Pular para o conteúdo principal

Friends (1994–2004): Análise e curiosidades da série que se tornou um clássico dos anos 90

A série de tv Friends é um clássico moderno, sendo um modelo de sitcons que carrega fãs até hoje. Monica, Chandler, Joey, Rachel e  Phoebe e Ross. Todos moram em Nova Iorque, a cidade que dá a impressão de integração, cosmopolitismo e sucesso, fracassos amorosos e profissionais, e eterna magia do encontro do nada. Mas no fim de cada arco, entendemos que os amigos originais são aqueles que ficam para sempre. 


Clique aqui para saber onde assistir Friends

"Aquele texto onde se fala sobre Friends". A série Friends estreou nos anos de 1994, criada pelos amigos Marta Kauffman e David Crane. Ao longo da série, diversas participações especiais fizeram história no sitcom, como George Clooney, Robin Williams, Brad Pitt( ex-marido de Jennifer Aniston), Danny DeVito Charlie Sheen, Julia Roberts, Jean Claude Van Damme, Bruce Willis, Hugh Laurie, Isabella Rossellini, Sean Penn e Ben Stiller e Tom Selleck são alguns dos nomes de peso que já participaram da série.  


A série foi ao ar de 1994, e terminou em 2004, com o episódio final mais assistido da história da televisão. 


O retorno ocorreu no dia 27/05 de 201, e contou com nomes de peso. Cada ator do elenco original vai receber 2,5 milhões pela reunião. A série originalmente foi ao ar pela Warner. 



A série começou a ser escrita como experiência dos autores da série no período posterior a faculdade. Isso faz com que as reflexões por mais simples e cotidiana sobre dois sociólogos que gosto muito: Richard Sennet e Everett Hughes, refletindo sobre como os produtos culturais produzem um efeito de questionamento do lugar comum das expectativas sociais. 


O livro de Richard Sennet O Declínio do homem público - as tiranias da intimidade, demonstram que as primeiras aparições da palavra público tiveram a ver com a noção de res publica e bem comum na sociedade. A série brinca de inserir psicologia na veia, mas de maneira tão simples, que é quase imperceptível. 


De acordo com Putnam, a introdução da televisão nas casas nos anos de 1960, progressivamente fez nossa noção de comunidade aumentar. Abrindo o caminho para novas formas de interação social, e relação de aprendizado e comportamento com as formas primitivas de entretenimento. Uma série bem mais barata que a maioria das séries, mas caro para uma sitcom, em sentido detalhe. 


O sentido de realidade transmitido pela narrativa das séries passaram a fazer parte do cotidiano das pessoas e das casas, que passavam a consumir o uso da televisão no dia a dia. O modelo fechado em torno dos sitcons é uma forma que faz parte da iconografia da televisão nos Estados Unidos como fórmula universal. Nesse sentido, Friends bebe em muito na noção do meio ser a própria mensagem de Marshall Mcluhan. O ritmo simples e contínuo das piadas é o sinal desse tipo de estilo de roteiro de sitcom e a plateia. 


A lógica dos amigos e dos espaços privados já é uma lógica que na história está associado aos privilegiados dos primeiros escalões do governo. O que significa que na sociedade antiga, apenas os privilegiados possuíam o espaço privado, não a plebe, não o povo.  Já na modernidade, público passou a significar espaço aberto à observação de qualquer um, enquanto privado significava uma região protegida das mazelas, guarnecido pela definição de família e amigos.  O ritmo leve e normalizado das piadas nos diz que a série bebe muito no estilo dos seus roteiristas. 

  

Esses rituais de amadurecimento, como casamentos, despedidas, mudar de emprego, se formar são temas da interpretação genial do sociólogo Everett Hughes, que reflete como que as gerações pós baby boomers (1950) não conseguiram achar sua identidade de maneira tão fácil sem a perspectiva das guerras e jogos sociais que te transformam e te direcionam através das gerações, temas como política, identidade, religião parecerem girar em torno do fim da guerra-fria e da quedado muro de Berlim, sem que tivesse surgido nada mais para se adequar, Friends é sobretudo, sobre neoliberalismo e construção de identidades. 


