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Samurai Champloo: Passado no Período Tokugawa, anime mostra o surgimento e as perseguições da cultura e das tribos urbanas no Japão


Samurai Champloo se passa na antiga Tóquio, e aborda a transformação ocorrida pela Restauração Meiji. Misturando elementos tradicionais com referências culturais anacrônicas de estilo, como o uso do hip hop, a série segue a garçonete Fuu, do vagabundo Mugen e do ronin Jin. Fuu, que salva Mugen e Jin da execução, força a dupla a ajudar em sua busca para encontrar um samurai que "cheira a girassol". Estruturada ao estilo de um road movie, a série fala da tolerância e a aceitação das minorias em contraste com seu cenário, sendo o tema central a representação e aceitação da morte



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Um anime muito especial e único. Que se preocupa em ser correto na maioria de suas referências históricas. Acompanhamos as aventuras de um trio, uma garota, a Fuu que parte em uma jornada pessoal rumo a encontrar o Samurai com cheiro de Girassol. Vemos que a Fuu viaja com dois amigos, um deles um ex samurai (ronin)chamado Jin, que costuma a ser quieto e não falar muito, enquanto seu amigo que não sabe ler fala pelos cotovelos.  A série que aborda muito da história factual, mostra alguns personagens estrangeiros que tentaram entrar ou sair do Japão na época, como o holandês Isaac Titsingh, o francês Xavier III, e o americano Commodore Perry.


O diretor da série, Shinichirō Watanabe, definiu o tema central de Samurai Champloo como a representação e aceitação da morte, temas que ele havia explorado anteriormente em sua série de ficção científica Macross Plus (1994) e Cowboy Bebop (1997).  Embora seja um período histórico, o anime não se concentra em detalhes históricos além de pequenas inclusões e referências, principalmente usando diálogos e comportamentos de estilo contemporâneo. Quem se lembra da incrível Cowboy Bebop e de todas as suas referências ao cinema clássico e a América Latina, como também aos clássicos elementos do faroeste, como o programa big shots que apresentava as notícias do fim do mundo da maneira mais punitiva possível. 


Outro episódio marcante que lembro muito é quando Jin se envolve com uma prostituta local que era explorada pelo ex marido que tinha largado e mesmo que ela falasse para ele que sua vida estava tudo bem, ele agiu contra aquela sociedade sozinho (ao estilo de um revolucionário), mas a solução não foi óbvia, ele não fez isso apenas por seu envolvimento pessoal com a moça, ele fez isso pela sua ética, por isso que ele coloca ela em um barco e não foge junto com ela, pois sua jornada já era com os dois amigos consagrada. Mas a dúvida se ele ia ou não com ela foi um debate muito interessante também sobre romantismo ou realismo. 


Um dos meus episódios favoritos é o 18, "War of Words (Guerra de Palavras)", é o episódio que Mugen aprende a ler é sensacional, mostrando esse  lado prático e de guerra real da alfabetização, quando seu professor era um bruto brigão de bar que não conseguia acreditar que ele ainda não havia descoberto as primeiras letras. Tudo começa nesse episódio com a observação de Fuu que Mugen nunca escolhia no menu de cardápio algo próprio, indo sempre no pedido dos dois amigos. Aí que descobrem seu grande segredo.  Com uma "pedagogia bruta", conseguiu ensinar um aluno como Mugen, que termina o episódio apreciando mais o mundo das letras.




Outro grande episódio é o das cartas de figuras sensuais femininas (como os jogos de cartas feitos pela empresa da Nintendo no início), e como que na época essa forma de arte estava ainda ligada com grupos marginais e na exploração feminina.  Nesse episódio, Fuu é sequestrada depois de fazer o modelo para a pintura para um artista, obrigando seus amigos a resgatarem ela.


Uma série super histórica, divertida do mesmo criador de Cowboy Bebop que mistura elementos históricos e anacrônicos para marcar uma certa estética futurista de anime, que contraditoriamente utiliza da história para falar sobre o surgimento da cultura urbana, escrita e citadina no Japão e o fim do xogunato antigo. O período Edo se chama assim em homenagem a cidade de Edo (atual Tóquio), que era a capital do xogunato. O bushidô significava "o caminho do guerreiro", sendo uma série de regras que envolvem mais a ideia de resoluções pacíficas, apesar da fama tradicional dos samurais. Foi instituído no período Edo anterior e serviu como lei oficial em 1603.


