Isabella Rossellini). Também se envolve com a colegial Sandy (Laura Dern). 




Jeffrey é o jovem de faculdade que está obcecado com assassinatos e conspirações locais, ao chegar na cidade se envolve com duas mulheres, a primeira Sandy é uma colegial, e a outra é uma cantora, que canta toda noite a mesma música, e que envolvida em uma situação de exploração por conta de uma máfia local e de seu marido que a chantageiam em troca de manter o contato com o seu filho, que aparenta estar em situação de sequestro. 




Aqui a metáfora é perfeita na figura de Isabella Rossellini, o público médio pede sempre um tipo de filme onde envolva a violência como principal conteúdo dos filmes. 


Com o tempo, vemos um jovem obcecado pelos mistérios da diva, junto com isso Quando o jovem aparentemente inocente acha uma orelha no meio do nada, resolve ir na delegacia local onde conhece o delegado, pai da menina que  está saindo. 



Observamos o desenrolar de uma conspiração que envolve a cidade e sua máfia local, como o jovem se envolveu com a cantora, ele acaba também "andando com a máfia" junto. Nesse momento, ele se transforma e passa a ser cada vez mais abusivo e obcecado com ela. 




Na hora de sair com os caras da máfia, ele diz que prefere beber Heinekein, levaram aos ricos os caras que comentam: "Você é tão fudidamente suave". Podendo aqui ser uma forma de metalinguagem do que sempre foi esperado de David Lynch, e ele era suave para entregar esse "realismo". 





 O filme também aborda o tipo de índole de dois perfis distintos de homem que Lynch busca definir de relação de poder que existe nos relacionamentos interpessoais. Como visto na cena abaixo, uma das mais marcantes do filme. Enquanto o jovem observa pela brecha do armário, o marido mafioso da cantora volta para casa, depois de bater nela, ele recorre ao ridículo arquétipo da "mom" mamãe, como se a extensão psicológica do abuso que ele a faz passar, mesmo assim, ele ainda a vê como sagrada, como uma forma de arquétipo. 




Aliás, várias lições e respostas podem ser lidas na lição psicológica carregada no filme, um jovem se envolve com duas moças, logo, passa a ter duas personalidades. Um é do romance "saudável" e romântico, outra é uma fascinação do tipo stalker que ele passa a ter por Dorothy. Aí ele começa a ser ameaçado pelo marido da cantora e a correr perigo de vida de verdade. O filme é maldoso por brincar que pessoas que se envolvam em histórias macabras fazem isso por que querem, discutindo a responsabilidade e a intenção das aparências. A violência do filme ocorre mais pelo fim do filme, como algo inevitável, por mais que todos soubessem enquanto ruído antes. 




 As alegorias psicológicas do filme são ótimas para evidenciar que a questão do controle é mais mental do que efetivo, como se as amarras da autoridade fossem sempre discursivas. Embaixo vemos o mafioso local e marido com seu problema de dificuldade para respirar constantemente. Ao mesmo tempo, ele não larga o papel de autoritário. 


Tudo sendo justificado pelo fato dela sofrer um tipo de chantagem. O que é mais louco está implícito, por exemplo, Jeffrey ser um bom rapaz, mas sempre estar no meio de confusão é uma das pistas. É como se ele gostasse de ser o "bonzinho" que conserta a senhora depois que o outro a maltrata. Como se fosse dois perfis masculinos se completassem de uma forma que um não existe sem o outro.


No final do filme a narrativa e o gênero do filme mudam do nada. Toda a fantasia de manter as duas mulheres, a "santa" e a "puta" se encontram na casa da família de Sandy, e a máscara social de bom moço do herói cai por terra. A cena ri de toda a composição noir e misteriosa do filme, situando o gênero ao entendimento do comportamento real dos personagens. É aqui que o gênero sedutor do filme se transforma em uma forma de crítica ao modo de vida do personagem principal, o jovem Jeffrey. A moralidade e o preconceito são óbvias na construção da cena. Como se personagens bobos vivessem uma mesma vida que várias outras pessoas já viveram, só que sem perceber. 




Ao abraçar a outra namorada nua na sala de estar, Sandy chora ao perceber que seu namoradinho era um cafajeste de primeira ordem, mas sob o julgo da descrição de personalidade, ele se colocava como aquele que não batia, como aquele que não agredia, e em mais de uma cena do filme, isso foi mostrado como dúbio. 


Ou seja, aqui ser bom ou mau é mais sobre ser crível e creditável dentro de uma relação. Isso quer dizer que a fachada e as máscaras sociais enganam a perspectiva das pessoas, ainda mais no cinema. Esse parece ser o tapa na cara do filme. O fim onde todos aprendem a amar o subúrbio e os costumes americanas é uma visão nacionalista e conservadora do filme, mas é o que um filme de grande público pede. 


É apenas aí que entendemos a extensão da crítica conservadora de Lynch. Somos reféns não apenas de fenômenos do psíquico enquanto todo, mas as próprias narrativas da vida fazem parte desse entendimento de personalidade. Sempre que interagimos com as pessoas, projetamos uma persona e isso envolve jogos de expectativas sociais. Tais como: usa terno, não é bandido. 


David Lynch é aquele que sempre duvida desses padrões de heróis, e isso faz de seu cinema diferente do clichê. Disponível no Amazon Prime Video.




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