Na ausência da possibilidade de ideologia, espaços em comuns e destinos compartilhados, o refúgio são os amigos. Em Friends o espaço privado não é um privilégio, mas um resultado da fuga direta da cobrança de um amadurecimento que jovens que moram sozinhos devem passar para "se tornar adulto", uma espécie de rituais de aprendizado


Quem não lembra da música tema "I'll be there for you" e a abertura na fonte? Ou da clássica frase de chaveco de Joey: "How you doing'?" (como você está?). 


"Então, ninguém te contou que a vida seria assim,

Seu trabalho é uma piada, você está falido, sua vida amorosa é perda total

É como se você estivesse sempre preso na segunda marcha

Não tem sido seu dia, sua semana, seu mês, ou mesmo seu ano, mas

Vou estar lá por você, quando a chuva começar a cair". 




Aqui é importante reparar que originalmente a ideia da série era mostrar jovens começando sua vida em NY, um dos lugares mais caros de morar do mundo, sendo que todos (menos Rachel) seriam todos ferrados financeiramente. Mas, aos poucos, eles foram melhorando a condição financeira dos personagens para condizer com as piadas.



Apesar disso, a série nunca foi gravada em Nova Iorque, mas sim na Califórnia, e contando com uma plateia, como é clássico no modelo de sitcom Americano. Por isso que a série parece ser uma metáfora de que as pessoas vivem vidas mais dentro de suas casas, do que nada rua. O que faz sentido em voltar por conta da pandemia, que produziu o hábito de ficar em casa.  A série começa no espaço que eles sempre vão usar, o Central Perk, que é uma referência ao Central Park. 


 

Onde começa toda a trama, quando Rachel Green, menina patricinha de família da elite, resolve abandonar Barry, seu noivo no altar. Nesse primeiro arco, vemos a depressão de Ross que foi abandonado por conta da sua ex-mulher descobrir ser lésbica, mas ela está grávida dele. Quando Ross suspirava pedindo por um novo amor, chega Rachel vestida de noiva e desesperada. 


Por exemplo, em Habermas, há um registro da origem do espaço de sociedade do público e a ligação os cafés que eram febre tanto no século XIX, como no século XIX. Friends se passa quando não na casa deles em Manhattan, se passa na cafeteria, o local dos encontros amorosos e de amizades, isso pois é uma sociedade que por conta do neoliberalismo aboliu a política de suas interações, e passou a focar na individualização das pessoas e das expectativas sociais. 



Outro assunto científico sobre Friends é a popularização da privacidade. Esse é o pano de fundo da história. Por ser uma série americana, seus personagem, por mais que sejam americanos hegemônicos, buscam o público médio, sendo uma metáfora da própria estrutura dos sitcons a situação social dos personagens de Friends, em uma economia massificada, as relações são também massificadas. 


Logo, Monica convida Rachel para morar com ela até ela se estabilizar. Assim Rachel tem que aprender a não contar mais com os cartões de crédito do pai. Esse é o arco da primeira temporada. Vemos diversas evoluções na história, como Rachel, que começa a trama como uma patricinha dependente, e termina no mercado de moda, trabalhando como executiva na Ralph Lauren, mas isso leva tempo, e na primeira temporada, Rachel está começando a viver por si mesma, e sua descoberta de independência é um dos principais motes da trama. 


Phoebe Buffay é minha personagem favorita de toda a trama. Ela é quem agita a história, como uma bússola para quando os personagens estão engessados com vontades reprimidas e não agem sobre sua vontade. Foi ela quem juntou os casais do grupo, e é ela quem já mais sofreu na história, tendo sido moradora de rua, e com sua mãe que cometeu suicídio. Ela também tem uma irmã gêmea super poderosa e  meio má chamada Úrsula. 


Com seu jeito libre e hippie, talvez seja a personagem que mais aborda política na trama, claro que da maneira dela. Ela vive de bicos, e faz sua música sem pensar em se "vender". Como fica claro em um dos episódios, onde antiga colega de palco rouba sua música Smelly Cat e vende para um comercial de caixa de areia para gatos. Nesse episódio, que inclusive aparece a Sherilyn Fenn, a Audrey de Twin Peaks que faz um interesse amoroso de Chandler, mas que já ficou com Joey. Smelly Cat para mim, é uma das melhores músicas já criada (sério mesmo). 