A arma de fogo veio para tirar a importância absurda e a sensação de superioridade de fazer parte das classes superiores que até então participavam os samurais. Após esse período, com a formação nacional dos policias comuns e dos regimentos internos, os samurais passaram todos a ser ronin, membros de classes consideradas inferiores para ele até um século antes. É em cima desse fato histórico que o anime brilha ao mostrar o fim da época dos samurais como grades maus e elitistas e a popularizavam dessa figura histórica que flutua de vilão a mocinho dependendo do contexto. Mas é verdade também que foram os samurais e ronins uma das classes que mais participaram dos processos de modernização no Japão, participando de revoltas e rebeliões contra poderes injustos.


Os Xoguns eram generais militares membros do governo feudal da época. A série se passa no Japão do período Edo, aproximadamente sessenta anos após o fim do período Sengoku(de isolamento). Vemos também o começo de leis coercitivas como a proibição do uso comum das espadas, isso já muito tempo depois, no fim do século XIX, depois da Restauração Meiji, o salário (soldo) dos samurais passou a ser responsabilidade do Estado depois de 1888, o que explica o novo foco e novos motivos de revoltas para os samurais, que passaram a não poder carregar suas armas como antes.


O diretor Shinichirō Watanabe começou a planejar a série em 1999, criando os personagens e a premissa durante seu trabalho em Cowboy Bebop (outro anime clássico, mas esse é mais sobre o futuro), já Samurai Champloo é um incrível mergulho no passado recém saído da Idade Média que foi o século XIX no Japão, como a sociedade dos generais havia caído em detrimento de uma casa apenas, a unificação tardia fez com que elementos de tradição e modernidade convivessem estreitamente.  


A questão da perseguição monarquista contra aqueles que eram considerados párias e impuros, já que tratavam de lidar com cadáveres, sujeira ou matavam animais, ou exerciam atividade manual. Uma classe social era proibida de se mistura com as outras. Esse período de isolamento, com proibição do comércio estrangeiro apenas poupava China e Holanda. 



O Japão viveu contraditoriamente um período de relativa paz e prosperidade após séculos de guerras civis. Então a forte legislação real contra minorias e estrangeiros trouxe paz por impedir os conflitos locais e focar nos conflitos externos. O período Tokugawa terminou em 1868 com a restauração meiji, quando o imperador recuperou sua autoridade e progressivamente passou a abrir o país para o comércio externo. 


Uma inclusão consciente enfatizava a aceitação cultural e a tolerância das minorias, incluindo o povo indígena Ainu, estrangeiros, pessoas LGBT e cristãos; o histórico período Edo foi uma época em que o Japão era altamente estruturado, conformista e isolacionista. Devido ao cenário Edo e à incorporação da cultura samurai e dos códigos de honra, Watanabe estava preocupado que o anime fosse visto como um tom nacionalista, levando seu foco às minorias e à tolerância. 


Isso também é muito legal do anime, que aborda o surgimento de várias culturas e tribos, o surgimento das tatuagens, do consumo de pinturas como pornografia disponível na época, e claro aborda o surgimento da cultura dos grafiteiros, das tribos de rua, do começo do uso de tatuagens para identificar membros de gangues ou de grupos de resistência.



No Japão Tokugawa, havia grande isolacionismo que pretendia "proteger o Japão da influência estrangeira", com leis como a Sakoku, que proibia o comércio com os outros países, especialmente os cristãos, em um sistema de rígido controle social e de classes sociais imutáveis que vinha desde a época dos daimiôs. Abaixo dos samurais estava todo o povo comum, os camponeses, os artesões os comerciantes; 


A equipe incluiu o designer de personagens e diretor de animação Kazuto Nakazawa e os escritores Shinji Obara e Yukihiko Tsutsumi da Office Crescendo. A música foi composta pelos artistas de hip hop Shinji "Tsutchie" Tsuchida do Shakkazombie, Fat Jon, Nujabes e Force of Nature. A produção não foi estruturada, com o cenário passando por várias revisões e Watanabe trazendo vários criadores convidados para garantir uma animação de alta qualidade. A recepção da série foi positiva, com elogios focados em sua animação e música, e provou ser um sucesso comercial no Ocidente.


