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O Encontro do Oriente com o Ocidente: Uma história universal a partir da Rota da Seda




 

Uma resenha do livro que aborda o surgimento das civilizações dentro da fronteira do Oriente Próximo, com seus grandes marcos históricos, livros, contos e lendas que ajudam a contar sobre os primeiros choques civilizacionais e identificar suas fronteiras físicas e culturais. O livro é de Peter Frankopan, da Universidade de Oxford. O Encontro do Oriente com o Ocidente - O coração do mundo: Uma história universal a partir da Rota da Seda.   A perspectiva do livro é sobre um novo momento histórico onde as narrativas sobre a Ásia são de crescimento e revisão histórica, com exemplo do crescimento econômico da China e o estímulo de refletir sobre a nova Rota da Seda, um livro cheio de informações, em mais de 800 páginas. 



Um livro inspirado na clássica teoria do "coração do mundo", um centro de trocas culturais, comerciais que forma um "centro do mundo" de entrepostos e rotas, onde era possível um exercício de tolerância religiosa, escalonada por períodos de conflitos, como as guerras bizantinas árabes, e depois, por exemplo, as cruzadas.  Os cronistas modernos também mencionaram que havia uma "guerra das moedas", que envolvia o califado que começou a emitir moedas com a seguinte legenda: "Não há Deus exceto o único Deus: Maomé é o mensageiro de Deus". Em resposta, a cidade de Constantinopla revidou cunhando moedas não mais com imagem do imperador, mas com a de Jesus Cristo. Simbolizando uma mudança na postura da representação ocidental, agora cristão. 


Em trechos, observamos que ele foi escrito com fontes primárias, em diversas línguas diferentes, com auxílio de literatura e música folclórica, abordando desde guerras, conflitos, conquistas e nomes de figuras centrais para algumas fronteiras. Um exemplo, é lembrar que o antigo reino da Pérsia, extremamente moderno dentro do próprio oriente antigo, hoje em dia, corresponde a república do Irã, desde 1935. 

O início do livro conta sobre a inspiração do autor, que era a observação de mapas. Entendeu desde jovem um paradoxo sobre o estudo de história e filosofia, lendo um antropólogo, Eric  Wolf, acendeu o estopim em sua cabeça, ao descobrir que o esquema de explicação tradicional, Grécia antiga gerou Roma, Roma gerou a Europa cristã, a Europa cristã gerou o Renascimento, o Renascimento o Iluminismo, o Iluminismo gerou a Revolução Industrial.

 Os mulçumanos se colocaram na história como grandes influenciadores, havendo divisões internas, como os dois argumentos do Islã, um sendo a interpretação Sunni, sunita, que são aqueles que acreditam apenas nos descendentes de Ali, primo e genro do profeta e que eles que deveriam governar como califas, já o Shia, ou seja, os xiitas possuíam entendimento mais amplo de fé e conversão. O livro é uma tentativa de observação do começo da civilização através da originalidade do oriente, e não do ocidente, como de costume, em uma mantra do triunfo político e da ascensão da Europa como fazem as fontes tradicionais. 

O que é interessante é o trabalho do autor em não confundir o leitor, ao pontuar e explicar qual era o nome antigo dos lugares e comparar com os nomes atuais, como Pérsia que virou Irã. Reflete sobre como existe um entendimento que países como Afeganistão, Irã, Iraque, Síria, Alepo, são vistos como  locais pobres em liberdade de expressão, direitos humanos, ou economicamente falidos, ou em vias de falir, mas eram grandes impérios e possuíam ampla influência na antiguidade. 

Uma rede de trocas mundiais:  

Uma rede de estradas, que ligam o litoral da Ásia Menor á Babilônia, a Susa e a Persépolis, como observado por Heródoto, o pai da história, o lugar era visto com assombro, já que nem neve, chuva, ou escuridão podiam retardar a rápida transmissão de mensagens. 

Na região do delta do rio Nilo, o rio Oxus [Oxo] e o Iaxartes (hoje conhecidos como Amy Darya e Syr Darya) já eram importantes para fluxo local, em 525 a.C, o império Persa já possuía uma abundância em território que ligava o mediterrâneo ao coração da Ásia. Quando Alexandre da Macedônia, por exemplo, assumiu o império de seu pai rei Filipe, resolveu voltar seus olhos para o Império Persa e não para a Europa. Todo Grego bem educado, sabia que novidades e novas tecnologias vinham ao leste do mapa.


Embora possa parecer para o ocidente como locais distantes e com costumes diferenciados, esses países são o berço da civilização antiga, com o exemplo do "jardim do Éden", que acredita-se que era entre o território do Tigres e Eufrates, e continuam alvo de disputa até hoje.  Há uns 5 mil anos, surgiram nessas regiões as primeiras metrópoles na região da antiga mesopotâmia, como Harapa, ou Mohenjo-daro. 

Comenta sobre um geógrafo chinês que observou  as altas habilidades de negociação  dos habitantes de Báctria, no norte do Afeganistão, observando o fato de que as trocas linguísticas e comerciais eram intensas desde essa época.