Monica é uma chefe de gastronomia certinha e neurótica com a casa limpa e arrumada, Joey é um ator de pequenos papéis, um dos mais marcantes foi na novela "Days of our lives". Ross é um paleontólogo, e é o único "acadêmico" da galera. Por isso há várias piadas sobre ele puxar "assuntos chatos" e nerds por isso. 


Já Chandler, é processador de dados, e reclama sempre que é um emprego provisório, ao ganhar uma promoção, e ver que aquilo não era seu sonho ia ficar enquanto sua carreira pelo resto da vida. Quando faz o teste de aptidão para saber sua verdadeira vocação, o resultado é o mesmo emprego que ele tem, o que faz ele ficar triste. Na minha opinião, ele sempre foi o personagem mais engraçado da trama, pois suas piadas eram inteligentes, com situações cômicas. Como na vez que ficou preso no banco em um apagão com uma super modelo. Oportunidade perfeita, certo? Isso se ele não estivesse tão nervoso. E saber que o ator de seu personagem, Matthew Perry morreu esse fim de semana, tão jovem e de maneira tão besta é muito triste.


A morte de Perry só veio para somar nos reveses que a série tem passado. Recentemente, uma série de denúncias percorreram a produção. Havia um constante conflito entre os roteirista, a produção e os atores, onde os atores acusam a produção de fazer tramas que sempre fechavam com uma moral elitista. Outro detalhe: não há negro em Friends. Nova York é uma cidade com milhares de negros, mais quase nenhum aparece em Friends. Por fim, como era uma série que ridicularizava muitos seus personagens, não foi algo que abriu as portas para os atores mas sim ajudou a enterrar a carreira deles de vez. Depois da série, a maioria dos atores do elenco sumiu. Perry ainda estrelou o seriado Go On, que tinha até Tyler James Williams de Todo Mundo Odeia o Chris, mas que foi brevemente cancelado. Fora a forte associação feita na internet com o seriado e a palavra "Cringe". 

O que tudo isso significa? Apenas que a série como qualquer produto audiovisual é profundamente refém de seu tempo. Com isso, o que vemos é que o contexto de criação da série, os anos 90, é marcado por uma positividade tóxica, calcada profundamente nas aparências. Há um certo teor deprimente que percorre a série, como o constante fracasso de Joey em conseguir um bom trabalho de ator. Isso vira piada constantemente na série, mas... tem graça realmente ou é profundamente triste, parecendo que na claque estão rindo do próprio espectador e de sua esperança no mundo? 

Recentemente, Perry chegou ainda participar do especial de Friends e perdemos uma ótima oportunidade de ter mais uma temporada ou revival da série, o que dá um profundo gosto ruim na boca para os fãs, ao ver esse desfecho triste para o universo da série. 


Friends é cheia desses conflitos de perspectiva de vida, morando juntos na maior parte da série, vemos antes da pandemia o oikos (o privado) como lugar especial, o lugar dos 'amigos', e em tempos de crises econômicas, como atualmente, quem é que tem amigos? ninguém. Essa é a prótese narrativa de Friends, uma série para solitários e nostálgicos em geral. Quase uma terapia em forma de série.


A série se preocupa sempre com valores do "o que acontece a seguir" da vida da juventude, o que acontece quando você se forma na faculdade, ou começa a trabalhar no seu primeiro emprego, essas questões são valores universais. A volta tocará o coração do público médio, que como eu, esperou anos por esse encontro. Quem está ansioso? 


Comentários

Em Alta no Momento:

Cemitério Maldito (Pet Sematary, 1989): Filme suavizou livro de Stephen King mas é a melhor adaptação da obra até hoje. Confira as diferenças do livro para o filme

Os Desajustados (The Misfits, 1961): Um faroeste com Marilyn Monroe e Clark Gable sobre imperfeição da obra do artista e o fim fantasmagórico da Era de Ouro do Cinema Americano

Rastros de Ódio (The Searchers, 1956): Clássico de John Ford é o maior faroeste de todos os tempos e eu posso provar

O Dólar Furado (1965): Faroeste italiano retrata o pós Guerra Civil para comparar com o contexto seguinte a Segunda Guerra Mundial



Curta nossa página: