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Drive My Car (2021): Longa japonês ilustra a metáfora perfeita da indústria cinematográfica moderna perante o streaming e o mundo uberizado



O filme Drive My Car (Dirija Meu Carro), ou do título original em japonês, ドライブ・マイ・カ,(Doraibu mai kā) é um filme de drama japonês escrito e dirigido por Ryusuke Hamaguchi. É baseadao em uma pequena estória chamada Men Without Woman (homens sem mulheres), de 2014.  O filme segue a vida de Yūsuke Kafuku (Hidetoshi Nishijima), enquanto ele lida com o trauma da morte de sua mulher Oto. Considerado um dos melhores filmes de 2021, foi selecionada para concorrer ao Palma de Ouro em Cannes, onde ganhou três prêmios, e foi escolhido como representante japonês para concorrer em melhor filme em linguagem estrangeira. Também ganhando o prêmio do Juri Ecumênico (independente) do Festival de Cannes.




O filme tem quase 3 horas, mas parece como em Nomadland, querer usar esse tipo duração para passar um sentimento específico, nesse caso, de angústia. O filme foi comparado com o longa Burning por ter o mesmo tipo de narrativa. Alguns pessoas consideraram o filme uma espécie de roadmovie intelectual. 




Yūsuke Kafuku é um ator de teatro casado com uma roterista que gosta de inventar histórias durante o sexo. Antes eles tinham uma filha de 4 anos de idade que morreu de pneumonia. Depois disso, Yūsuke também acabou flagrando sua esposa lhe traindo com um homem mais jovem. Um dia, Yūsuke volta para casa e Oto está morta no chão, morrendo de hemorragia cerebral. 



Yūsuke vê o amante de Oto em seu funeral Dois anos depois, Yūsuke Kafuku aceita um acordo de dois meses com o programa de teatro local de Hiroshima, onde ele dirige uma adaptação em vários idiomas da peça de Chekhov Uncle Vanya.


A companhia de teatro exige  que ele seja acompanhado por uma motorista, uma moça de 23 anos chamada Misaki Watari, ele não quer por possuir um hábito de decorar as falas de sua peça enquanto dirige. Mas depois ele permite que a moça o dirija ao perceber que ela tinha muita habilidade na direção, sendo uma profissional de ponta em sua carreira. 


Kafuku ajuda na escolha do casting selecionado no meio de vários atores alguns para sua produção. Acontece que cada um fala uma língua. Quem interpreta Sonya é uma mulher muda, então ela usa apenas linguagem de sinal, e o amante de Oto foi interpretado por Kōji Takatsuki, apesar dele ser muito jovem como protagonista. 



Os ensaios acabam não rendendo muito por conta da dificuldade de comunicação do elenco entre si por conta da diferença de linguagens. Enquanto isso, Kafuku fala aos atores para tentar manter o texto original. 


Takatsuki pergunta para Kafuku para encontrá-lo para conversar, mas ele não quer conversar profundamente com ele. Durante uma noite dirigindo com Takatsuki, Kafuku revela que ele sabia dos casos da sua esposa, mas não falava nada pois ele tinha medo de perder ela. Takatsuki diz ter admiração pela escrita de Oto. Dizendo que ele sabia o fim de uma das histórias que Kafuku não sabia. Depois de um tempo, a polícia chega ao ensaio e prende Takatsuki  por matar o homem que estava tirando fotos dele. 


Os coordenadores de teatro querem que Kafuku entre no papel de Vanya. Kafuku pergunta para Watari se ela o levaria onde a família tenha havia morrido em uma nevasca. Quando eles chegaram no lugar, ela revela que sua mãe era abusiva e que escondia uma segunda personalidade todo vez depois de bater nela, ela ficava infantil e amiga dela do nada, como um espírito. 


Kafuku expressa arrependimento por não ter voltado mais cedo para casa no dia que sua esposa faleceu e se abraçam. Eles voltam para Hiroshima, onde Kafuku faz o papel de Vanya e impressiona com sua performance na frente de uma audiência.  Ela volta fazendo compras em um mercado, entra no carro vermelho, onde um cachorro espera por ela no banco de trás. 


Bastidores e contexto interno do filme





O filme de Ryusuke Hamaguchi, foi escrito junto com Takamasa Oe. Sendo um roteiro baseado na história de mesmo nome de Haruki Murakami, vindo de um conto curto chamado Men Without Women, e mostra detalhes e elementos de uma das histórias de Murakami, chamada Scheherazade and Kino, e era ambientado em Busan, na Coréia do Sul, mas o lugar foi mudando para Hiroshima devido a pandemia de Covid-19.  Ele também fez o filme Wheel of Fortune and Fantasy.


O premiado e inovador filme de Ryusuke Hamaguchi aborda o problema da tristeza, luto e infidelidade, sendo nossa visão sobre a jornada do artista em torno de sua obra. Em entrevista ao The Guardian, o diretor confirmou o que eu já tinha sentido: que filme era essencialmente, uma metáfora do próprio meio cinematográfico, confirmando lá que a metáfora do carro é sobre a construção de um roteiro. 



O diretor  tinha se preparado desde o terremoto de 2011 no Japão que atingiu a região oriental de Tōhoku. Ele percebeu como que percorrer distâncias de carro poderia levar você a lugares distantes, ele percebeu que era mais fácil conversar com alguém no carro por isso. Ele acaba escutando fitas de gravação de sua esposa citando o poeta russo Chekhov e aí ele admite que sabia da infidelidade da esposa conversando isso com sua motorista.