Rotas e Trocas Culturais:

A lenda famosa do Prestes João é mencionada no começo livro, contando um conto de um rei cristão que desapareceu, e que teria fundado um reino cristão, com um palácio de puro ouro na África, mais precisamente, no reino da Etiópia, um dos países mais ocidentalizados na África, um dos primeiros a ter trocas culturais entre os continentes. Na Criméia, há uma cultura de avelãs, falcões e espadas, também de cera e mel, muito consumidos na Europa Ocidental. Outro produto característico das rotas é o âmbar e o comércio de peles de animais, o âmbar se tornou tão característico que já teve um historiador que cunhou o termo "a trilha do âmbar". 

Em termos religiosos, algumas fontes dos séculos XVII e VIII confirmam um pregador carismático, alguns confirmam ser Maomé. O impressionante aumento dos convertidos convergia com uma desesperada  batalha com os cristãos, que descreviam os árabes como inimigos, por exemplo, faziam isso ao maldizer os sarracenos e chamá-los de vingativos e violentos. 


Porém, Frankopan salienta que mesmo com essa "fama" não haveria uma conquista violenta ou dominação extensiva na região da Palestina e da Síria nessa época. Com exemplo de uma importante cidade como Damasco, no Norte da Síria, que se rendeu pacificamente para os novos senhores do Califado em troca de manter as igrejas funcionando. Outro lugar onde acordo similar ocorreu foi Alexandria, onde o patriarca Ciro fez um acordo a fim de "salvar vocês e seus filhos".

A memória do ocidente cultiva, por exemplo, o fato de que em 846, os mulçumanos saquearam Roma. Mas isso não ocorreu do nada. A tensão entre ocidente e oriente sempre foi latente em torno de fronteiras importantes.  As guerras bizantino-árabes tinham começado por volta ano de 600, pouco antes do saque em Roma. 

Os locais de disputam são fronteiras como a Anatólia, a Síria, Creta, Sicília, sul da atual Itália, Egito e norte da África. Bagdá, por exemplo, era conhecida como Madīnat al-Salām, "cidade da paz", possuindo grande florescimento cultural. 

(...)A rota das peles Em seu auge, Bagdá era uma cidade magnífica de se contemplar. Com seus parques, mercados, mesquitas e casas de banho – assim como escolas, hospitais e instituições de caridade –, abrigava mansões “com muito dourado e rica decoração, e belas tapeçarias nas paredes e cortinas de brocado e seda”, salas de estar “mobiliadas de maneira discreta e de bom gosto, com luxuosos divãs, mesas caras, excepcionais vasos chineses e inúmeros objetos de ouro e prata”. Ao longo do Tigre ficavam os palácios, quiosques e jardins que serviam a elite: “A cena no rio era animada por milhares de gôndolas, enfeitadas com bandeirolas, dançando como raios de sol sobre a água, e carregando os habitantes da cidade em busca de prazeres de uma parte a outra de Bagdá.

O oriente nesse período de "antiguidade tardia" despontava como grande local de riquezas e peregrinações que fizeram uma forma de revolução intelectual própria, durante até o século IX, quando começa a Idade Média. Se pensarmos o comércio no Golfo Pérsico, podia ser encontrado água de rosas, pedras preciosas, pérolas, linho e seda. Em Mosul, no atual Iraque, havia magníficas casas e maravilhosos banhos públicos,  onde também era possível encontrar locais para comprar flechas, selas e estribos. Já se quisesse encontrar óleo de gergelim, romãs, tâmaras, ou pistaches, o local ideal era Nīshāpūr, cidade no atual Irã.


Já na região da China, as disputas por rotas e fronteiras é assunto muito antigo. As chamadas zonas-tampão de desintegravam, ao passo que os mulçumanos seguiam para o leste, por volta do século VIII, em 751, os conquistadores árabes entraram em batalha com os chineses, derrotando-os no rio Talas, na Ásia Central.  Durante a dinastia dos Tang no poder, começou uma revolta liderada pelo general sogdiano, que causou instabilidade para outros explorarem. O que foi o caso dos Uigures, um povo tribal que se beneficiou da desintegração da China.

Os uigures eram mestres do comércio de longa distância, especialmente o de seda, converteram-se ao maniqueísmo, em busca de hibridizar a influência da China com a influência mulçumana. A tribo dos uigures, que era nômade se assentou para melhor controlar seus territórios. O assentamento  de Balāsāghūn ou Quz Ordu (no atual Quirguistão) é onde o povo uigure está localizado e disputa até hoje o seu poder e sua religião com a China e sua administração central. A cidade de Khagan, uma mistura de cidade e acampamento era o centro desse governo, isso durante o século XVIII. 

 

Estima-se que os fornos chineses era capazes que queimar entre 12 mil a 15 mil peças por vez. Os chineses também possuíam o maior sistema comercial marítima do mundo, muito antes da Escola de Sagres. Ao acharem um antigo navio naufragado, com 70 mil peças, objetos de prato, chumbo, e lingotes de ouro. Os artigos de luxo chineses como seda, pedras e porcelanas já eram exportados em navios para o mundo abássida no século IX. As técnicas de cerâmica local eram importadas do local, durante a dinastia Tang, quando o verniz branco se tornou popular. Houve também nesse período grande avanço na proporção da produção.



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