Samurai Champloo abre em uma pequena cidade onde Fuu, trabalhando como garçonete, é assediada pelo filho do prefeito corrupto da cidade. O bandido Mugen chega à cidade e Fuu implora por proteção, que ele dá em troca de comida. Enquanto isso, o ronin Jin, também recém-chegado, mata os guarda-costas do prefeito quando eles abusam de um camponês, acabando em conflito com Mugen quando este o confunde com um dos homens do prefeito.


 A briga dos dois acaba destruindo a casa de chá. A dupla é capturada e condenada à morte, mas Fuu os salva. A dupla tenta reiniciar a batalha, mas Fuu joga uma moeda, dizendo que se cair cara, a dupla pode continuar a batalha, mas se cair coroa, eles adiam a batalha para ajudá-la a encontrar um samurai que cheira a girassóis, a quem ela procurou por anos. Ela vence o sorteio e eles embarcam em uma série de aventuras ao lado da missão de Fuu. 


Nas histórias finais, os três finalmente chegam à cidade de Ikitsuki, cada um terminando em conflito com um grupo de assassinos enviados pelo governo para matar o "samurai girassol", pai de Fuu, Seizo Kasumi. Fuu encontra Kasumi, querendo vingança por ele ter abandonado ela e sua mãe, mas ela cede porque ele já está morrendo de doença. Um dos assassinos mata Kasumi antes de ser derrotado por Jin. Mugen e Jin então duelam, suas espadas se quebrando, mas optam por não se matar, pois agora se consideram amigos. Fuu descobre que seu pai participou da Rebelião de Shimabara e foi embora para protegê-la. 



Fuu também revela que mentiu sobre o resultado do sorteio, o que irrita brevemente Mugen e Jin. Recuperados de sua luta final, os três se separam gratos por sua aventura compartilhada. Vale lembrar também que que documenta a história praticamente é Fuu, que depois mantém um diário onde ela escreve suas experiências desde que começaram as viagens. No DVD da série, o diário é parte importante que conta experiências, sentimentos, opiniões sobre os episódios, incluindo ilustrações e curiosidades sobre anime.


O estilo de luta de Mugen e Jin se diferencia muito. Jin é disciplinado, herdeiro da educação dos samurais muito técnica, Mugen tem um estilo de luta rápida e aprendida nas ruas, e observamos isso ao decorrer dos episódios. Jin usa sua espada como arte de perfuração, buscando manter ela em equilíbrio na frente do corpo em posição vertical, sendo capaz de executar golpes rápidos, precisos e letais. Seu estilo é muito elegante. É interessante ver que os personagens por mais autorais e anônimos conhecem pessoas de verdade e participam de batalhas e revoltas históricas também.


Outro episódio marcante é quando Jin derrota Kariya Kagetoki, um espadachim que foi responsável pela morte de seu antigo mestre, Mariya Enshirou, um grande mestre das espadas que ensinou tudo a Jin, que era seu melhor aluno. Outro detalhe importante é sobre as técnicas de luta que também são muito precisas, como a técnica de Mugen que enfrenta certa vez um mestre espadachim com uma técnica de fogo. Normalmente, ele usa sua técnica específica sua que mistura break dance e esgrima.


É quando (SPOILER) Fuu descobre que seu pai que procurava há muito tempo, participou da Rebelião Shimabara, que envolveu milhares de comerciantes, samurais e camponeses, motivados por fatores como a fome, opressão fiscal, opressão religiosa e forte descontentamento geral, entre 1637 a abril de 1638, culminando com a derrota para o xogunato Tokugawa, que atacaram o Castelo Hara. Como resultado o cristianismo foi oficialmente proibido até meados do século XIX. 



Outra referência cultural mostrada no anime é um tipo de teatro japonês que comina música, dança, drama e maquiagem elaboradas, surgido no século XVII, acabou sendo uma das principais representações de cultura popular, quando Mugen participa de uma peça de kabuki como ator substituto e acaba se envolvendo em uma história de assassinato; Outra arte citada no anime é o haiku, uma forma estilística de poesia tradicional japonesa que expressa sentimentos e impressões sobre a natureza e a vida presente, com um episódio inteiro dedicado somente a forma escrita  quando conhecem um poeta chamado Ikkyu, inspirado em um monge zen real do século XV. 


Um anime clássico, essencial, que se você ainda não assistiu, precisa conferir!

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