A ideia do filme é misturar o questionamento sobre desejo sexual, hábitos cotidianos e perspectiva de vida, dentro disso, a questão do role-playing e principalmente a questão de contar uma história (storytelling). As linhas do roteiro estão descritas na mesma sensação cinética do carro, cada linha disposta em relação ao cenário de passar com o carro. As linhas do roteiro são como o veiculo. Uma das técnicas metalinguísticas do filme é o tipo de ensaio que Hamaguchi fez com métodos que confundiam a mente. 


A ideia é que o bom primeiro ensaio deveria trazer uma característica de falsidade dos sentimentos e que isso seria normal, como uma forma de treino de estranhamento inicial, e isso se vê muito no filme com a questão da falta de comunicação do elenco. Depois de filmar parte em um set em Tokyo foram pegos com os desafios de filmar depois da pandemia de 2020, com as filmagens atrasando em quase 8 meses. 


Minha Leitura do Filme 


Ao produzir um texto para a companhia de teatro, Kafuku se torna um diretor mais do que apenas um ator. Ao fazer isso, possibilita ele esquecer da lembrança dos traumas que viveu com a esposa ao perder ela. Kafuku tenta levar os atores ao parque, mesmo com os problemas de linguagem, ele estimula certa técnicas como ensaiar o texto em voz alta. Quando Oto era viva, ela tinha o hábito de contar estórias e criar durante o sexo, ela não lembrava de nada, Kafuku lembrava no dia seguinte e contava os detalhes para sua esposa. Sugerindo que seu processo de potência sexual e processo de criação criativa estarem entrelaçados. 


Um artista deveria olhar primeiro para si mesmo para ver os personagens, ver outras pessoas como personagens. Através desse processo, Kafuru se torna um diretor de atores e não apenas alguém que faz uma performance. O filme foi selecionado em cinemas como um dos melhores filmes de 2021. Ganhando o circuito de críticos do New York Film Critics de Melhor Filme. Esse carácter épico e dramático no filme se estende um pouco demais e acaba se tornando mais uma reafirmação da necessidade de sentimentos reais e abordagem de questões estruturais para além apenas do elemento do romance e do sexo. 


O contexto do humanismo e da empatia é sentido na narrativa através do questionamento pessoal do protagonista que se vê no de problemas pessoas que não consegue resolver. Com a morte da mulher dele, a situação piora. A mulher dele era a própria forma da indústria moderna, a criação dela estaria vinculada com o desejo (libido) ao passa de que ela criava estórias específicas enquanto transava (ou seja, como uma metáfora de que o trabalho dela emanava uma potência sexual), e que nisso, há um questionamento sobre masculinidade. Ele não questiona a infidelidade da esposa, como também não questiona a forma de se fazer um filme moderno, que exige essa concentração na centralização da produção para atender aos chefes do streaming, e exige uma forma transnacional de se fazer cinema. Atores de diferentes países, falando diferentes linguagens, como a maioria dos filmes da Netflix, por exemplo. 


A ideia do filme ser épico aqui não tem a ver com ter uma narrativa inspiradora, mas sim pela narrativa ser facilmente entendida por uma crítica especializada. O filme do tipo de streaming é feito através do roteiro (que significa potência e libido, pois é uma ideia que vem de dentro), mas isso é submetido aos outros atores, aos outros componentes de se fazer um filme, com a filmagem e com a visão da ilha de edição final também. 


Dentro disso, é necessário entender que para o diretor, o carro é a metáfora de fazer um filme. A esposa é a metáfora do tipo de narrativa que cola e vende (a narrativa da esposa que era bem sucedida com suas ideias). Já ele não teria tanta criatividade e imaginação, quando ela morre, ele fica mal e descobre com sua nova motorista um lado humano que parecia que ele não via mais no dia-a-dia frio de produzir um filme de streaming. 


Eles nem se envolvem romanticamente, nem nada. Mas o personagem da motorista é uma clara referência ao tipo de pessoa simples e trabalhadora, que não tem o tipo de imaginação e tipo de de problema do protagonista. Quando eles vão até onde ela perdeu a família em uma tragédia, é o momento que vemos que a motorista Misaki é uma referência ao tipo de cinema de drama ou de temática social, ao estilo Parasita, ou Nomadland ensinaram uma necessidade de abordar o lado humano das tragédias e dos sentimento no cinema, em oposição ao estilo de atuação do "herói vazio" que ele tem que coordenar para fazer seu filme. Embora a sensação do personagem criado por Kafuru seja de ser vazio, ele tem os seus dramas reais, como a morte da filha, que fez ele se distanciar primeiro do casamento e da esposa. 


O senhor Kafuru, nosso protagonista pega glaucoma e mesmo assim quer recusar a motorista que designaram para ele. Para ele, a privacidade no carro ele o momento x de criação, inspirado no antigo hábito da esposa. Outra coisa reparada é que Misaki é uma profissional perfeita, no sentido que não é possível falar nada sobre ela. No início do filme, vemos quase uma hora de prólogo que precede até mesmo o crédito de abertura, sendo também uma forma diferente de montar o filme. Apesar de parecer tranquilo com as tragédias que acontecem com ele, ele mantém uma fachada de social democracia que uma hora não existe mais. Ele tinha desejos que vingança que carregava escondido e que precisavam ser superados. 



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